Os contaminantes orgânicos persistentes como os organoclorados, são compostos que por suas características físico-químicas, resistem em graus variáveis à degradação biológica, química e fotoquímica. Possuem grande mobilidade ambiental, acumulam-se em numerosas espécies e magnificam-se através das cadeias tróficas. O endosulfan é um composto organoclorado, sólido e incolor, utilizado como inseticida na agricultura. Devido a sua toxicidade, sua utilização é proibida em vários países incluindo a União Européia, porém, em outros como o Brasil e a Índia ainda é utilizado de forma deliberada na agricultura. Além disso, são freqüentes os acidentes de ordem ocupacional e ambiental de grande escala envolvendo o endosulfan. O presente estudo teve como objetivo avaliar os efeitos do composto organoclorado endosulfan no sistema da fase I de biotransformação hepática dos peixes das espécies Cyprinus carpio (carpa) e Ancistrus multispinis (cascudo).

As carpas foram expostas via hídrica ao endosulfan na concentração subletal de 0,001mg/L por um período de quinze dias. Os cascudos foram contaminados com endosulfan via intracelomática na dose subletal de 4mg/Kg, por um período de cinco dias. Ao término dos bioensaios, os peixes foram sacrificados após secção medular, seus fígados foram retirados, homogeneizados em tampão fosfato 0,1M, pH 7.4 e em seguida centrifugados a 10000 x g por 20 minutos a 4°C. Posteriormente, para extração microsomal hepática, a fração S9 foi retirada e ultracentrifugada à 4⁰C por 80 minutos a 100.000 x g. As concentrações de proteínas foram determinadas de acordo com o método de Bradford (1976) e a determinação do conteúdo hepático de CYP450 total foi realizada segundo o método de Omura e Sato (1964).

Foi observada uma indução significativa na concentração do CYP450 total da fração microsomal hepática do grupo de carpas (Cyprinus carpio) expostas ao endosulfan (327.2 ± 52.6 pmol.mg prot^-1± ep ) quando comparada ao grupo de carpas controle (180.4 ± 31.1). Nos estudos realizados com os peixes da espécie Ancistrus multispinis, foi observada uma inibição na indução do CYP450 total na concentração da fração microsomal hepática dos peixes expostos ao endosulfan (73.9±5.8 pmol.mg prot^.-1± ep) quando comparada ao grupo de peixes controle (102.4 ± 5.5).

A indução do CYP450 no fígado de peixes tem sido extensivamente estudada, ocorrendo muitas diferenças entre as várias espécies de peixes. No presente estudo, o organoclorado endosulfan promoveu a indução da fase I de biotransformação hepática nos peixes da espécie Cyprinus carpio enquanto que nos peixes da espécie Ancistrus multispinis essa indução foi inibida. Os mecanismos que envolvem a inativação do CYP450 podem estar relacionados às alterações estruturais em sua molécula, decorrentes das espécies reativas de oxigênio geradas em ciclos catalíticos incompletos das próprias enzimas envolvidas nesse sistema. Estudos dos mecanismos de toxicidade em organismos aquáticos envolvendo o endosulfan são cada vez mais necessários.