62ª Reunião Anual da SBPC
C. Ciências Biológicas - 5. Ecologia - 1. Ecologia Aplicada
A PESCA DO BÚZIO NA RESERVA DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ESTADUAL PONTA DO TUBARÃO (RN): CONTRIBUIÇÕES AO MANEJO PARTICIPATIVO DE Anomalocardia brasiliana (GMELIN, 1791) (BIVALVIA: VENERIDAE).
Ligia Moreira da Rocha 1
José Luiz de Attayde 2
Priscila Fabiana Macedo Lopes 2
1. Universidade Federal do Rio Grande do Norte Doutoranda em Ecologia
2. Universidade Federal do Rio Grande do Norte Programa de Pós graduação Ecologia
INTRODUÇÃO:
As áreas costeiras e marinhas estão submetidas a pressões cada vez maiores pela pesca, turismo e desenvolvimento urbano, tornando vulneráveis estoques pesqueiros e áreas de significativa importância ecológica. A criação de Áreas Marinhas Protegidas (AMPs) surge mundialmente como estratégia para manutenção dos recursos pesqueiros e proteção de hábitats vulneráveis. No entanto sua criação e gestão encontram desafios complexos, uma vez que podem alterar o regime de acesso do oceano e interferir na segurança alimentar das populações costeiras. Tradicionalmente peixes, moluscos e crustáceos formam a base de alimento e renda das comunidades litorâneas, gerando preocupações sobre a sustentabilidade ecológica, social e econômica destas atividades. Na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Estadual Ponta do Tubarão (RDSEPT), a exploração de recursos marinhos é a principal atividade econômica, sendo a extração de Anomalocardia brasiliana realizada principalmente pelas mulheres, artesanalmente e sem regras de manejo. Como o conhecimento dos sistemas locais de exploração é fundamental para embasar estratégias de manejo, o presente projeto visou identificar a forma de exploração de A. brasiliana na reserva, de maneira a subsidiar diretrizes de manejo da espécie.
METODOLOGIA:
A RDSEPT localiza-se na região do litoral norte do Estado do Rio Grande do Norte, sub-zona salineira, entre os municípios de Macau e Guamaré, numa área de 12.947ha. O levantamento dos dados aconteceu em visitas de cerca de oito dias às comunidades de Barreiras (BR), Sertãozinho (ST) e Diogo Lopes (DL), nos meses de janeiro a março de 2010, em períodos lunares de maior exposição dos bancos de moluscos e, portanto, maior potencial de exploração. Foram utilizadas entrevistas semi estruturadas com o método "bola-de-neve", no qual os entrevistados indicam outros que poderiam ser úteis para o estudo. A mariscagem em todo ciclo de extração e beneficiamento, foi acompanhada e registrada. Os procedimentos utilizados e os dados gerados foram também discutidos em reuniões comunitárias mensais com as marisqueiras.
RESULTADOS:
A mariscagem é realizada preferencialmente por mulheres, apesar de alguns pescadores já participarem da atividade. Ela acontece com três fins: ser a principal fonte de renda familiar, ser fonte complementar da renda e ser apenas fonte de alimento. As principais manchas de recurso exploradas são Morro Branco (ST), Porto do Fede (DL), Lancha e Farol (BR). Apesar das marisqueiras indicarem a presença de A. brasiliana em outras áreas, sua extração é dificultada pelo acesso, pelo predomínio de juvenis ou pela presença de ostras que dificultam o deslocamento e aumentam o risco de cortes e acidentes. A forma de extração é dinâmica, indo do uso das mãos (método tradicional) às pás, ferramenta introduzida por homens recentemente (um ano) na mariscagem, aumentando o volume de extração em até 15 vezes. A freqüência das idas à maré no mês é variável e depende de fatores como necessidades de cada família, qualidade da maré, existência de encomenda de búzio, acesso à canoa e saúde da marisqueira. O beneficiamento da carne ocorre nos quintais das casas, em fogões improvisados a base de lenha. O método de catação manual após o cozimento também é dinâmico e vem sendo substituído por "peneiras", mais eficientes na separação da carne da concha.
CONCLUSÃO:
Apesar da mariscagem ser uma atividade tradicional feminina, verificam-se mudanças na RDS no período estudado. Novas tecnologias estão sendo absorvidas, tanto na extração (pá) quanto no beneficiamento (peneira) dos búzios. Do ponto de vista de gênero, como a força muscular dos pescadores geralmente é maior do que das marisqueiras, o potencial masculino de extração chega a ser até 15 vezes maior. Enquanto uma marisqueira sem acesso a canoa tira um saco (30 kg) de conchas, um pescador experiente com embarcação e pá pode tirar até 15 sacos. Isto leva a uma nova subdivisão do trabalho, com pescadores fornecendo búzio "in natura" para serem beneficiados pelas marisqueiras. O aumento da produção tem atraído atravessadores, que passaram a freqüentar a reserva criando um novo estímulo para se produzir mais. A extração de búzio na RDSEPT é um sistema complexo do ponto de vista ecológico e social, com múltiplos atores sociais, com necessidades e conflitos específicos. Seu manejo, portanto, deve ser construído a partir de uma perspectiva de gênero, onde homens e mulheres desempenham papéis dinâmicos. No entanto, estudos específicos de longa duração sobre as populações de búzios na reserva devem ser realizados para embasar o processo de tomada de decisão.
Instituição de Fomento: Capes: Bolsa REUNI-Doutorado Projeto Gente da Maré: World Fisheries Trust, Canadian International Development Aid, Ministério da Pesca e Aquicultura
Palavras-chave: Área marinha protegida, Anomalocardia brasiliana, manejo.