62ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 5. História - 9. História Social
Instruir, moralizar, educar: professoras em escolas femininas no Ceará imperial (1869-1889).
Barbara Eliza Soares Silva 1
João Ernani Furtado Filho 2
1. Mestrado em Historia/UFC
2. Professor Doutor/Orientador - Departamento de Historia - UFC
INTRODUÇÃO:

A produção historiográfica neste trabalho se propõe a compreender as idéias e costumes, no período compreendido entre 1869-1889, que procuravam ordenar as propostas de ensino nas escolas primárias femininas do Ceará e as relações sociais estabelecidas nesses espaços, destacando o papel das professoras que ali atuavam. Paralelamente à pesquisa bibliográfica, foi realizada análise de documentação (especificamente processos contra professoras primárias) presente no Arquivo Público do Estado do Ceará - APEC. Os processos provenientes da Instrução Pública, órgão responsável pela educação no Ceará no século XIX, são compostos de denúncias, queixas, correspondências e ofícios assinados pelos representantes locais da referida instituição e enviados para sua sede no Liceu do Ceará, em Fortaleza, direcionados ao diretor desta instituição, tratando de problemas recorrentes nas escolas do Ceará, como as dificuldades enfrentadas para a manutenção de salas de aula com as mínimas condições de funcionamento. As reivindicações dos professores da atualidade apresentam similaridades com os problemas enfrentados pelas professoras no período pesquisado. É recorrente no discurso dos memorialistas o destaque ás péssimas condições das escolas, o despreparo dos professores e o pouco investimento financeiro na área da educação. No entanto, cabe a nós como historiadores dar ênfase também às mudanças, não estudar "o passado pelo passado", mas compreender as transformações. A prática escolar e as normas que a permeavam, são parte e fruto das idéias que procuravam estabelecer as relações entre professoras e alunas, e destas com a sociedade na qual viviam.

METODOLOGIA:

Analisando a documentação existente no Arquivo Público, percebemos a existência de mulheres, se não consideradas acadêmicas, ao menos dotadas de conhecimento intelectual. A documentação, composta de queixas, correspondências entre os diretores gerais da Instrução Pública, inspetores de distrito, professoras acusadas de delitos, além de cartas e abaixo-assinados produzidos pelos pais das alunas, é fundamental pra dar vestígios sobre a vida dessas mulheres letradas. São muitas as trabalhadoras denunciadas e silenciadas. Procuramos neste trabalho percebê-las, em meio a leis que buscavam estabelecer normas convenientes para aqueles que as elaboravam, sendo aplicadas de cima para baixo, sem levar em consideração as dificuldades diárias enfrentadas pelos alunos, professores e pais de família. Jornais que circulavam no Ceará da época, Cearense e O Libertador, presentes na Biblioteca Pública Governador Meneses Pimentel (Fortaleza-Ceará), podem nos apontar, respectivamente, uma concepção mais conservadora da sociedade e apresentar a fala de denunciantes e denunciadas. Partindo dos procedimentos de pesquisa e interpretação de fontes propostos pela História Social, buscamos destrinchar o discurso que inseria as professoras em espaços onde exerceriam atividades que, na concepção da época, eram apropriados ao sexo feminino. Por se tratar de documentação produzida, em parte, pelas pessoas que as censuravam, tornou-se difícil perceber a fala das professoras. No entanto, muitas delas se defendem por meio de cartas deixando transparecer, com devida análise, aquilo que pensavam, reclamando seus direitos, criticando sutilmente a instituição e as regras por ela implantadas.

RESULTADOS:

No período analisado era recorrente a anexação da residência da professora à sala de aula, ou seja, o local de trabalho era também residência da mestra. O ambiente doméstico é muitas vezes local de conflitos e, devido à proximidade de espaços, o local de estudo e a morada, as jovens estudantes eram expostas a contendas diárias. O ofício do professor, então entendido como missão, confundia-se com o exercicio do sacerdocio, quando exigia-se que o mestre fosse um ser altruísta, além de modelo de retidão moral. Mas como seres humanos, as espectativas das professoras e suas vidas, poderiam frequentemente ir de encontro ao que se planejava. Tais mulheres precisavam trabalhar para sustento de suas casas: quando solteiras, por não terem conseguido casamento e serem submetidas aos parcos ganhos de seus pais; quando casadas, pela renda insuficiente dos maridos. Apresentavam nível de instrução considerável, em comparação com a grande parte da sociedade analfabeta. A realização desse trabalho as colocava em situação de vulnerabilidade ante os olhos da sociedade, mais preocupada com a continuidade de valores estabelecidos do que com a renovação a partir da concepção de civilidade e progresso.

CONCLUSÃO:

Podemos concluir que muitas professoras foram denunciadas com a justificativa de não serem apropriadas para o trabalho de lecionar jovens do sexo feminino. Que práticas as tornavam inapropriadas para esse trabalho? Que tipo de punições elas sofriam? Como chegavam a atuar como professoras se suas condutas eram consideradas demasiado incorretas? Não temos respostas para essas perguntas, mas, por meio delas, podemos perceber um pouco das espectativas e vidas daquelas que estudamos.

Instituição de Fomento: FUNCAP/UFC
Palavras-chave: Professoras , Escolas femininas, Ceará Império.