62ª Reunião Anual da SBPC
A. Ciências Exatas e da Terra - 3. Física - 2. Ensino de Física
MATERIAIS EXPERIMENTAIS E LÚDICOS NO ENSINO DE FÍSICA - AS ARMADILHAS DAS SUCATAS
Eugenio Maria de França Ramos 1, 2
1. Universidade Estadual Paulista / UNESP
2. Centro de Educ. Continuada em Educ. Mat., Científica e Ambiental / CECEMCA UNESP
INTRODUÇÃO:
Apresenta-se neste trabalho parte da pesquisa realizada com professoras de 1ª a 4ª séries do Ensino Fundamental e alunas de Pedagogia, da Cidade de Marília (SP), analisando julgamentos - primeiras impressões - ante a escolha de um entre seis experimentos didáticos de conhecimento físico - cones, mergulhador (ludião), estilingue (looping), equilibrista, disco (disco de cores) e bruxinha (eletroscópio). Tais protótipos didáticos envolvem conhecimentos de mecânica, óptica e eletricidade estática, e que por aliar a experiência à ludicidade, seja pela estética do material ou pela forma como são manuseados, serão designados como materiais experimentais e lúdicos (MEL). A análise das justificativas da pesquisa da primeira impressão permitiu-nos desvelar uma quantidade maior de significados, nas reações das pessoas e em seus argumentos. Com base nas perspectivas filosóficas de Ortega y Gasset, foi possível desvelar crenças, idéias e usos relacionados às vivências pessoais e às influências sociais decorrentes, inclusive, da imersão profissional. Neste trabalho destacamos particularmente o grupo de análise acerca de manifestações quanto a simplicidade de construção dos materiais apresentados na referida pesquisa.
METODOLOGIA:
A pesquisa consistiu de apresentação sumária de seis MELs, mostrando os efeitos de cada um, sem que as pessoas pudessem manuseá-los. Em seguida distribuíamos uma folha em que a pessoa registrava seu nome, a série em que atuava, qual material havia chamado mais atenção e a justificativa de tal escolha. Os nomes utilizados para designar os materiais surgiram dos próprios observadores, ao se referirem à sua escolha. Todo o processo, desde a apresentação até o recolhimento das folhas de escolha, durou cerca de 20 minutos. A maior parte do tempo era gasta com a apresentação e uma pequena parte, cerca de 5 minutos, para as pessoas receberem a folha, registrarem suas opções e a devolverem preenchida. As respostas, tabuladas e classificadas em grupos, permitiram uma análise mais aprofundada de perspectivas. Há nos julgamentos elementos consistentes de crenças, costumes e mitos, que não podem ser ignorados, se pretendermos entender o ponto de vista da pessoa - sua circunstância de análise - sobretudo as perspectivas didáticas do ensino experimental de ciências no nível elementar. Destacamos o sub-grupo simplicidade, construção e manuseio construído na análise, representando 10 % das 125 opiniões coletadas.
RESULTADOS:
Nas justificativas das professoras e alunas deste sub-grupo destaca-se a referência à matéria-prima utilizada na confecção dos experimentos/brinquedos apresentados. As indicações de escolha dos materiais se concentram respectivamente na bruxinha (42%), na equilibrista (25 %), no estilingue (17%) e no mergulhador (17%). Localizamos, nas justificativas, as referências de que o material é ". simples de coletar .". Mas a simplicidade está associada a outras conseqüências, como ser "... simples e que chama atenção da criança" ou ainda ". despertar a criatividade das crianças". Transparece, nestas argumentações, a convicção de que simplicidade e atenção estão relacionadas. A simplicidade do material é acentuada nas justificativas que identificam a matéria-prima como sucata, como nos trechos: "chama a atenção e é feito com sucatas." Além disso o ". estímulo oferecido por um material de sucata, . [para os alunos] suscitaria interesse .". É importante destacar que, especialmente no caso da construção, as professoras não afirmam que o MEL ensinará mais. Ensinar é uma conseqüência aparentemente implícita na facilidade, na diversão, no interesse e no prazer atribuídos a um material didático do tipo do MEL.
CONCLUSÃO:
O estudo de pressupostos dos julgamentos permitiu desvelar perspectivas que atribuem aos MELs especial interesse pela sua simplicidade de construção. Implicitamente atribui-se à sucata possibilidades "milagrosas" para o ensino, como despertar a atenção, a curiosidade e a criatividade. Tal crença, subjacente ao uso do material didático experimental, dificulta o entendimento de que o material é um componente e não uma finalidade. O material, seja ele sucata ou não, deve garantir que sua utilização, na construção de um experimento, ou de um brinquedo, não obscureça o conteúdo que se pretende trabalhar didaticamente, e nem o desafio lúdico que se pretende despertar. Particularmente o uso de materiais diversos, sucata ou não, em atividades experimentais de Física devem ter como objetivo a possibilidade de colocar um fenômeno físico, uma ocorrência, próxima ao aprendiz. Uma balança pode ter aspecto de balança, mas, sobretudo, deve funcionar como uma balança. O avião de papel reproduzirá a forma de um avião, porque precisa de aerodinâmica semelhante para planar, caso contrário não será de fato um planador de papel. Assim sendo, não se pode perder de vista a finalidade do trabalho pedagógico que se pretende desenvolver, para que a sucata não se torne um fim em si mesma.
Instituição de Fomento: CAPES / FUNDUNESP
Palavras-chave: Ensino de Física, Crença e imaginação, Material Didático Experimental.