62ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 8. Psicologia - 6. Psicologia do Desenvolvimento Humano
VISOESPACIALIDADE E VISOCONSTRUÇÃO EM CRIANÇAS DIAGNOSTICADAS COM MEDULOBLASTOMA: ESTUDOS DE CASO
Danielle Garcia 1
Izabel Hazin 1
Arli Diniz Oliveira Melo Pedrosa 2
Francisco de Paula Ramos Pedrosa 2
Iana Catarina de Araújo Viana 1
Laura Carolina Lemos Aragão 1
1. Universidade Federal do Rio Grande do Norte
2. Centro de Hematologia e Oncologia Pediátrica - CEHOPE/PE
INTRODUÇÃO:
O presente estudo teve por objetivo investigar a visoespacialidade e visoconstrução em crianças diagnosticadas com meduloblastoma da fossa posterior, região localizada abaixo da tenda do cerebelo. O meduloblastoma é um tumor maligno do Sistema Nervoso Central - SNC - que constitui o subtipo histológico mais freqüente de tumores primários de SNC na infância. Devido à alta sofisticação terapêutica, os índices de sobrevida de crianças com tal diagnóstico apresentam-se em constante crescimento. Contudo, à intrusão do tecido tumoral nas estruturas nervosas e às intervenções terapêuticas seguem-se seqüelas neurocognitivas adversas, que podem configurar-se em prejuízos ao funcionamento cognitivo e em dificuldades na vida acadêmico-social da criança. A relevância deste estudo situa-se na necessidade de investigar e compreender o impacto do advento desses tumores e de seu tratamento sobre a visoespacialidade e a visoconstrução - função que consiste na percepção, integração, síntese e reprodução bi ou tridimensional de estímulos visuais dispostos espacialmente. Esta investigação tem como propósito contribuir para a proposição de estratégias de atendimento diferenciado de tais crianças, visando minimizar possíveis dificuldades sócio-educacionais decorrentes da doença e/ou de seu tratamento.
METODOLOGIA:
Participaram deste estudo quatro crianças, com idades entre 8 e 11 anos, de ambos os sexos - sendo duas do sexo feminino e duas do sexo masculino - diagnosticadas com meduloblastoma através de exames de neuroimagem e laudo histopatológico. As crianças participantes deste estudo são acompanhadas no Centro de Hematologia e Oncologia Pediátrica na cidade do Recife/PE, e foram submetidas ao protocolo SNC Meduloblastoma Parker, que consiste em cirurgia para ressecção do tumor, seguida de radioterapia de crânio e neuroeixo e de leito tumoral - com dose total de aproximadamente 54 Gy - e quimioterapia. Após o tratamento e o consentimento de seus responsáveis legais, as crianças foram submetidas a avaliação neuropsicológica da visoespacialidade - realizada na própria instituição, através dos seguintes instrumentos: Figuras Complexas de Rey; subtestes Completar Figuras, Cubos e Armar Objetos das Escalas Wechsler de Inteligência para Crianças, estes últimos componentes do índice fatorial Organização Perceptual da referida escala. Os dados foram analisados quantitativa e qualitativamente, à luz do referencial teórico-metodológico da neuropsicologia do desenvolvimento e da aprendizagem.
RESULTADOS:
Os dados apontam impacto significativo da doença e/ou de seu tratamento sobre a visoespacialidade/visoconstrução. O teste das Figuras Complexas de Rey revelou um funcionamento abaixo do esperado neste domínio. Nas Escalas Wechsler, observou-se baixas pontuações ponderadas nos subtestes Completar Figuras, Armar Objetos e Cubos - componentes do índice de Organização Percentual (OP) da WISC-III. Neste índice, as crianças apresentaram QI's de 78, 77, 75 (classificação limítrofe) e 58 (classificação deficiência intelectual). Salienta-se que em duas crianças o índice OP correspondeu à pontuação mais baixa em relação aos demais e que todas as crianças apresentaram discrepâncias significativas - de 18 a 40 pontos - entre os domínios verbal e manipulativo em favor do primeiro, apontando para um perfil cognitivo atípico em que predominam dificuldades em tarefas de execução. Tais dados suscitam a necessidade de aprofundamento acerca do impacto da incidência do meduloblastoma e de seu tratamento sobre a visoespacialidade e a visoconstrução - funções cognitivas essenciais ao neurodesenvolvimento e à aprendizagem - bem como lança luzes à discussão do papel do cerebelo na praxia visoconstrutiva, habilidade essencialmente ligada ao domínio do funcionamento executivo.
CONCLUSÃO:
Apesar dos avanços verificados na abordagem terapêutica do câncer neurológico infantil, com aumento significativo do número de sobreviventes, o impacto da doença e do seu tratamento sobre o funcionamento cognitivo não pode ser negligenciado. A partir dos dados obtidos neste estudo, observa-se que o meduloblastoma e seu tratamento possuem impacto significativo sobre a visoespacialidade e a visoconstrução, podendo ser fonte de prejuízos ao funcionamento cognitivo e à aprendizagem dessas crianças. Assim, compreende-se que o atendimento à criança portadora de neoplasia do SNC não pode visar simplesmente a cura do ponto de vista médico, mas sim a qualidade de vida deste subgrupo de crianças e, neste sentido, os resultados do presente estudo lançam luzes à necessidade de se investigar e compreender o fenômeno em sua natureza e extensão, visando contribuir para a proposição de estratégias de atendimento diferenciado a tais crianças, minimizar o impacto da doença e de seu tratamento e contribuir para o aumento de sua qualidade de vida, garantindo a tais crianças o potencial de aprendizagem necessário ao seu desenvolvimento.
Instituição de Fomento: CNPQ
Palavras-chave: Neuropsicologia, Desenvolvimento e Aprendizagem, Meduloblastoma.