62ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 7. Educação - 18. Educação
ESTUDOS DE CASO EM EDUCAÇÃO NÃO FORMAL E A AMBIGUIDADE DO CONCEITO DE CIDADANIA
Laura do Nascimento Buhl 1
Leandro S. Oliveira 1
Itamar Mendes 2
Doraci Alves Lopes 1
1. Faculdade de Ciências Sociais - Puc-Campinas
2. Prof. Dr./Orientador Pós Graduação Educação - Puc-Campinas
INTRODUÇÃO:

Na dinâmica das relações políticas e sociais protagonizadas por setores da sociedade civil e o Estado, ocorre a criação de espaços públicos e ou privados, complexos, heterogêneos, onde interesses políticos distintos se organizam. As ações chamadas de Responsabilidade Social (RS) e de Movimentos Sociais (MS) destacam-se como sujeitos de disputas políticas nestes espaços e têm implicações diretas no conceito de cidadania. Para aprofundar o conhecimento sobre a heterogeneidade da sociedade civil organizada no Brasil, realizamos dois estudos de casos em Campinas (SP) sobre processos educacionais não-formais (ENF). Trata-se de um estudo de movimento social e outro de ações de responsabilidade social em uma escola pública. Conforme pesquisa  IBGE (2008) com outras instituições, havia em 2005, 2388 fundações privadas e entidades sem fins lucrativos, mobilizando mais de 26000 assalariados. Quanto aos chamados cursos populares, autores apontam que em 2001 calculava-se cerca de 200 cursos desta natureza no Brasil, atualmente estima-se que ultrapassem 1000, mobilizando entre 50.000 e 100.000 pessoas. As implicações das ações de projetos sociais educativos não formais para a compreensão do conceito de cidadania exigem uma problematização e uma reflexão crítica no uso destes conceitos.

METODOLOGIA:

Estas duas pesquisas passaram por dois momentos: o primeiro trata da seleção e análise de materiais bibliográfico e documental, uma sobre ENF e MS e outra sobre ENF e RS, obtidos a partir de certas fontes e pesquisas oficiais (IBGE, IPEA, ABONG, GIFE), como bibliográfico (Scielo, BDTD). A análise do material neste primeiro momento orientou os esforços empreendidos na segunda fase que consiste na pesquisa documental nos dois estudos de casos sobre experiências de ENF na cidade de Campinas. Foram analisados: o cursinho alternativo "Herbert de Souza" (movimento social), localizado no Parque Residencial Vila União; e a Escola de Informática para Cidadania (EIC) ocorrida na Escola Estadual Álvaro Cotomacci, bairro Jardim Novo Maracanã. Esta experiência é fruto de uma parceria entre o Comitê para Democratização da Informática (CDI) e o Instituto Robert Bosch (responsabilidade social). O trabalho foi o de analisar estes dois espaços de ação com ENF e as implicações dos discursos defendidos por seus protagonistas para a noção de 'cidadania' que, de acordo com a bibliografia e os documentos analisados, estes são muitas vezes contraditórios.

RESULTADOS:

Estudos representativos têm refletido sobre os espaços heterogêneos e complexos da sociedade civil. No caso de cursinhos alternativos a pesquisa revela que estão em diversas regiões, um fenômeno crescente no país. O cursinho Herbert de Souza surgiu em 1998 e insere-se nesta realidade. Mas sua origem também está marcada por uma história de movimentos sociais. Entranha-se na vida social e política local e é reconhecido como parte da "identidade" do Parque Residencial Vila União. Quanto ao CDI, é uma ONG do Rio de Janeiro, com uma rede de 803 espaços no país e em vários países da América Latina, além de representação nos Estados Unidos e Inglaterra. Em Campinas o CDI têm por volta de 48 EICs e contabiliza cerca de 5.665 alunos formados. Do total de recursos recebidos, o CDI afirma que 18,34% provêm de pessoas jurídicas e conta com destacadas empresas que investem nestas ações. Tem como proposta pedagógica a promoção de uma cidadania crítica, além da qualificação profissional dos alunos. O patrocínio do Instituto Robert Bosch na Escola estudada iniciou em 2008, mas encerrou-se no final de 2009, interrompendo as atividades da EIC no local. O discurso democrático de educação cidadã e de formação crítica é visível nos dois casos, mas as ações concretas junto aos jovens apontam para interesses muito distintos.

CONCLUSÃO:

Estes processos ocorrem especialmente a partir de finais de 1970, período de redemocratização do país quando emergem múltiplos interesses de classes, expressos por distintos projetos políticos e novas representações civis em disputa no espaço público. Período também de transformações econômicas, globalização e neoliberalismo, aumento das desigualdades sociais, de desemprego estrutural. De um lado, iniciativas de ENF emergem da cultura dos novos movimentos sociais, baseada na disputa política das classes trabalhadoras por direitos sociais no espaço público, essência da cidadania. De outro lado, temos aquelas associadas às ações de responsabilidade social, baseada em uma ética de doação aos 'excluídos', de voluntariado individual e ou empresarial, porém fluídas quanto aos compromissos com os grupos sociais atendidos. A direção dos projetos políticos que organizam estas ações de cidadania aponta para uma falsa confluência de conceitos, ocultando contradições que se estende igualmente ao termo 'ENF'. A diversidade de 'parcerias' conjuntas com políticas públicas (sejam com Movimentos Sociais, Ongs, Empresas privadas, etc.) trazem à tona a necessidade de uma crítica sistemática sobre a relação entre espaços públicos e privados, e ainda sobre o significado coletivo da cidadania, sobretudo nas Escolas.

Instituição de Fomento: FAPIC - PUC-CAMPINAS/PIBIC-CNPq
Palavras-chave: educação não formal, cidadania, espaço público.