62ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 8. Psicologia - 11. Psicologia Social
O SOFRIMENTO DOS ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE RISCO: UM OLHAR DOS PROFISSIONAIS DE CASA DE PASSAGEM
Isabella Cavalcanti Maia 1
Mariana Maranholi Zulianeli Andrade 1
Izabel Christina Do Nascimento Feitosa 2
1. Faculdade Natalense para o Desenvolvimento do RN / FARN
2. Profa. Msc./Orientadora - Fac. Natalense para o Desenvolvimento do RN / FARN
INTRODUÇÃO:
A infância e adolescência em situação de risco é uma realidade presente no Brasil desde o período colonial, todavia somente no início do século XX o governo passou a se responsabilizar pela proteção desse público, vítima de diversos tipos de violência tanto físicas como psíquicas. Agravando esse atraso, passaram-se ainda cerca de 80 anos até a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, 1990), cujo espírito é o de preservação dos vínculos familiares originais, na tentativa de evitar perdas que comprometam o desenvolvimento desses sujeitos. Nesse sentido, a institucionalização deve ter caráter provisório, até que sejam restabelecidas as necessárias condições para o retorno ao seio familiar. Sabendo que a permanência sob a custódia do governo excede o período adequado para a maior parte dos casos e os inúmeros desafios oriundos dessa prática, a presente pesquisa busca investigar os motivos de sofrimento dos adolescentes abrigados na Casa de Passagem III, a partir da percepção dos profissionais que lá atuam. Tais resultados representam um fragmento de um projeto mais amplo que teve como finalidade analisar a situação da infância institucionalizada nas Casas de Passagem I, II e III de Natal-RN.
METODOLOGIA:
A pesquisa caracteriza-se como qualitativa, priorizando a análise de discurso. Os participantes foram os profissionais da Casa de Passagem III, vinculada à Secretaria Municipal do Trabalho e Ação Social (SEMTAS), de Natal-RN, que abriga crianças entre 12 a 18 anos incompletos. O instrumento utilizado foi entrevista semi-estruturada, gravadas e transcritas posteriormente, contando com uma amostra de 18 sujeitos. É importante frisar que para codificar e categorizar os dados foi utilizado um software para a análise qualitativa QDA-Miner (Qualitative Data Analysis Software). O uso deste programa de informática consistiu apenas em facilitar as tarefas mecânicas manipulativas na análise.
RESULTADOS:
A falta da família foi a mais citada como motivo de sofrimento, tanto no que diz respeito ao abandono dos pais, a ausência nos dias de visita, como nos casos em que os adolescentes são impedidos de voltar para casa devido à condição em que se encontram, ou porque esse lar é ambiente de violência e desproteção. Há relatos onde a justificativa desse sofrimento se encontra no desgaste do referencial paterno e materno. É comum observar adolescentes que já foram desabrigados e voltaram para a casa de passagem. Estes são casos em que as famílias não os querem em casa, em que não há um vínculo saudável: "Ela não gosta dele. A gente vê assim, quando conversa com ela (a mãe), você vê estampado que ela não gosta dele". (Funcionário 9). Em síntese, na percepção dos funcionários, existem os que não demonstram sofrimento e os que parecem estar bem: "Eu não sei, assim, para eles é como se fosse uma diversão viver essa vida, sabe. Curtir do jeito que tá. Porque se você conversar com eles: 'Tá bom'; 'Tá ótimo'." (Funcionário 1). Por último, a doença mental e a dependência química também foram citadas como fortes motivos de sofrimento. Esses transtornos se confundem como causa e causadores, podendo trazer sofrimento, por um lado e, por outro, são a própria manifestação do sofrimento.
CONCLUSÃO:
A partir do exposto, percebemos que o centro do sofrimento desses adolescentes reside na questão familiar. O lar que proporciona violência ao invés de proteção, os pais que não possuem recursos para manter o jovem em casa e a falta de apoio por parte da família durante o período de abrigamento, como constantes ausências nos dias de visita, compõe quadros de angústia que dificultam o pleno desenvolvimento desses sujeitos e lhes prejudicam frente às tentativas de ressocialização. Ou seja, os laços fragilizados contribuem para que os adolescentes prefiram o falso suporte das drogas e das ruas, avessos aos caminhos propostos pelo ECA. Tendo a percepção dos profissionais da instituição pesquisada dado valiosas pistas para a situação desses adolescentes, reforçamos a necessidade de implantações de políticas públicas que visem capacitar esses profissionais a fim de fortalecer a rede de apoio apresentada aos jovens, motivando intervenções no sentido de reparar o vínculo pais-filhos, e dar-lhes o devido suporte afetivo e educativo durante a institucionalização. Ademais, torna-se indispensável a criação de espaços terapêuticos que recebam essa demanda, não com o objetivo de amenizar paliativamente esse sofrimento, mas para oferecer ao jovem uma possibilidade de resiliência frente a sua dor.
Palavras-chave: Adolescência, Sofrimento, Situação de risco.