62ª Reunião Anual da SBPC
H. Artes, Letras e Lingüística - 2. Letras - 1. Língua Portuguesa
PRESERVAR PARA CONHECER: EDIÇÃO SEMIDIPLOMÁTICA E ESTUDO LINGUÍSTICO DE UM AUTO DE DEFLORAMENTO
Anita Soledade Magalhães 1
Rita de Cássia Ribeiro de Queiroz 1
1. Departamento de Letras e Artes, Universidade Estadual de Feira de Santana
INTRODUÇÃO:
A partir de textos escritos é possível conhecer a cultura de um povo e suas convenções linguísticas. Logo, pode-se afirmar que todo escrito é um documento. Em se tratando de manuscritos - do latim manu (mão) e scriptum (escrito), ou seja, escrito à mão - pode-se afirmar que ele está diretamente relacionado ao mundo do papel e se não for bem armazenado, devido à sua própria constituição orgânica, pode ser destruído ao longo dos tempos e informações preciosas serem perdidas. Daí a importância do labor filológico. A Filologia, criada pelos gregos no século III a.C, é uma ciência antiga que tem por objetivo, além de preparar edições de textos, estudar a história da evolução das línguas a partir daquilo que está documentado. Com a análise de documentos manuscritos, de quaisquer naturezas, pode-se perceber não só as transformações que ocorrem em nossa língua, mas também nos permite realizar reflexões sobre as relações culturais, políticas e sociais de um povo, já que a partir do código escrito o homem divulga a sua história. Com vistas à preservação da documentação manuscrita baiana do início do século XX, editou-se semidiplomaticamente um Auto de Defloramento, bem como se realizou um estudo jurídico- terminológico.
METODOLOGIA:
O método utilizado foi o da pesquisa documental. O documento estudado não recebeu nenhum tratamento analítico e encontra-se catalogado no Centro de Documentação e Pesquisa da Universidade Estadual de Feira de Santana (CEDOC/UEFS). A pesquisa documental é muito flexível, exigindo do pesquisador apenas disponibilidade e conhecimento para interpretar os dados presentes no documento. Para a efetivação da edição semidiplomática, duas atividades foram de suma importância: a descrição e a transcrição do documento. Para a descrição, foram determinadas as seguintes estratégias: observar o número de linhas e colunas da mancha escrita; informar o número de abreviaturas; descrever o tipo de papel e do manuscrito; analisar o tipo de escrita. Para a transcrição, foi de grande relevância: numerar o texto linha por linha; respeitar fielmente o texto; desdobrar as abreviaturas, apresentando-as em itálico e negrito; usar colchetes nas interpolações. Procedimentos utilizados para o estudo linguístico: seleção dos termos de natureza jurídica, dando destaque em negrito e caixa alta; descrição da natureza gramatical, domínio, definição e contexto do termo; elaboração de uma nota explicativa, em alguns casos, apontando se houve uma mudança da grafia do termo selecionado.
RESULTADOS:
Com a edição o auto de defloramento foi salvo do olvido popular e do desgaste natural do tempo a que o frágil papel está exposto. Foi preservada, portanto, uma parte da memória documental e linguística baiana do início do século XX. Apesar de não apresentar grandes problemas paleográficos, o auto de defloramento analisado gerou algumas dificuldades de leitura, pois a escrita foi realizada em letra cursiva, ou seja, como as letras se apresentam corridas e ligadas umas às outras foi preciso muita atenção para não confundi-las. Quanto aos aspectos ortográficos, é de fácil observação o fato de que em algumas palavras terminadas em ão o til recaiu sobre o o, não sobre o a, como se o diacrítico fosse uma continuação da vogal. Existem também no documento algumas alternâncias ortográficas: uma mesma palavra aparece grafada mais de uma vez, sendo que de maneiras distintas; este fato pode estar ligado a um descuido do escrivão ou à falta de regularidade da ortografia. Muitas abreviaturas foram utilizadas e os sinais abreviativos mais utilizados foram o ponto e a linha reta, esta quando a abreviação foi feita por letra sobreposta. Com o estudo terminológico jurídico, pode-se esclarecer a significação de alguns termos em seus sentidos monossêmicos, logo específicos.
CONCLUSÃO:
Mesmo os documentos que estão sob custódia de instituições especializadas correm o risco de serem perdidos, pois o clima quente do estado da Bahia, aliado à falta de recursos para a transformação das instituições em locais realmente adequados, é ideal para a proliferação de fungos e insetos, contribuindo para a destruição de muitos documentos. Por isso a necessidade da edição. O auto de defloramento estudado nesta pesquisa reflete uma parte da história do sertão baiano. A preservação desse documento pode ser observada sob dois aspectos: o primeiro, da destruição orgânica do papel; o segundo, das deturpações que poderiam ser realizadas por terceiros, visto que os pesquisadores das diversas áreas do conhecimento, que queiram realizar suas investigações com base no manuscrito, não precisarão ter o contato direto com o original, já que contam com a ajuda de um editor que (no caso da Edição Semidiplomática) a partir de critérios de intervenções previamente estabelecidos, os auxilia na decifração de caracteres para que o texto seja facilmente compreendido. Através da análise linguística do documento, pode-se realizar um estudo diacrônico do léxico da língua portuguesa, compreendendo-se, consequentemente, como se processam algumas mudanças linguísticas.
Instituição de Fomento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq
Palavras-chave: Filologia , Edição Semidiplomática, Terminologia.