62ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 9. Sociologia - 6. Sociologia Urbana
DOIS PRÁ LÁ, DOIS PRÁ CÁ: A CONSTRUÇÃO DOS MODELOS DE MASCULINIDADE E FEMINILIDADE NA ACADEMIA DE DANÇA DE SALÃO
Germana Cleide Pereira 1
1. Departamento de Pós-Graduação em Sociologia, Universidade Federal do Ceará/ UFC
INTRODUÇÃO:

A academia de dança de salão é o espaço onde se moldam homens e mulheres para a prática de uma atividade físico-artística, na qual pares de agentes realizam movimentos ao som de diversos ritmos. Uma dança onde a aproximação entre os corpos é inevitável, travando uma relação de intimidade com um parceiro (a), na maioria dos casos, desconhecido. Desse modo, temos na figura da dançarina uma ruptura da idéia da "dona de casa", recatada que empregava sua vida apenas na educação dos filhos e no bem estar do marido. Essas mulheres libertam-se das "amarras" de mostrar apenas uma conduta séria e ingênua, rompendo o estilo inibido com a emergência de sua sensualidade. Os homens dançarinos mostram a sua virilidade contendo gestos e emoções, mas ao mesmo tempo desvendam uma feminilidade marcada em seu corpo. Eles apresentam-se com o cuidado, o requebrado e a ginga ditos como próprios das mulheres. A identidade aparentemente fixa e rígida tanto do feminino como do masculino abre possibilidades de admitir concepções diferentes e até "desviantes" dos papéis de gênero. Podemos considerar que existe uma variabilidade dos modelos de gênero. Esse trabalho constituiu uma tentativa de investigar como professores e alunos de dança de salão constroem seus modelos de masculinidade e de feminilidade.

METODOLOGIA:

O olhar antropológico serviu não apenas para o registro da diversidade cultural, mas para a busca do significado dos comportamentos, a lógica das transgressões e a construção dos modelos de gênero. De tal modo, a fim de enriquecer as descrições deixei-me impregnar pelos estímulos corporais e emocionais que o campo da dança produz, acreditando que marcas no corpo do próprio pesquisador são ferramentas a mais para a compreensão do universo estudado. Uma participação observante proporcionou um maior entendimento das categorias de estudo e das redes de significados que os "nativos" produziam no momento de suas ações. Fiz entrevistas abertas com o corpo de professores, pois essa técnica permitiu perceber as representações desses profissionais a respeito da dança de salão e do universo feminino e masculino que ela engloba. Considerei que na realização das entrevistas a investigação adquire um sentido interativo. Também coletei os relatos e depoimentos dos alunos acerca do entendimento e da incorporação dessas representações. Tudo para, enfim, produzir uma etnografia que registrasse o processo de socialização nas academias, a aprendizagem da dança de salão e a construção da feminilidade e da masculinidade pelos indivíduos que dela participam.

RESULTADOS:

Apesar da variabilidade dos papéis de gênero, verificamos também certas permanências dos modelos tradicionais de homens e mulheres.  O corpo feminino, na dança de salão, é um corpo "dominado" pelas regras de condução, termo que designa o ato de conduzir a dama através das mãos para a realização dos movimentos. O verbo conduzir é utilizado para indicar a ação e o papel social daquele que racionaliza e comanda todos os movimentos da dança, no caso o cavalheiro.  O cavalheiro direciona os movimentos e a dama responde a essa comunicação, fundando uma idéia de que na dança de salão cabe a esta apenas o papel de submissão. A construção da masculinidade e da feminilidade, na dança de salão, atribui ao homem comportamentos naturalizados pela força e racionalidade e à mulher condutas relacionadas às emoções e sentimentos. Sendo assim, pelo que podemos constatar as organizações que se colocam entre os sexos, na dança de salão, não fez desaparecer por completo as diferenças existentes entre homens e mulheres. Percebi, então, que o entendimento sociológico da dança de salão pode nos oferecer a possibilidade de refletir sobre alguns aspectos da nossa cultura, compreendendo questões significativas dentro do sistema de valores e representações de gênero.

CONCLUSÃO:

A academia constitui-se num espaço privilegiado de sociabilidade do mundo contemporâneo e uma modalidade de atividade física praticada como uma dimensão do estilo de vida dos indivíduos. Nessa dança mulheres e homens de gerações, às vezes, distintas interagem com segmentos sociais também diferentes, criando nessa relação padrões de percepção e de avaliação das posições de faixa etária, classe social, cor, altura, peso corporal e habilidades motoras. A prática da dança de salão, ou seja, as formas como os dançarinos utilizam seus corpos, apropriam-se dos conceitos de feminino e masculino, escolhem suas indumentárias ou relacionam-se entre si, parecem configurar uma cultura particular, relacionada à performance da dança. A apreciação desse material permitiu uma discussão fecunda sobre os modelos de masculinidade e feminilidade na dança de salão e como o processo de ensino-aprendizagem dessa dança tem contribuído para a construção social da identidade de gênero em nossa sociedade. 

Instituição de Fomento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq
Palavras-chave: Dança, Corpo, Gênero.