62ª Reunião Anual da SBPC
F. Ciências Sociais Aplicadas - 5. Direito - 13. Direito
EM BUSCA DE UM CONCEITO CONSTITUCIONALMENTE ADEQUADO DE LIBERDADE RELIGIOSA
Nara Pereira Carvalho 1
Brunello Stancioli 1
Carolina Penna Nocchi 1
Daniel Mendes Ribeiro 1
Raquel Reis Gonçalves 1
Rodrigo Alves Stancioli 1
1. Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG
INTRODUÇÃO:
Matriz fundamentadora do Direito Ocidental, a Liberdade é, não raramente, considerada como pressuposto fático para a efetivação da Justiça e o próprio objeto do pensar filosófico (SALGADO). Um dos seus desdobramentos consiste na liberdade religiosa, um conceito de difícil definição e que traz problemas evidentes na tentativa de aplicá-lo ao contexto brasileiro. Marcado por enorme variedade étnica, a cultura brasileira é das mais ricas e complexas do mundo. Nessa sociedade, evidentemente plural e que se pretende hoje democrática, o mais plausível seria a abertura efetiva à diferença, o que viabilizaria a coexistência de diferentes religiões e mesmo o respeito à opção pelo ateísmo. Contudo, não é o que se verifica. Em pesquisa realizada por Veja/CNT/Sensus, em dezembro de 2007, por exemplo, seis em cada dez brasileiro disseram que "jamais votariam, sob nenhuma circunstância, num candidato ateu para o Palácio do Planalto". Assim, apesar de a liberdade religiosa ser constitucionalmente assegurada desde a Proclamação da República, o que se observa é a ausência de discussão acerca de um conceito consistente e adequado à atual realidade brasileira.
METODOLOGIA:
Parte-se da Obra de TAYLOR. Este, ao tratar a liberdade religiosa, no contexto do Estado Democrático de Direito Secular, como o direito a ter, mudar ou não ter religião, e de possibilidade de manifestar a opção de vida religiosa nas esferas pública e privada, viabiliza, após feita a reconstrução histórica da liberdade religiosa brasileira, concluir se há a vivência efetiva do conceito no país. Seria possível, inclusive, atribuir significados específicos à terminologia adotada pela Constituição ao tratar da liberdade religiosa (e.g. "liberdade de crença", "assistência religiosa", "relações de aliança"). Frise-se que a Obra de TAYLOR considera noções fundamentais para a realização desta pesquisa: a separação entre Igreja e Estado e o pluralismo (moral e democrático) do Estado de Direito Contemporâneo, no qual a ética intersubjetiva supera as morais particulares (inclusive a cristã) e alicerça a construção e leitura do Direito. Indispensável, portanto, a dupla postura, de observador/participante da tradição Ocidental, mas também de instância crítica reconstrutiva, segundo moldes seculares/pós-metafísicos, a fim de se construírem argumentos consistentes acerca do tema.
RESULTADOS:
É possível chegar-se a três concepções no que atine à liberdade religiosa no contexto estatal: A) A postura indiferentista (EUA); B) A postura de hostilidade do Estado perante a religião (ex-URSS); C) A postura que prima pelo diálogo (Brasil). No Brasil, muito embora o Estado não possa subvencionar qualquer religião (art. 19, I, da Constituição de 1988), entende-se que ele pode (e deve!) ter postura ativa no fomento à liberdade religiosa. Tal pode ser demonstrado, por exemplo, pela obrigação constitucional de se assegurar a prestação de assistência religiosa em entidades de internação coletiva (art. 5º, VII, CR/88) e a presença da disciplina de ensino religioso no currículo das escolas públicas de ensino fundamental (art. 210, §1º, CR/88). Dessa forma, um conceito constitucionalmente adequado de liberdade religiosa envolve não só a possibilidade do livre exercício da manifestação religiosa nas esferas pública e privada, mas também um dever ativo do Estado Brasileiro de criar condições para a efetivação do pluralismo religioso.
CONCLUSÃO:
O conceito de liberdade religiosa mais adequado a um Estado Democrático de Direito é o que propugna o pluralismo. Neste, reconhece-se a importância sócio-cultural do fenômeno religioso, permitem-se as suas múltiplas manifestações e, principalmente, respeita-se a opção/não-opção religiosa. Em um país como o Brasil, onde o sincretismo religioso é a regra, o Mundo da Vida deve ser aberto a todas as formas de crença, podendo conviver cotidianamente com diversas formas morais de existência, em que pessoas igualmente dignas possam buscar a autorrealização segundo seus projetos pessoais de vida boa. Nesse contexto, o discurso ético-jurídico deve ser eminentemente secular, valendo-se de argumentos racionais, e, portanto, refutáveis argumentativamente. Por conseguinte, a dogmática religiosa não deve dominar discursos e posturas dos agentes públicos, sejam eles do Executivo, Legislativo ou Judiciário.
Palavras-chave: Liberdade religiosa, Secularismo, Esfera pública.