62ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 5. História - 1. História da Cultura
UM ESTUDO DA DEVOTIO MODERNA A partir da análise da obra Imitação de Cristo (1420-1440)
Maria Cecília Martins 1
Teresinha Maria Duarte 1
1. Universidade Federal de Goiás
INTRODUÇÃO:

A devotio moderna surgiu entre os Irmãos e Irmãs da Vida Comum, no século XIV. Os Irmãos e Irmãs da Vida Comum eram uma comunidade religiosa católica fundada por Gerard Groote (1340-1382), que pregava uma piedade pessoal e reflexiva usando a Bíblia como recurso. O ideal da devotio moderna se fixou na obra Imitação de Cristo, escrita "entre 1420 e 1440" (CHAUNU, 1993, p.218), por Tomás de Kempis, cônego regular, nascido em colônia, na Alemanha, em 1380. A obra divide-se em quatro livros, o primeiro é chamado de "Avisos úteis para a vida espiritual"; o segundo é o das "Exortações à vida interior"; o terceiro livro é chamado "Da consolação interior"; e o último é "Do sacramento do altar". A opção por estudar o movimento da devotio moderna a partir da análise da obra Imitação de Cristo foi, porque vários autores destacam a importância deste movimento sobre Lutero, e outros mencionam que reformadores e místicos como Teresa d' Ávila e João da Cruz, foram leitores da Imitação (Brandão, s/d p.7). Procuramos compreender os séculos XIV e XV, tempo em que surgiu o movimento da devotio moderna e que foi escrita a Imitação de Cristo; depois, tivemos como objetivo elucidar a relação da devotio moderna e da Imitação de Cristo para o surgimento e desenvolvimento do Cristianismo moderno.  

METODOLOGIA:

A pesquisa partiu de uma revisão bibliográfica para que se pudesse situar devidamente na Cristandade Medieval, os séculos XIV e XV, período de transformações e de grandes crises. Encontramos muita dificuldade com relação a uma bibliografia mais específica sobre a devotio moderna, bem como sobre a Imitação de Cristo, situação decorrente da falta de estudos específicos dedicados a ambos. Feito o levantamento bibliográfico, bem como a leitura e fichamento do referido material, partimos para uma análise e cotejamento da obra em análise, a Imitação de Cristo. O exemplar usado foi uma tradução feita pelo padre José M. Cabral e publicada pelas Edições Paulinas, na 14ª edição, em 1980. Neste cotejamento se procurou verificar como aparece, neste texto, a relação entre a pessoa, individualmente, e Cristo; qual a relevância da vida interior; qual a importância que é dada ao clero e aos sacramentos; e se é dada alguma importância ao culto dos santos e como.   

RESULTADOS:

 A Imitação de Cristo reafirma temas caros à devotio, como a humildade, a obediência, a simplicidade, a devoção, a piedade, a oração individual e a meditação, entre outros. Como a devotio, enfatiza constantemente a vida interior, procura expor uma vida de devoção disciplinada, centralizada na meditação do seguimento da vida de Cristo. Certos ritos continuavam necessários na devotio moderna como a missa e a eucaristia. Houve uma redescoberta das Sagradas Escrituras do Cristo dos Evangelhos e dos escritos dos Santos Padres, dando ênfase a uma religião mais intimista, menos ritualista, mas que não excluía totalmente o padre por ser ele ordenado para celebrar a missa e o único que poderia consagrar o corpo de Cristo. Nem no movimento da devotio moderna e nem na obra Imitação de Cristo há um descaso em relação aos sacramentos, principalmente a Eucaristia, mas também o matrimônio e a penitência foram valorizados. Os santos são venerados tanto na devotio moderna como na Imitação e alguns são citados como modelos a serem seguidos: São Lourenço, São Francisco, Santa Águeda, além dos apóstolos, etc. Se bem que é enfatizado que Jesus Cristo é o supremo modelo a ser imitado na sua perfeição, na sua piedade...

CONCLUSÃO:

Os reformadores dos séculos XVI - católicos e protestantes - foram herdeiros da devotio moderna, especialmente no que tange a uma religião mais interior, mais centrada no indivíduo e mais centrada na leitura da Sagrada Escritura. A Imitação de Cristo, fiel ao movimento do qual originou, deu mais ênfase na vida interior e na divulgação de uma piedade popular onde a caridade, a fé, a humildade passaram a ser mais importante que o formalismo dos ritos, sem menosprezar o culto aos santos e aos sacramentos. Os místicos e os reformadores católicos se apropriaram disso; enquanto, como afirma F. Lau: "É do ideal de piedade da Imitação de Cristo (...) que Lutero se distanciou radicalmente mais tarde" (LAU, 1980, p.23).

Assim, podemos afirmar que a devotio moderna, de certa forma, está na raiz do Cristianismo Moderno, tanto católico como protestante, mas Lutero e seus seguidores se distanciaram da piedade apregoada na obra Imitação de Cristo. Enquanto que, os místicos e reformadores católicos, sobretudo os dos séculos XVI e XVII, a conheciam, liam e possivelmente se deixaram guiar por tal obra. Assim, a Imitação de Cristo exerceu influência apenas sobre os reformadores e místicos católicos.

Instituição de Fomento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq
Palavras-chave: Devotio moderna, Imitação de Cristo, Cristianismo medieval e moderno.