62ª Reunião Anual da SBPC
C. Ciências Biológicas - 4. Botânica - 2. Botânica Aplicada
DIVERSIDADE E POTENCIAL DE USO DE ESPÉCIES ARBUSTIVAS E ARBÓREAS DE UMA ÁREA APURINÃ NO ESTADO DO AMAZONAS, BRASIL
Evandro José Linhares Ferreira 1
João Bosco Nogueira de Queiroz 1
José de Ribamar Bandeira 1
João Lopes Firmino 1
Cleison Cavalcante de Mendonça 1
1. Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia - INPA/Núcleo de Pesquisa do Acre
INTRODUÇÃO:
Os Apurinãs são indígenas que habitam duas áreas indígenas (AIs) de mais de 100 mil hectares localizadas ao longo da BR-317, entre o Acre e o Amazonas. A maior parte das AI's Apurinãs é coberta por florestas primárias ricas, nas áreas de terra firme, em árvores de grande porte como copaíba (Copaifera spp.), cumaru-ferro (Dipteryx odorata), castanheira (Bertholletia excelsa) e seringueira (Hevea brasiliensis). Nas áreas baixas são comuns palmeiras como o açai (Euterpe precatoria), jaci (Attalea butyracea), patauá (Oenocarpus bataua) e, no entorno de vertentes e pântanos, o buriti (Mauritia flexuosa). O fato das AI's Apurinãs localizarem-se ao longo de uma rodovia federal e nas proximidades de um projeto de assentamento do INCRA, está causando uma mudança cultural entre os indígenas. De guerreiros, caçadores e coletores, muitos deles estão tornando-se pequenos agricultores itinerantes e criadores de gado, causando a destruição de áreas florestais importantes para a sobrevivência dos que ainda dependem do extrativismo. Este trabalho consistiu no inventário da diversidade e potencial de uso de espécies arbustivas e arbóreas de uma área florestal Apurinãs para conhecer o potencial de exploração extrativista das mesmas e contribuir para a valorização dos ativos florestais Apurinãs.
METODOLOGIA:
O inventário de campo foi realizado em uma área florestal adjacente à aldeia Chaparral (08°45'27''S; 67°23'49''W. Alt.: 116 m), que faz parte da Área Indígena Camicuã, localizada no Km 163 da BR-317, sentido Rio Branco (AC)-Boca do Acre (AM). O clima na região é quente e úmido, com a temperatura média mensal variando entre a mínima de 23,7ºC e a máxima de 26,3ºC. As médias mensais da umidade relativa do ar variam entre 78,7% e 87,9%. O período chuvoso estende-se entre outubro e abril. O levantamento das espécies foi feito em duas etapas. Inicialmente foram realizadas 16 entrevistas com integrantes de famílias da aldeia seguindo um roteiro semi-estruturado preparado previamente. Com base nos resultados obtidos, foram selecionados os dois indígenas reputados como maiores conhecedores dos recursos florestais locais para a realização de uma extensa entrevista, semi-estruturada e livre, para a elaboração de uma lista de nomes populares e usos das espécies úteis existentes na floresta adjacente. Em seguida, estes informantes conduziram os pesquisadores para uma incursão na floresta, ocasião em que cada uma das plantas mencionadas foi identificada ao nível de família, e, quando possível, de gênero e espécie.
RESULTADOS:
Foram identificadas 75 espécies de hábito arbustivo e arbóreo pertencentes a 27 famílias botânicas. Caesalpiniaceae (7 espécies), Arecaceae (6), Fabaceae (6), Sapotaceae (6), Anacardiaceae (4), Apocynaceea (4), Clusiaceae (4) e Mimosaceae (4) foram as família mais diversificadas. Onze famílias estavam representadas por apenas uma espécie. No que concerne ao uso, 24 espécies eram aproveitadas exclusivamente para a alimentação, 17 forneciam madeira, folhas e outras partes usadas na construção civil, 6 eram consideradas utilitárias, sendo usadas como árvores de espera para caça, auxiliares na pesca, cola natural e substitutas de sabão em pó, 2 eram usadas como medicinais e 1 para a confecção de artesanatos. As outras 25 espécies foram classificadas como de múltiplo uso, sendo usadas como fonte de alimentos, medicinas, madeira, sementes para artesanato e outros usos locais mais específicos. A maioria dos entrevistados, especialmente os mais jovens, conhece muito pouco sobre os recursos da floresta local. A escola e as igrejas das cercanias estão contribuindo para essa alienação cultural, pois não consideram, no sistema de aprendizado e na pregação religiosa, a tradição e os costumes indígenas, inserindo, no lugar, elementos culturais totalmente estranhos.
CONCLUSÃO:
O inventário demonstrou que as florestas Apurinãs são ricas em plantas com potencial de aproveitamento extrativista visando o atendimento das necessidades dos próprios indígenas ou uma eventual comercialização de produtos. Neste último caso, destaca-se a exploração manejada de madeira, a extração e venda de sementes e outros produtos para a confecção de artesanatos e a extração e comercialização de cascas, resinas e óleos medicinais. A realização desse trabalho serviu para divulgar, interna e externamente, o potencial de aproveitamento dos recursos florestais à disposição dos Apurinãs. Indiretamente, ele também é uma forma de valoração dos ativos florestais locais que estão ameaçadas de substituição por áreas agrícolas e de pastagens. A conscientização sobre o valor econômico de uma área florestal factível de geração de renda para os seus proprietários pode contribuir para a sua conservação tendo em vista que qualquer decisão comunitária em relação ao destino da mesma tenderá a gerar debates e reflexões sobre as vantagens e desvantagens advindas da manutenção ou não da floresta. Finalmente, é importante que o conhecimento sobre os recursos florestais por parte de 'experts' Apurinãs de idade mais avançada seja repassado para as novas gerações.
Instituição de Fomento: Projeto de Desenvolvimento dos Povos Indígenas (PDPI)/Funai
Palavras-chave: Apurinãs, recursos florestais, potencial de uso.