62ª Reunião Anual da SBPC
F. Ciências Sociais Aplicadas - 13. Serviço Social - 7. Serviço Social
A EXPRESSÃO DA MULHER NO MOVIMENTO INDÍGENA ANACÉ: PERCALÇOS ACERCA DA REPRESENTATIVIDADE FEMININA NAUFRAGADA FRENTE À PRESENÇA DO MASCULINO
Rafaela Silveira de Aguiar 1
Valdênia Lourenço de Sousa 1
Maria do Socorro Camelo Maciel 2
1. Universidade Estadual do Ceará - UECE
2. Profa. Mestre/Orientadora - Universidade Estadual do Ceará - UECE
INTRODUÇÃO:
Historicamente a sociedade brasileira encontra-se envolta numa cultura de cunho patriarcal. Tal cultura incide sobre as práticas sociais que permeiam o cotidiano de homens e mulheres, independente da pertença de classe ou etnia. É o que se pode observar, por exemplo, em algumas comunidades indígenas. No âmbito da participação e representação política se averigua que no Estado do Ceará, num universo de doze etnias, apenas a etnia Jenipapo-Kanindé conta com a representação política de uma cacique. Por outro lado, a etnia Anacé compreendida nos municípios de São Gonçalo do Amarante e Caucaia no Estado do Ceará conta com uma organização política chamada Comissão da Terra, constituída em 1996 e composta eminentemente por mulheres, o que demonstra um potencial de organização das mesmas e coloca como intrigante o referente alcance no âmbito público, mesmo considerando a histórica negação deste espaço às mulheres. Numa palavra, na etnia Anacé as mulheres são reconhecidas como lideranças políticas no que se refere à questão da terra, mas no que se refere à ampla representação da etnia sua participação é inexpressiva. Desta forma, o presente trabalho busca compreender como se dão as relações de poder e de gênero no movimento indígena Anacé a partir da organização citada.
METODOLOGIA:
Os procedimentos metodológicos foram: levantamento bibliográfico, observação participante e entrevista semi-estruturada, onde se registraram aspectos relevantes a partir dos depoimentos das mulheres pertencentes à Comissão da Terra e outros partícipes do movimento Anacé. Foram entrevistadas seis mulheres com idades entre vinte e quarenta e cinco anos. As pesquisadoras estão inseridas na etnia através do Grupo de Resistência Ambiental por Outra(s) Sociabilidade(s) - GRÃOS do qual são integrantes. Utilizaram-se da observação participante já que tal grupo acompanha e contribui com a resistência indígena de tal etnia frente aos avanços de empreendimentos públicos e privados no seu território.
RESULTADOS:
Encontra-se no município de São Gonçalo do Amarante um expressivo movimento da etnia Anacé formado eminentemente por mulheres, Comissão da Terra, que desde 1996 organiza-se a fim de resistir à invasão de seu território, fortalecer a cultura e a identidade étnica, bem como cultivar a dimensão espiritual. A participação da mulher se faz notar quantitativamente, porém nos espaços de discussão e deliberativos do povo Anacé é notória a supremacia masculina. Constata-se que as relações desiguais de gênero se manifestam também na organização política de tal etnia. Donde, embora as mulheres estejam à frente dessa luta étnica, o reconhecimento na comunidade não se manifesta proporcional ao engajamento. Refletindo em ações sexistas e/ou inferiorizantes oriundos de um arraigado posicionamento sexual de tarefas determinadas pela cultura patriarcal. Quando falamos da atuação da Comissão da Terra no município de São Gonçalo do Amarante revela-se que a diferenciação entre mulher e homem no movimento não chega à proporção que se verifica quando relacionamos com a atuação no movimento geral da etnia. Resultando na constatação de que há uma distinção evidente da inserção da mulher neste movimento indígena, apesar de ser a maioria dos partícipes.
CONCLUSÃO:
Historicamente a cultura brasileira tem sido permeada por relações patriarcais, donde atrela a mulher a um espaço de pouca representatividade pública deixando-a a mercê das ações do âmbito privado. Na comunidade indígena Anacé esta constatação se verifica, porém não deixa de apresentar particularidades. Apesar de que no âmbito local, em São Gonçalo do Amarante, encontra-se certa autonomia e representatividade por parte da Comissão da Terra em sua atuação, sendo uma conquista do gênero feminino. Entretanto, no desenvolvimento das análises deste movimento é notória a demarcação sexual dos espaços públicos e privados pontuando a presença de uma criação cultural histórica. Não aparece de forma clara nos relatos o entendimento por parte das entrevistadas da existência de discriminações sexistas na comunidade, embora no conteúdo dos depoimentos possa se identificar a pertinência de uma relação desigual de gênero, com preponderante dominação masculina. Verifica-se uma credibilidade maior da população no posicionamento masculino em relação ao feminino, mesmo estas mulheres estando à frente do movimento desde o seu início. Tais fatos demonstram práticas arraigadas de uma cultura patriarcal que permeia as relações sociais, não legitimando a participação da mulher nos espaço de poder.
Palavras-chave: Gênero, Mulheres indígenas, Participação política.