62ª Reunião Anual da SBPC
H. Artes, Letras e Lingüística - 3. Literatura - 2. Literatura Comparada
Clarice Lispector e a A mulher que matou os peixes: a literatura infantil no fundo do mar clariciano    
Maria Eliane Souza da Silva 1
Ilza Matias de Sousa 1
1. PPgEL/ UFRN
INTRODUÇÃO:

A Mulher que matou os peixes, livro infantil de Clarice Lispector, reflete como toda obra clariciana inquietações e questionamentos. O livro começa com ela, personagem-narradora, assumindo que matou os peixes e deixando transparecer toda a angústia dessa ação tão indesejável: "Esta mulher sou eu. Mas juro a vocês que foi sem querer. Logo eu que não tenho coragem de matar uma coisa viva! Até deixo de matar uma barata ou outra" (LISPECTOR).

METODOLOGIA:

Presenciamos na escritura clariciana uma mise en scène em que o autor se vê envolvido com situações paradoxais em torno do ato de escrever e do ato de matar, implicando a letra não só como elemento de inscrição, mas como instrumento fálico de poder e de morte. E para relatar o que ocorreu tecemos um "gênero interpretativo" no qual a criança é exposta ao fato do crime e desencadeia estratégias para estabelecer não um espaço de tribunal para a condenação da ré, mas um jogo de afecções e de linguagem que vai adiando e tensionando uma expectativa de posições para o leitor, fora do esquema dos dualismos entre o bem e o mal, o certo e o errado, o culpado e o inocente.

RESULTADOS:

Instaura-se nessa narrativa a escrita como uma pulsão de perversão, colocando-a numa relação com o crime. O ato de escrever equivaleria aí ao ato de matar. Duplo gesto transversal à obra clariciana e que pode apontar para uma reflexão autobiográfica, às vezes de teor confessional, assim aparecendo no discurso engendrado para essa obra infantil.

CONCLUSÃO:
Ao mesmo tempo em que dialoga com o leitor e tenta defender-se da sua não intencionalidade na morte dos peixes, Clarice Lispector faz questionar, refletir, posicionar-se diante dos acontecimentos narrados. Relembra episódios de sua infância, marcando o início da aproximação autor/leitor, desfazendo-se da hierarquia do campo-textual e da subalternidade esperada para o leitor infantil. Ela "atrai" o seu público através de uma linguagem de confrontação de sensibilidades, atribuindo ao mundo dos chamados adultos um embrutecimento com o qual não quer compactuar. A autora utiliza interpolações em espaços discursivos que promovem o adiamento do tempo para a elaboração do problema pela criança. Nesse sentido, ela seria uma Sherazade que adiaria sua sentença de "morte" trançando fios de vida.
Instituição de Fomento: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior /CAPES
Palavras-chave: Literatura infantil, Escritura, Perversão.