62ª Reunião Anual da SBPC
F. Ciências Sociais Aplicadas - 6. Arquitetura e Urbanismo - 5. Arquitetura e Urbanismo
ALÉM DO QUE SE VÊ: TRANSFORMAÇÕES SÓCIO-CULTURAIS E MUDANÇAS NO INTERIOR E EXTERIOR DA MORADIA (NATAL, DÉCADAS DE 1940 - 1960)
Jéssica Régis de Medeiros Costa 1
Angela Lúcia Ferreira 1
1. Departamento de Arquitetura, Universidade Federal do Rio Grande do Norte/ UFRN
INTRODUÇÃO:

O processo de modernização da habitação brasileira ocorria desde o final do século XIX trazendo à moradia novos usos e significados: a casa passa a ser pensada articulada a redes de infra-estrutura e a equipamentos urbanos, e modificações em sua forma e funções são visíveis. Esse processo, que desembocaria na arquitetura de casas modernistas, acentuou-se na capital potiguar a partir da década de 1940, quando a cidade sofre profundas transformações por sediar bases militares da II Guerra Mundial e, com isso, receber um contingente populacional significativo. Nesta mesma década, o Estado, que intervinha diretamente na produção de moradia desde os anos 1930, começa a financiar a aquisição e construção de casas próprias para trabalhadores em Natal por meio dos Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAPs). Ciente da importância dos IAPs na circulação de uma arquitetura moderna, parte-se de sua produção entre as décadas de 1940 e 1960, período em que mais atuou na cidade, para se discutir as razões sócio-culturais que desencadearam mudanças na habitação. O estudo se deu pela análise de exemplares de edificações situadas nos bairros de Tirol e Petrópolis, que desde sua concepção materializaram os anseios modernizadores das elites locais.

METODOLOGIA:

Para o desenvolvimento da pesquisa, utilizou-se como fontes primárias as fichas e as imagens dos processos dos institutos, produzidas pelo grupo de estudo HCUrb com base nos dados do Arquivo do Patrimônio Imobiliário do INSS-RN. Através do estudo dessas fontes, escolheu-se o recorte espacial e temporal mais significativo, tanto pelo maior número de acervo iconográfico, importante no desencadear da pesquisa, quanto, pela particularidade dos bairros já citados, onde se percebeu mudanças mais significativas na habitação. Reuniu-se, então, em planilha de Excel, dados referentes à configuração interna das casas, características de fachadas e implantação nos lotes, além de se dividir por décadas o acervo estudado, a fim de identificar as transformações e permanências mais recorrentes. Para análise, foi importante a discussão do paradigma da modernidade nas modificações como a simplificação e a geometrização das formas, a inserção de recuos e a conformação de zonas mais privativas na habitação. Fundamentou-se, nesse sentido, nas contribuições de Telma Correia, em seu estudo sobre "A construção do habitat moderno no Brasil: 1870-1950", realizado em 2004.

RESULTADOS:

Das 59 edificações estudadas, 15 casas foram financiadas na década de 1940, dentre as quais predominam características do estilo eclético em suas fachadas e configurações interna. Contudo, em alguns exemplares, identifica-se o emprego traços mais geométricos, utilização de vidros e aberturas horizontais nas fachadas; o racionalismo econômico é vislumbrado com o surgimento da sala única e de fachadas menos decoradas, portanto, menos onerosas. Na década seguinte, já são vistos 3 edifícios eminentemente modernistas, incorpora-se elementos vazados: brises e cobogós e, no interior, identifica-se zonas íntimas, sociais e de serviço bem demarcadas. Há, nesses casos, a incorporação da essência modernista, o individualismo está cada vez mais presente no habitat, com o fechamento de quartos inter-comunicantes e presença de espaços privativos. A maioria das casas (70%), entretanto, apresenta transformações pontuais, ora zoneadas, ora com fachadas geometrizadas, e muitas ainda guardam em sua configuração a sala de jantar, símbolo de status eclético. Já nos anos 60, a maioria (60%) das casas financiadas representa o ideário moderno tanto no interior quanto nas fachadas.

CONCLUSÃO:

As transformações sócio-econômicas, filosóficas e culturais estão presentes, não de forma linear, nas fachadas e na configuração interna da moradia. Incorporadas de diferentes maneiras, identifica-se, na produção dos Institutos, tanto exemplares que guardam permanências de estilos mais antigos, quanto edificações que já traduzem melhor as mudanças sócio-culturais em sua configuração: mais econômicas, possuem zonas de privacidade e inserem novas técnicas construtivas. Desse modo, constata-se que as transformações sócio-culturais nem sempre atingem da mesma maneira a todos ou se mostram necessariamente nas moradias, mesmo assim, é importante identificar que há, verdadeiramente, traços dessas modificações repercutidos na arquitetura residencial da época estudada. Com isso, pode-se dizer que as construções aqui estudadas ajudam a narrar, de certo modo, o processo de construção da modernidade da antiga "Cidade Nova". Cada vez mais escassas nos bairros de Tirol e Petrópolis, elas têm sido paulatinamente substituídas por edifícios verticais multifamiliares de alto padrão, constituindo um novo momento de modernização dos bairros.

Instituição de Fomento: CNPq
Palavras-chave: Institutos de Aposentadoria e Pensão (IAPs), Habtat Moderno, Tirol e Petrópolis.