62ª Reunião Anual da SBPC
D. Ciências da Saúde - 7. Fonoaudiologia - 1. Fonoaudiologia
O BRINCAR EM CRIANÇAS PRÉ-ESCOLARES COM QUEIXAS DE ALTERAÇÃO DE LINGUAGEM : IDENTIFICANDO COMPETÊNCIAS.
Amanda Brait Zerbeto 1
Cecilia Guarnieri Batista 1
1. Depto. Desenvolvimento Humano e Reabilitação, Fac. Ciências Médicas, Unicamp
INTRODUÇÃO:
De acordo com a perspectiva histórico-cultural, a linguagem tem grande importância na apropriação de conhecimentos. Assim, é relevante compreender os processos de aquisição de linguagem, bem como atentar para a questão das alterações nessa aquisição. Ao discutir a avaliação de crianças com queixas de alterações no desenvolvimento, as práticas centradas em avaliações padronizadas têm sido questionadas, por mapearem déficits ao invés de buscarem indícios de desenvolvimento. Por outro lado, as avaliações em contexto naturalístico podem propiciar a observação de indicadores de desenvolvimento. Dentre as atividades a serem consideradas, o brincar é muito relevante, pois constitui a maneira encontrada pela criança de se apropriar do mundo e, ao mesmo tempo, transpor a realidade (Vygotsky, 1998). Na criança pré-escolar, uma das atividades que se destaca é o brincar, pois pode promover o desenvolvimento e servir como indicador de habilidades das crianças. O objetivo do presente trabalho é identificar competências cognitivas, sociais e linguísticas de crianças pré-escolares com queixas de alterações de linguagem, em contexto grupal e em contexto de brincadeira.
METODOLOGIA:
Participantes: Os participantes da pesquisa foram 8 crianças, na faixa etária entre 18 meses e quatro anos, com queixas de alterações de linguagem. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa- FCM. Os pais assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, e os nomes das crianças foram substituídos por nomes fictícios no presente relato. Contexto de observação: As crianças foram observadas no contexto das atividades de estágio do curso de Fonoaudiologia (Grupo de Avaliação e Prevenção das Alterações de Linguagem-GAPAL). Nos encontros, as crianças eram encorajadas a brincar com os diferentes materiais disponibilizados, em interação com os estagiários e, se possível, com os parceiros. Procedimentos de coleta e análise dos dados: As sessões foram videogravadas por câmera digital. Foram transcritas oito sessões e analisados 15 episódios. A análise envolveu transcrição das sessões, identificação de episódios significativos (Carvalho & Pedrosa, 2002) e análise microgenética dos episódios selecionados (Góes, 2000). A análise dos episódios foi centrada na busca de competências das crianças e nas formas de mediação dos adultos, com foco nos seguintes aspectos: competências sociais, cognitivas, linguísticas e modos de brincar.
RESULTADOS:
A análise por episódios é ilustrada pela apresentação de um episódio e análise do mesmo. A criança observada é Viviane (V), com 25 meses, que nasceu prematura e apresentou sofrimento fetal crônico. No episódio, V interagiu com as estagiárias, apresentou faz-de-conta relativo a "fazer comidinha" e "alimentar" os patos de plástico. No momento em que uma estagiária perguntou se todos haviam comido, V levou a colher à boca, indicando que faltava ela para ser alimentada. No que se refere às competências sociais, observou-se que, em todos os momentos em que pessoas falaram com V, ela manteve o contato visual com o enunciador. V também mostrou disposição para interações com as estagiárias, participando efetivamente das propostas. Competências cognitivas: V manteve atenção quanto aos eventos ao seu redor, e mostrou conhecimento e apropriação dos gestos típicos do faz-de-conta "preparar e servir comida". Quando a estagiária perguntou se todos haviam comido, V, que ainda não tinha simulado a ação de se alimentar, levou a colher à boca. Competências lingüísticas: atendeu a várias solicitações de outras pessoas, indicando compreensão da linguagem oral, e manteve alternância de turnos na interação com os adultos, sem o uso da linguagem oral.
CONCLUSÃO:
A avaliação da linguagem de crianças pode ser realizada de diversas formas, sendo que a mais tradicional é a avaliação padronizada. Caso esta tivesse sido utilizada para caracterizar as crianças estudadas no presente trabalho, possivelmente estas teriam sido vistas como crianças que não falam ou têm o desenvolvimento da fala atrasado, interagem pouco, não respondem ou respondem de forma insuficiente às perguntas que lhes são direcionadas. Por outro lado, na avaliação em situações naturalísticas e centrada na observação de interações complexas, pode-se focar a atenção nos aspectos presentes, e que são propiciados pelas propostas diversificadas de interação e manuseio de objetos. Dessa forma, é dada ênfase nas capacidades e competências apresentadas pelas crianças, mesmo que pouco freqüentes e em início de desenvolvimento. Por meio da avaliação em contextos naturalísticos, foram identificadas competências nas crianças, em vários aspectos do desenvolvimento. Considerou-se, assim, o brincar, como um contexto propiciador e indicador do desenvolvimento.
Instituição de Fomento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq, Programa Pibic, Unicamp
Palavras-chave: Alteração de Linguagem, Avaliação de Habilidades, Brincadeira faz-de-conta.