63ª Reunião Anual da SBPC
F. Ciências Sociais Aplicadas - 10. Comunicação - 4. Jornalismo e Editoração
OS INTERESSES POLÍTICO-PARTIDÁRIOS E PUBLICITÁRIOS DO JORNALISMO CIENTÍFICO NO BRASIL DO SÉCULO XIX AO SÉCULO XXI: UMA ANÁLISE ETNOMIDIALÓGICA
Ricardo Alexino Ferreira 1
1. Professor Doutor do Departamento de Comunicações e Artes da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo – USP
INTRODUÇÃO:
Na segunda metade do século XIX o Brasil aspira se tornar uma nação com ideais “civilizatórios” e eurocêntricos e vai, através dos jornais, expressar tais sentimentos. Para isso, busca no Positivismo e no Darwinismo Social – os dois grandes paradigmas vigentes na época – as suas grandes pautas e temáticas jornalísticas, que são retomadas no final do século XX e começo do século XXI.
Nesta pesquisa foram verificados os seguintes aspectos: a) Gêneros e formatos dos textos jornalísticos em matérias de divulgação científica que abordaram questões étnicas, raciais e de cunho geneticista; b) Analisada a influência dos aspectos culturais, políticos e econômicos sobre a construção da informação científica nas páginas desses jornais; c) Verificado como as temáticas geneticistas, étnicas e raciais do século XIX, no ápice do conceito evolucionista de Darwin, agendaram os rumos políticos, culturais e sociais do Brasil enquanto projeto de nação.
d) Verificou-se, ainda, que a construção do jornalismo científico brasileiro, em sua gênese na segunda metade do século XIX, está vinculada com a questão étnico-racial; e) E como os interesses político-partidários e publicitários determinam o agendamento do jornalismo científico.
METODOLOGIA:
Para a realização da pesquisa foram analisados textos jornalísticos publicados nos jornais Correio Paulistano e Província de São Paulo (depois da Proclamação da República chamado de O Estado de S. Paulo), da segunda metade do século XIX, com enfoque em divulgação científica (publicados nas Seções Scientíficas). Foram analisadas também publicações da contemporaneidade como os jornais O Estado de S. Paulo e Folha de S. Paulo e as revistas Isto É e Veja.
Para entender o papel dos jornais dos dois períodos (segunda metade do século XIX e final do século XX) enquanto representação da ciência e a sua divulgação, foram analisados os aspectos políticos, econômicos, sociais e culturais desses momentos históricos e os seus contextos e conexões. Para analisar as matérias foi utilizado o método de análise de conteúdo, observando-se a estrutura do texto jornalístico (lead, linha fina, título, box, retrancas, infografias e outros recursos) das matérias selecionadas. A pesquisa ainda se apoiou metodologicamente nas Teorias da Etnicidade e nas Teorias do Newsmaking (critérios de noticiabilidade, conceito de gatekeeper, dentre outros).
RESULTADOS:
Nos jornais da segunda metade do século XIX temas ligados à Ciência são publicados com freqüência nas páginas dos jornais e criam uma simbiose entre imprensa e ciência reforçando a idéia de hierarquização de raças humanas.
No entanto, observa-se que nos finais do século XX e início do século XXI tais temas são resgatados pela imprensa trazendo as mesmas temáticas científicas, envolvendo o conceito de raça. No entanto, enquanto o século XIX reafirma as teorias raciais, o final do século XX nega as existências de raças humanas, baseado nos resultados das pesquisas do Projeto Genoma (responsável pelo mapeamento genético humano) e vai afirmar a existência de apenas uma única raça humana, considerando que os traços fenotípicos, antes considerados como evidências da raça do indivíduo, são insignificantes na totalidade dos genes, reforçando, dessa forma, o conceito de etnia.
CONCLUSÃO:
Nesta pesquisa foram analisados os textos jornalísticos com angulações científicas, desenvolvidos nas publicações da segunda metade do século XIX, final do século XX e início do século XXI. Observou-se que a imprensa da segunda metade do século XIX favoreceu a inserção da ciência como legitimadora do sistema social vigente, que tenta buscar nas contradições étnicas, culturais e sociais da época a formulação de teorias raciais e hierarquização de raças.
A mesma pauta jornalística do século XIX é retomada na contemporaneidade agora para negar a existência de raças humanas. As pautas jornalísticas da contemporaneidade divulgam intensamente os resultados das pesquisas do Projeto Genoma, que constata existir apenas uma única raça humana, porém com diferenças étnicas e fenotípicas consideradas insignificantes e de difícil mensuração no mapeamento genético.
Assim é possível observar que a imprensa – tanto do século XIX (que reforça conceitos racistas) como as do final do século XX e início do século XXI (que reforça a questão da diversidade e da “democracia étnica”) – adéqua os seus discursos à pauta política vigente. Ou seja, em todas as épocas estudadas nota-se que a ciência midiática é abordada muito mais por aspectos políticos, culturais e publicitários do que propriamente científicos.
Palavras-chave: Etnomidialogia, Midialogia Científica, Jornalismo.