63ª Reunião Anual da SBPC |
G. Ciências Humanas - 1. Antropologia - 5. Antropologia Urbana |
A TRANSFORMAÇÃO DE CHÁCARAS EM CONDOMÍNIOS HORIZONTAIS: O RECENTE CASO DE VICENTE PIRES, DF |
Bruno Cesar Medeiros Cassemiro 1 Cristina Patriota de Moura 2,1 |
1. Dept. de Antropologia, Intituto de Ciências Sociais - UnB 2. Prof. Dra./Orientadora - |
INTRODUÇÃO: |
O lócus da pesquisa foi Vicente Pires, cidade periférica que dista 20km do centro de Brasília. Ela atualmente conta com uma urbanização intensa, que culminou, em menos de vinte anos, numa população de mais de 70mil hab. Além da rápida urbanização, o que chama atenção de qualquer transeunte é o tipo de moradia escolhido pela maioria da população: condomínios horizontais. Eles são a realização de um sonho e materialização de um estilo de vida. Atualmente Vicente Pires é a trigésima região administrativa do DF e conta com malha viária, telefônica, sede administrativa e comércio consolidado. A par disso estão as chácaras, que destoam em meio a paisagem urbana da cidade. Cada chácara deu origem a um condomínio. Na década de 1990 a figura que destoava em meio às chácaras era o condomínio. Em 2010, a realidade que destoa entre o mar de condomínios são os pequenos prédios, sem esquecer os lotes com pequenos quartos para aluguel, conhecidos como "cortiços" ou "kitnets". Atualmente toda a localidade passa por um processo de regularização complexo, envolvendo atores com os mais diferentes interesses: moradores de beira de córrego, chacareiros, comerciantes, condôminos (horizontais e verticais) e "baixa renda". |
METODOLOGIA: |
A pesquisa tentou perceber quais os motivos que levaram os chacareiros, produtores desde a década de 1980, a venderem suas chácaras ou permitirem a "grilagem" ou "parcelamento ilegal" das propriedades que possuíam. Buscou-se, então, participar das reuniões da ACVP, Associação dos Chacareiros de Vicente Pires. O grupo se reúne todos os sábados na chácara do presidente desde o ano de 2007. As reuniões e eventos públicos, audiências e solenidades, foram acompanhadas presencialmente, utilizando-se o método antropológico da observação participante. Também foram coletados relatos de vida de moradores da região, sendo: dois chacareiros,um condômino, dois líderes comunitários de outra associação de moradores local e de um morador que trabalha na localidade. Também foram muito importantes para a pesquisa notícias veiculadas em meios impressos e digitais, que ajudaram a perceber o processo de regularização a partir da mídia e a visão dos órgãos governamentais. |
RESULTADOS: |
Foi possível identificar duas dinâmicas concorrentes e complementares que ajudam a entender a transformação de chácaras em condomínios. A primeira se revela quando percebemos os primeiros chacareiros de Vicente Pires como candangos ou pioneiros, buscando construir suas vidas na capital de diversas maneiras. A segunda consiste nos constantes “ataques” feitos aos chacareiros. Ele é diversificado, compreendendo o ataque simbólico, o choque de valores entre urbano e rural, e ameaças à integridade física do chacareiro e seus familiares. Aliás, a pesquisa mostrou homens e mulheres que não percebem congruência, na hora da venda das chácaras, entre o equivalente monetário e a propriedade. Após a venda surge a categoria nativa do “arrependimento”. O conceito de chácara transformou-se ao longo de 15 anos, tornando-se um composto importante dentro de uma paisagem heterogênea e em constante transformação. O surgimento e acompanhamento de associações de moradores territorializadas ajudou de sobremaneira a entender anseios, planos, valores e objetivos de moradores e seus associados, evidenciando, aqui, processos de ocupação e construção da cidade. |
CONCLUSÃO: |
O processo de regularização fundiária é, antes de mais nada, processo de atribuição de status, definição de situações indefinidas. E cada grupo identificado na pesquisa concorre entre si para atingir o status desejável. Para o condômino a regularização é a passagem de "irregular" para "regular". Do ponto de vista do chacareiro percebe-se um processo excludente e eliminatório. Excludente por não atender a todos os anseios dos chacareiros que há mais de duas décadas buscam a titulação fundiária. Eliminatório pela morosidade jurídica e pelos constantes “ataques”, potencializados com a constante, rápida e interminável urbanização. Surge, assim, um paradoxo: “porque é que quem conservou e seguiu a lei agora vai ser prejudicado?”. Talvez a "cura" para o "câncer" fulminante, que fez mais de duas centenas de chacareiros irem “morar na praia”, seja a titulação fundiária, direito socialmente reconhecido e valorizado. É a “cura” que dá segurança onde tudo é inseguro, indefinido e irregular. Antes de mais nada, a regularização permitiria “curar” toda a turbulência psicológica pela qual os chacareiros e seus familiares passam. A propriedade não é só lugar físico. É lugar social, aqui psicologicamente atormentado. |
Palavras-chave: Brasília, Urbanização, Regularização. |