63ª Reunião Anual da SBPC |
H. Artes, Letras e Lingüística - 3. Literatura - 1. Literatura Brasileira |
O TECER DA INTRIGA: O TEMPO E A NARRATIVA NA POÉTICA DE GERARDO MELLO MOURÃO |
Junior César Ferreira de Castro 1 Jamesson Buarque de Souza 2 |
1. Mestrando em Letras e Linguística - Faculdade de Letras - Universidade Federal de Goiás - UFG 2. Prof. Dr./ Orientador: Faculdade de Letras - Universidade Federal de Goiás - UFG |
INTRODUÇÃO: |
Com o nascimento da filosofia, da ciência e da religião, o homem deixou de fazer parte do mundo de uma cultura fechada e marcada pela coletividade de um povo, para se inserir em uma época cindida pela individualidade. O rompimento dessa identidade pura levou o mundo a adquirir outra maneira de pensar e agir em sociedade, indagando, sobretudo, os valores sócio-culturais e, principalmente, do novo papel do historiador e do poeta. Sabendo-se, então, que a Íliada, de Homero, é uma epopeia propriamente dita e que pertence a um contexto histórico em que transcendência e imanência foram convergentes, passamos a questionar a possibilidade de se configurar um poema épico na contemporaneidade com “O país dos mourões” e Invenção do mar de Gerardo Mello Mourão. Dessa forma, buscamos analisar, definir e teorizar o tempo e a memória como elementos formadores do poema em estilo épico e, ainda, apresentar o universalismo e o regionalismo do poeta em unificar a cultura brasileira com a tradição clássica. Assim, o nosso objetivo, além de traçar um estudo da formação do épico, é contribuir com a fortuna crítica literária. |
METODOLOGIA: |
A pesquisa fundamenta-se por um viés estético-filosófico, na formação do poema em estilo épico e na pertinência da epopeia a partir da interrelação do tempo com a verdade e a historia. Dessa maneira, traçamos um estudo teórico tratando da fenomenologia do tempo por meio da estética transcendental de Kant, da tríplice temporal de Santo Agostinho, da teoria do muthos de Aristóteles, da tríplice mimética de Ricoeur e, por último, questionamos os conceitos sobre verdade e mentira de Platão. Para isso, adotamos uma estratégia sistematizada que buscasse a reflexão da composição do épico partindo da Antiguidade, com a Ilíada, de Homero, passando pelas portas do Renascimento, com A Divina Comédia, de Dante Alighieri, até a contemporaneidade, com “O país dos mourões” e Invenção do mar, de Gerardo Mello Mourão. Após a análise dos dados, levamos para a comunidade acadêmica, nos simpósios e colóquios de Letras, questões que discutissem o ato de tecer a intriga junto com o resgate do passado pela memória de um povo como produto que vem firmar o épico na contemporaneidade. Além de tudo, baseamo-nos em um estudo hermenêutico que entendesse o poema épico não como gênero, mas por "estilo" devido à presença do hibridismo intergênero na poética de Mello Mourão. |
RESULTADOS: |
Entendendo-se a epopeia como um conjunto da concepção do mundo e da vida de uma nação que, apresentado sob a forma objetiva dos acontecimentos reais, constitui o seu conteúdo e determina a forma do épico, chegamos à ideia de que o historiador estabelece o passado como sucessão de eventos e o poeta o resgata pela memória como acontecimentos anteriores ao presente do passado. Assim, verificamos que a verdade, em Aristóteles, está na mimese, pois a imensidade e o materialismo da poesia parte do texto para o particular, ao contrário de Platão que parte da polis, levando em consideração a justiça e o real. Nesse sentido, Homero retratava a verdade de maneira que estivesse ligada a uma referencialidade (guerra de Troia), constituindo o épico como identidade una. A Divina Comédia não é considerada uma epopeia nos mesmos princípios que a Ilíada por não se tratar de uma historia fabular onde o herói fundou ou glorificou um povo, mas constitui uma unidade total por ter uma identificação com possível integração entre obra e mundo. O poema em estilo épico de Gerardo Mello Mourão será possível quando o tempo se humanizar pelo ato configurativo junto ao tecer da intriga, e que “a narrativa atinge seu pleno significado quando se torna condição da existência temporal” (RICOEUR, 1994, p. 85). |
CONCLUSÃO: |
A formação da epopeia nos dias atuais ocorrerá na medida em que o poeta materializa o tempo durante a tessitura da intriga, pois a narrativa já é, pela sua estrutura, uma forma de explicação capaz de estabelecer que a historia reinscreve o tempo da narrativa no tempo do universo. Nessa perspectiva, entendemos que a intriga é construída, segundo Ricoeur, entre três modos miméticos: prefiguração, configuração e refiguração. Portanto, antes de compor o poema épico, é preciso uma pré-compreensão (mimese I) daquilo que é representado, em seguida, extrair da historia uma pluralidade de fatos em uma mesma historia (mimese II) e, por fim, mediar à relação do mundo do texto com o mundo do leitor exibindo a temporalidade especifica (mimese III). Assim, estamos ampliando o estudo da épica e contribuindo com os leitores onde os mesmos podem identificar que o tempo não é anterior a historia, mas simultâneo. Quanto mais nos afastamos do passado, perdemos essa identidade e, na tentativa de buscá-la pela memória tornamo-la como fator da verdade. Logo, é nesse jogo de buscar a referência cruzada entre a pretensão à verdade da historia junto à memória e a armação da intriga pela tríplice mimética é que podemos falar em um tempo narrativo na poesia épica contemporânea. |
Palavras-chave: Poema em estilo épico, Contemporaneidade, Gerardo Mello Mourão. |