63ª Reunião Anual da SBPC
H. Artes, Letras e Lingüística - 5. Semiótica - 1. Semiótica
“A NOIVA ESTAVA DE PRETO”, UMA ANÁLISE SEMIÓTICA EM TRUFFAUT
Sady Carlos de Souza Júnior 1,2
1. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo/USP
2. EE. Solon Borges dos Reis
INTRODUÇÃO:
Objetivamos traçar algumas linhas semióticas na análise de um curioso filme de efeitos contrastantes no seu percurso narrativo. O filme “A Noiva Estava de Preto” (La marieé était em noir), de produção franco italiana, em 35 mm, foi dirigido por François Truffaut em 1968 e teve por elenco Jeanne Moreau, Michael Bouquet, entre outros. O filme relata que após tentativa de suicídio a viúva Julie Kohler persegue cinco homens que assassinaram seu marido nas escadarias da igreja, após concluída a cerimônia de casamento.
Neste sentido, película “A Noiva Estava de Preto” pode ser compreendida, metalinguisticamente, como uma história de “viúva negra”: consiste na investida de um actante feminino contra a vida de actantes masculinos, tal qual o aracnídeo de mesmo nome, que devora o macho durante o acasalamento.
O casamento é um ritual social em que um casal se une e se apega um ao outro, psicologicamente. O apego simples de um ao outro do casal tornar-se-á uma propriedade privada em comum e legal. É em busca de vingança desta perda, que motiva a personagem homicida da narrativa, e a move, por conseguinte, à ação do programa narrativo do filme.
METODOLOGIA:
Utilizaremos nesta análise o modelo dos termos contrários do quadro da estrutura greimasiana começando por avaliar o próprio nome do filme. Ao espectador a personagem da noiva “de preto” causaria certo impacto, primeiramente pela cor que se esperaria branco. O “preto” adverte semas morais contraditórios ao “branco”, ou seja, enquanto o “branco” atualiza os símbolos da pureza, inocência e o bem; do preto, viria elementos escuros: o mal, o medo, o crime e a morte.
Readquirindo forças, a Noiva Julie ferida assume o dever fazer justiça por si mesma através da Pena de Talião = “olho por olho, dente por dente”. A ideia fixa da morte como objetivo a ser alcançado primeiramente como suicídio, se transmuda em vingança homicida, e torna-se uma obsessão doentia que desencadeará os assassinatos para consumação psíquica da transferência.
A relação dos metatermos lingüísticos do Ser/Não Ser passam à estrutura narrativa dos contrários de Vida/Morte, tal como esta “noiva de branco” (esperança) é contrário de “noiva de preto” (desesperança). A “noiva estava de preto” é, portanto, a negação da noiva de branco, porém o título do filme representa a fixação semântica da posse do “ser noiva” durante todo o filme, apesar dela vestir preto apenas no final.
RESULTADOS:
O ideal de um casamento, como um momento religioso faz parte das esperanças femininas de constituição da família, da continuação da vida. Assim, o casamento, como uma união social entre um homem e uma mulher, significa, semioticamente, uma conjunção com a realidade, enquanto que a morte ou assassinato, seria o oposto, uma disjunção da mesma. Esta relação de contrários justifica a perturbação psicológica que a protagonista apresenta a ponto de podermos unir o casamento “de branco” do início com o funeral “de preto” do final do filme.
O filme de Truffaut concebe uma narrativa fechada idealmente a fim de que todos tenham idêntico fim - sejam penalizados igualmente. Por isso Julie, depois, mesmo encarcerada, consegue a morte da sua última vítima.
Para esta arquitetura estética entabular um crime perfeito, deveria haver uma consciência de atos de ambos os lados. Entretanto, em outra análise esta narrativa parece se contradizer entendendo a morte inicial do Noivo como mero acidente. O parecer “fechamento” estético da narrativa abre-se novamente quando descobrimos a trama contraditória, já que o primeiro homicídio casual ou desmotivado evolveu para nenhum dos personagens saber de imediato sobre sua morte. É a mesma trama do destino humano, retratado pelas tragédias gregas.
CONCLUSÃO:
O metatermo “Não Ser” da Morte/Tanatos, está psicanaliticamente metamorfoseado no assédio da viúva às suas vítimas. Primeiro ela retém as suas vítimas através do engano e da empatia: um “parecer” Amor (acasalamento), para desencadear, depois, o seu contrário (a morte).
Assim, o percurso narrativo fílmico que trouxe a disjunção da Noiva Julie de seu Noivo (assassinado), repercutirá também na disjunção dos “assassinos” da sua mente delirante. Inconscientemente, é o fim do apego à propriedade privada ao Noivo e dos objetos da Vida. É o fim do desejo freudiano.
A efemeridade do Noivo, do bem, é o da justiça. Neste sentido, Truffaut faz o idealismo estético da preconcebida justiça natural se transformar exatamente num existencialismo sartreano, - não há uma verdade ou justiça absoluta para se defender, para se argumentar, pois tudo remete a uma ação fragmentária e particular .
Palavras-chave: Truffaut, Análise Semiótica, Filme.