63ª Reunião Anual da SBPC
F. Ciências Sociais Aplicadas - 5. Direito - 13. Direito
A EXPERIÊNCIA AFETIVA DA INJUSTIÇA: DITADURA MILITAR E ANISTIA
Lila Maria Spadoni Lemes 1
Douglas Rodrigues Barbosa 2
Germano Campos Silva 3
1. Profª. Drª./Orientadora - Doutora em Psicologia - Université Paris Descartes
2. Aluno de graduação em Direito - UniEVANGÉLICA
3. Doutorado em Direito - Universidade de Compostela - Diretor do Curso de Direito da UniEVANGÉLICA
INTRODUÇÃO:
O objetivo desta pesquisa é analisar o impacto afetivo dos julgamentos da Caravana da Anistia em seus participantes, sejam eles possíveis anistiados, familiares, amigos ou curiosos. Temos a hipótese de que as experiências injustas tais quais as vividas pelas vítimas da Ditadura Militar no Brasil, são intensamente afetivas assim como a experiência de ter seu sofrimento reconhecido pelo Estado através da Comissão da Anistia. Logo pretendemos investigar as características dessa experiência ímpar. Para isso foi realizado um estudo exploratório descritivo, onde foi analisado o tipo de injustiça sofrida, o resultado do processo de anistia, a avaliação do caráter justo ou injusto das decisões da comissão e do comportamento das autoridades, e o sentimento após a sentença. As Caravanas da Anistia se inserem num contexto maior de luta pelo Direito à Memória e a Verdade previstas no PNDH-3. Elas julgam processos de violação dos Direitos Humanos no período da ditadura militar. Uma vez julgado e constatado, a comissão pede desculpas em nome do Estado brasileiro e pode indenizar os cidadãos.
METODOLOGIA:
Os participantes foram 36 pessoas que compareceram a 36ª Comissão da Anistia em Anápolis, Goiás, no mês de maio de 2010. Desses participantes, 28% são pessoas com processos de anistia, 30% são familiares desses últimos, 14% amigos e 28% são curiosos ou estudantes de Direito. A média de idade é 49 anos sendo que o desvio padrão é de 19,2. 63% dos participantes são do sexo feminino e 37% do sexo masculino. Quanto ao grau de escolaridade, 38% possuem o segundo grau e 38% possui curso superior, sendo que os demais participantes se omitiram nessa questão. Os questionários foram passados durante as sessões da 36ª Caravana da Anistia. Os participantes responderam individualmente as questões.
RESULTADOS:
Os resultados foram tratados estatisticamente em termos de freqüência e porcentagens. Perguntamos aos participantes qual o tipo de injustiça que eles sofreram (ou parentes ou amigos) durante o período da Ditadura Militar. As respostas demonstram que 44% sofreram a perda dos Direitos Políticos e Tortura. Houve também 47% que tiveram seus parente ou amigos mortos, 19% foram presos e 16% foram exilados. A maioria dos participantes teve uma sentença favorável a seus processos de anistia e indenização. Apenas 6% tiveram sentenças desfavoráveis. Perguntamos aos participantes se eles consideraram os processos justos ou injustos. Os processos foram considerados justos por todos os participantes. Em seguida pedimos que eles avaliassem o comportamento das autoridades da Comissão de Anistia. A média de satisfação é quase máxima. A fim de avaliar os aspectos afetivos da experiência da injustiça, perguntamos o sentimento após a sentença da Comissão de Anistia sobre o processo. Os participantes relataram sentir “justiça” (44%), “alívio” (28%) e “reconhecimento” (8%).
CONCLUSÃO:
Os processos julgados pela Comissão de Anistia tiveram um impacto positivo sobre a experiência das pessoas. Observamos que as experiências vividas durante a Ditadura Militar se caracterizam pela perda de Direitos Fundamentais, que ferem a dignidade humana e trazem sofrimento. No entanto, a experiência de passar pelo processo da Comissão de Anistia é relatada como geradora de sentimento de justiça e alívio. Não podemos afirmar que “Justiça” seja um sentimento, no entanto sabemos que a justiça possui aspectos afetivos que, nesse caso, foram ressaltados pela intensidade da emoção envolvida nos processos mentais dessa experiência. O pedido de desculpa do Estado atende as proteções da primeira geração dos Direitos Humanos, ou seja, na proteção dos direitos individuais face às arbitrariedades do estado. Os resultados demonstram que essa experiência gera uma satisfação nos participantes que avaliam bem os comportamentos das autoridades, aumentando a legitimidade do estado como prevê a teoria da justiça procedural. O reconhecimento da culpa estatal pelas injustiças sofridas pelos cidadãos tem um efeito reparador sobre os sentimentos e as memórias desses indivíduos, de seus parentes e amigos e até mesmo de pessoas simpatizantes que não são diretamente implicadas nesse processo histórico.
Palavras-chave: Injustiça, Aspectos afetivos, Anistia.