63ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 9. Sociologia - 7. Sociologia
POÉTICA, DEMÔNIOS E MISÉRIA EM DOSTOIÉVSKI: TEXTO E CONTEXTO
Ariel David Ferreira 1
Sebastião Rios Corrêa Júnior 2
1. Faculdade de Ciências Socias - UFG
2. Professor Dr. Orientador - Faculdade de Ciências Sociais - UFG
INTRODUÇÃO:
Fiódor Dostoiévski produziu seus romances na segunda metade do século XIX, quando a Rússia se defrontava com complexas questões históricas de fundo político, social e moral, já que o ocidente capitalista escancarava a porta russa e devassava a diversidade de mundos e grupos sociais.
Suas obras dialogam a arte poética com o contexto histórico, cultural, social e econômico da Rússia da metade do século XIX. Em seus trabalhos, Dostoiévski inova com algo que Mikhail Bakhtin chama de polifonia, onde o herói é interpretado como autor de sua própria concepção filosófica e plena independente da visão artística do autor. O que configura nos termos de Goldmann (1990) a notável história do herói degradado, um personagem problemático na busca degradada e, por isso, inautêntica de valores autênticos em um mundo de conformismo e convenção.
Com fins de analisar algumas representações do contexto histórico, social, cultural, e econômico da Rússia da segunda metade do século XIX nos romances de Fiódor Dostoiévski: Irmãos Karamazov, Crime e Castigo, O Idiota, Noites Brancas e Memórias do Subsolo, considerando subsidiariamente os últimos quatro citados, propondo relacionar a poética de Dostoiévski a representações e noções de razão, religião, subúrbio e miséria este trabalho foi produzido.
METODOLOGIA:
Este trabalho apresenta um caráter fundamentalmente teórico, e apóia-se nos discursos históricos, sociológicos e culturais identificados a partir de análises dos romances e contos polifônicos de Fiódor Dostoiévski. Constituindo-se o trabalho na leitura das narrativas de Dostoievski e em fortunas críticas.
Para a análise das narrativas selecionadas de Dostoiévski utilizamos como base alguns avanços da teoria literária, neste ponto entram obras selecionadas de Goldmann Lucien, Antonio Candido, Ian Watt e Mikhail Bakhtin, em um estudo capaz de conciliar as dimensões estéticas e sociológicas das narrativas apresentadas.
Utilizando destes referenciais teóricos, firmamos a integração indissociável de elementos subjetivos e objetivos, já que a realidade social, que fornece ao escritor o impulso para sua realização, não é a única responsável pelo aspecto histórico e social da obra literária; também o autor o é, porquanto ele não vive desligado ou desintegrado do seu contexto social, das suas heranças, do seu idioma e da sua tradição literária e cultural (Salles, 1973: 32) sendo o conhecimento de todos esses aspectos essencial na construção da análise literária.
RESULTADOS:
Em Os Irmãos Karamázov desgraça e miséria feudal são temas sempre presentes. À miséria feudal Fiódor Pávlovitch entrega seus filhos, e se esta, não fosse tão bondosa na face de seus criados, três personagens principais não existiriam até o fim da ficção. Ao se considerar o modo de organização da casa russa fica obvia a miséria à criadagem, já que a casa era administrada com cunho super autocrático pelo bolchak. Mas, nada tão diferente se espera encontrar em um romance de um autor que enfrentava o drama da problemática financeira todos os dias.
A noção suburbana de espaços, idéias e personagens, é, ao lado da miséria, tema recorrente em sua obra. Sua mais forte presença é todo um romance dedicado a isto, o intitulado “Zapíski iz podpólia", em português: Notas do subterrâneo. Podpólia ou “subsolo” é, entretanto, também termo que designa atividade clandestina e subversiva, que a propósito muito ocorre nos romances. A prostituta Sônia de Crime e Castigo, o quarto mofado de Noites Brancas, a mansão sombria de Rogójin em O Idiota, o cubículo de Raskólnikov em Crime e Castigo, as crises epiléticas do príncipe Míchkin em O Idiota e a fúria de Dmítri em Os irmãos Karamázov, são alguns exemplos destes diversos heróis e locais demoníacos, desgraçados, caracterizados por Lukács e Ian Watt nas narrativas de Dostoiévski.
CONCLUSÃO:
Tendo como objetivo apresentar uma interpretação de Dostoiévski da Rússia do século XIX em suas narrativas selecionadas, buscando relacionar a poética da narração de Dostoiévski a discursos históricos, sociológicos e culturais este trabalho foi realizado.
Pressupor a necessidade em um trabalho sobre o tema Literatura e Sociedade de se valorizar na análise tanto a narrativa em si quanto a representação social que esta apresenta mostrando que ficção e realidade estão muito próximas, sendo a primeira mais uma forma de se captar a segunda, propondo junto à poética, idéias do próprio autor, no caso graças ao caráter polifônico muito mais as concepções de seus personagens, afirmando a crítica fundamentada destes personagens ao invés de simples imaginação ou alienação do autor, tornaram este trabalho possível.
Dostoiévski nos aparece, portanto não somente um grande escritor de romances. Suas obras foram estudadas e serviram de matéria para outros grandes teóricos, como Sigmund Freud e Nietzsche. Dostoiévski e seus personagens se apresentam como grandes intérpretes dos temas de fundamental importância para seu período e até mais para os períodos que se seguem.
Palavras-chave: Literatura e Sociedade, Fiódor Dostoiévski, Os irmãos Karamázov.