63ª Reunião Anual da SBPC
F. Ciências Sociais Aplicadas - 5. Direito - 11. Filosofia do Direito
PODER E CIVILIZAÇÃO: TRÊS ABORDAGENS TEÓRICAS
Gustavo Vieira Vilar Garcia 1
José Querino Tavares Neto 2
1. Faculdade de Direito - UFG
2. Prof. Dr./ Orientador - Faculdade de Direito - UFG
INTRODUÇÃO:
O poder como objeto da ciência do direito parece se reduzir a um limite bastante estreito, qual seja o da legalidade. Se o domínio é evidenciado como imposição de algum comando legalmente admitido, não haveria muito mais que se inquirir acerca da legitimidade ou validade desse imperativo, porquanto resguardado pela lei igualmente imposta. Através da comparação entre três aproximações teóricas dos fenômenos de poder, presentes nas obras de Rousseau, Freud, especialmente na interpretação sociológica de Marcuse, e Foucault, este trabalho pretendeu compreender os limites de seu entendimento como manifestação de uma ordem repressiva jurídico-estatal e, então, verificar de que forma outros pensadores dedicaram sua análise aos efeitos e conceitos da dominação, em contraposição aos estritos parâmetros oriundos da teoria política clássica e da ciência do direito.
METODOLOGIA:
O trabalho foi desenvolvido especialmente em nível teórico, a partir de duas fontes principais: Primeiro, através da revisão bibliográfica de obras que tratam do tema; livros, periódicos, relatórios, teses, dissertações, artigos de revistas especializadas e materiais divulgados pela internet. Segundo, por meio de entrevistas com juristas estudiosos da psicanálise e da participação em grupos de estudo relacionados à temática desenvolvida.
RESULTADOS:
A identificação do poder e de seu exercício com as normas emanadas do Estado, que assumem os atributos de imperatividade e obrigatoriedade, parece ser imediata, especialmente em se tratando de uma análise jurídica do poder. Esse reconhecimento, entretanto, ignora a existência de mecanismos intricados e que se revelam, intimamente, nas mentes e corpos dos indivíduos dominados. Para além do entendimento da filosofia política clássica, de opressão como o exercício do poder numa ordem em que se rompe a legalidade, outra perspectiva teórica alcançou notável prevalência histórica, a saber: a de que o poder é de natureza essencialmente repressiva. É o que se apresenta nas obras sociológicas de Freud e, especialmente, em sua interpretação de matriz marxista em Eros e Civilização de Herbert Marcuse. Da opressão à repressão, a modificação conceitual projetou sobre a constituição mesma da dominação a marca da repressividade, entendida por Marcuse como motor de desenvolvimento do capitalismo tardio e fundamentalmente caracterizada no trabalho alienado. A essa perspectiva irá se opor Michel Foucault, em sua Microfísica do Poder, onde pretendeu trazer à tona espaços e mecanismos de poder muito mais enredados, componentes de uma tessitura complexa e ampla ao ponto de alcançar veladamente a própria consciência dos dominados.
CONCLUSÃO:
A juridicidade do poder cujo limite é a legalidade; a repressividade do domínio, lastro fundamental do desenvolvimento do capitalismo e da própria cultura ocidental; a íntima infiltração do poder nas tramas mais remotas do corpo e da mente dos súditos e a capacidade produtora de saber dos diversos modos de poder. Foram esses os três tipos, as três perspectivas do pensamento analisadas e confrontadas, em busca das linhas básicas pelas quais se exerce o domínio. Sua constituição plasmática, confusa e sujeita a profundas modificações conforme se transforme o olhar daquele que se propõe a compreendê-lo e traçar seus caracteres essenciais, parece indicar a fragilidade de sua representação sob alguma forma ou mecanismo fundamental. Foucault identifica com argúcia manifestações de poder ocultas sob a imagem de ciência, não em sua relação de domínio técnico, mas na capacidade da criação de saberes, de produção de discurso, e evidencia uma rede de poder de tamanha abrangência e capilaridade, que parece tornar-se constituinte da própria subjetividade do indivíduo. A compreensão de um mesmo fenômeno em tantas e tão diversas conceituações talvez seja o mais nítido sintoma de sua imprecisão e de sua capacidade de integrar-se às mais recônditas tramas da sociedade.
Palavras-chave: Poder, Legalidade, Repressão.