63ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 2. Arqueologia - 2. Arqueologia Pré-Histórica
ANÁLISE DA INDÚSTRIA LÍTICA DO SÍTIO ARQUEOLÓGICO GARIMPO DO TURCO, NA REGIÃO DE DIAMANTINA, MINAS GERAIS
Rafael Esteffanio Miranda 3,2
Andrei Isnardis Horta 1,2
André Pierre Prous Poirier 1,2
1. Departamento de Sociologia e Antropologia - UFMG
2. Setor de Arqueologia do Museu de História Natural e Jardim Botânico da UFMG
3. Programa de Pós-graduação em Antropologia - UFMG
INTRODUÇÃO:
O presente trabalho tem por objetivo apresentar os resultados dos estudos realizados acerca dos vestígios líticos provenientes do sítio arqueológico Garimpo do Turco. Este sítio insere-se em um conjunto de pesquisas que têm como foco as ocupações pré-coloniais da região de Diamantina-MG, e que vêm sendo desenvolvidas pelo Setor de Arqueologia do MHNJ-UFMG desde 2004.
Em um universo de quase cem sítios arqueológicos registrados até o momento, o Garimpo do Turco possui uma inserção singular na paisagem, pois trata-se do único a céu aberto. Além disso, durante as intervenções realizadas, foi possível recuperar uma quantidade expressiva de material lascado em estratigrafia, conferindo ainda mais singularidade ao caso, visto que grande parte das informações disponíveis para o contexto brasileiro refere-se à ocupações em sítios de abrigos naturais ou a céu aberto, mas com material em superfície.
Assim, o sítio destaca-se no conjunto pesquisado, pois permite estudar um contexto de ocupação pré-colonial pouco conhecido. A partir do material escavado, buscou-se identificar as etapas da cadeia operatória de produção dos artefatos líticos que estariam presentes no sítio e a sua possível inserção na organização espacial e tecnológica proposta para os outros sítios pesquisados na região.
METODOLOGIA:
Para o estudo das indústrias líticas da região de Diamantina, dois conceitos são fundamentais: 1) o de cadeia operatória, formulado primeiro por Leroi-Gourhan, que busca remontar a sequência de concepção, produção, utilização e descarte dos artefatos; 2) o de organização tecnológica, proposto por Lewis Binford, segundo o qual diferentes sítios se articulam e se completam em relação às etapas de vida dos artefatos e às diversas atividades desenvolvidas na paisagem.
Para esta análise, além dos referidos conceitos, foi adotada uma abordagem qualitativa, por meio da qual buscou-se identificar os tipos de “lascas diagnóstico” de cada etapa de vida de um artefato. Esta análise qualitativa foi realizada durante o processo de curadoria do material, devido ao grande volume e à dificuldade apresentada pelo quartzo para a marcação e a visualização dos estigmas de lascamento nas peças. O trabalho fundamentou-se na observação dos atributos tecnológicos das lascas e na combinação de tais atributos, tendo por referência tanto as descrições encontradas na bibliografia sobre a morfologia de artefatos bifaciais (cuja presença já havia sido observada no sítio), quanto as descrições de atributos e artefatos dos demais sítios de Diamantina.
RESULTADOS:
No sítio estão presentes pelo menos duas cadeias de exploração do quartzo: Uma relacionada à produção de lascas, e a outra à produção de artefatos bifaciais. Especificamente para esta última, foram identificadas quatro categorias de lascas, correspondentes às etapas da cadeia operatória de sua produção: de debitagem: talão espesso, ângulo abrupto, perfil reto, nenhum ou poucos negativos na face externa; de façonagem: talão de espessura variável, ângulo tende a ser de semi-abrupto a rasante, perfil curvo ou curvo na porção distal, poucos negativos na face externa; de adelgaçamento, talão fino, ângulo rasante, perfil curvo, vários negativos na face externa que podem ser centrípetos ou opostos, porção mesial mais larga do que a porção proximal; e de retoque: talão fino, ângulo variável, perfil variável, pequena dimensão em relação às lascas das etapas anteriores, muitos negativos paralelos na face externa. Destaca-se ainda a presença de artefatos bifaciais inacabados, como uma aparente ponta de projétil quebrada, o que provavelmente ocorreu durante o seu processo de produção. Nenhum vestígio ligado à utilização ou artefato esgotado foi identificado, sugerindo que os artefatos fossem apenas produzidos no local, ficando sua utilização e descarte em outro.
CONCLUSÃO:
Os estudos realizados acerca do sítio do Garimpo revelaram que o mesmo, localizado próximo à áreas de obtenção de cristais de quartzo, era um espaço utilizado para o trabalho inicial de debitagem da matéria-prima e para a produção de lascas e de artefatos bifaciais que ali não foram utilizados. A utilização do espaço para a produção de artefatos mais elaborados nos locais de obtenção de sua matéria-prima estaria em sintonia com o que já foi observado no contexto de Diamantina para outros artefatos líticos estudados (quartzito).
Para outros sítios na região de pesquisa do projeto em que há a presença de abrigos rochosos, o material de quartzo lascado recuperado apresenta artefatos bifaciais e sobre lasca desgastados e/ou quebrados, e ainda, refugos que são condizentes com sua utilização local, assim, tais sítios neste caso foram interpretados como um local de uso desses artefatos.
Pelo exposto, pode-se dizer que as primeiras análises realizadas sobre os vestígios líticos recuperados no sítio do Garimpo do Turco apresentam possibilidades consideráveis de que este sítio singular possa se conectar com os demais e se conectar ao sistema de uso do espaço já proposto para a região.
Palavras-chave: Tecnologia Lítica, Cadeia Operatoria, Organização Tecnológica.