64ª Reunião Anual da SBPC
F. Ciências Sociais Aplicadas - 5. Direito - 13. Direito
Reforma agrária e conflito simbólico: construções identitárias pelo Direito à terra no caso do Assentamento Mártires de Abril
Flávia do Amaral Vieira 1
Josilene Ferreira Mendes 1
Pedro Sergio Vieira Martins 1
Liege Teixeira Lira 2
1. Universidade Federal do Pará
2. Universidade do Estado do Pará
INTRODUÇÃO:
O direito à terra no Brasil é notoriamente fruto de intenso processo histórico de reivindicações populares que culminou em avanços nos aspectos legislativos e entorno de novas políticas públicas. A expressão institucional e legal dessa luta se deu com os Planos Nacionais de Reforma Agrária e com a Lei 8.629 de 1993 e a Constituição Federal de 1988, que definiram os beneficiários da reforma agrária e o procedimento judicial e administrativo para a obtenção da terra. Por outro lado, construções identitárias foram forjadas no seio desta luta para se incorporarem como elemento das mobilizações pelo acesso à terra. Daí serem adotadas designações para o sujeito do Direito à reforma agrária.
O objetivo do presente trabalho é analisar como os sujeitos de Direito se constroem na luta pelo acesso e permanência na terra, num ‘campo simbólico’, em face do modo de caracterização dos mesmos pelas leis e programas de serviço público, buscando constatar qual a construção social da luta pela terra como um ‘Direito vivo’. No caso, abordamos os moradores do Assentamento Mártires de Abril na zona periurbana da cidade de Belém, Pará, e conta com militantes do Movimento dos Trabalhadores rurais Sem-Terra (MST) em sua organização.
METODOLOGIA:
Nesta pesquisa preferiu-se a aplicação de métodos de pesquisa qualitativos. As observações foram realizadas no período de desenvolvimento do projeto de extensão em Direitos Humanos e Reforma Agrária do Núcleo de Assessoria Jurídica Popular (NAJUP) Isa Cunha, através da pesquisa-ação. A primeira etapa se deu com base no estudo de ordens normativas pertinentes (Lei nº 8.629/1993 e Constituição Federal de 1988), e dos Planos Nacionais de Reforma Agrária (1985 e 2003). Após essa etapa a participação no projeto permitiu a realização de visitas às casas, aos locais de produção e no barracão para oficinas e apresentações feitas conjuntamente com o movimento social. A coleta de material de campo foi considerável para a elaboração deste trabalho, que se dividiu na interlocução com militantes sociais e com os demais assentados.
RESULTADOS:
Por meio do trabalho de campo, foi possível registrar e analisar os elementos identitários, que fazem de ‘trabalhadores rurais’, ‘domésticas’, ‘vendedores de coco’, ‘pedreiros’ e até ‘garçons’ serem todos ‘sem-terra’, empreendendo ações enquanto grupo político formado por sujeitos de diferentes interações com terra. Em nenhuma das ordens normativas foram encontradas definições abrangentes que pudessem contemplar tal complexidade. Logo, também a estrutura da política de reforma agrária para a permanência na terra não destacou ações concretas para a interação entre a comunidade assentada e as relações urbanas. O caso do ‘Mártires de Abril’ evidenciou a luta pela terra numa zona periurbana, portanto, onde há maior envolvimento entre ‘campo’ e ‘cidade’.
Desta maneira, identificamos conflitos simbólicos entre os instrumentos operacionais da Reforma Agrária e a construção identitária do Movimento Social, no caso o MST. Assim a militância do movimento procura instrumentos de construção da identidade, dentro das ocupações, mutirões, manifestações e na educação dos assentados. Apesar dos avanços da Reforma Agrária, e dos estudos empreendidos, não há um diálogo entre o âmbito institucional e a produção real de necessidades pela comunidade assentada.
CONCLUSÃO:
A presente pesquisa possibilitou a verificação dos impactos ou efeitos das ordens normativas e das políticas públicas sobre as comunidades assentadas e a ação que estas produzem no aspecto identitário que tem como interesse maior a organização pelo Direito à terra que se desdobra no Direito à Reforma Agrária.
A comunidade em si adota várias formas identitárias conforme o trabalho, para problemas de rotina (inscrição, cadastro, matrícula, registro etc), mas em âmbito informal ou na disputa política assumem a característica de ‘sem-terra’. Foram identificados os conflitos simbólicos existentes, entre os assentados do ‘Mártires de Abril’ e o Estado, onde estes aparecem não como processos que são meramente reflexos da estrutura do direito positivado, mas sim como características importantes nestes processos sociais e que se criam e recriam no espaço social e político. Os conflitos simbólicos traduzem a ineficiência das ações do Poder Público, no Executivo ou no Legislativo.
Palavras-chave: Reforma Agrária, construção identitária, Direito à terra.