65ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 9. Sociologia - 7. Sociologia
MÁRIO YPIRANGA MONTEIRO E GILBERTO FREYRE: confronto/associação no contexto da Comissão Nacional de Folclore.
Charles Maciel Falcão - Prof. MSc. Universidade Federal do Amazonas
INTRODUÇÃO:
O processo de formação das ciências sociais no Brasil sempre esteve às voltas com a temática da identidade nacional e da cultura brasileira. Na primeira metade do século XIX, uma ideologia nativista domina a cena no contexto do Romantismo. Em fins daquele século, o pensamento social apresenta uma postura determinista, fundamentada em teorias de cunho evolucionista. No início do século XX, este arcabouço teórico-explicativo sofre poucas mudanças, surgindo com isso a ideia de um Estado centralizador capaz de organizar a cultura nacional rumo à civilização. A partir da década de 1930, Gilberto Freyre propõe uma ruptura metodológica pautada na valorização do conjunto das regiões brasileiras, abrindo espaço para a emergência de um pensamento social regionalizado. Na Amazônia, Mário Ypiranga Monteiro resgata e valoriza a especificidade do folclore local, elaborando um discurso criador da região e contribuindo para a ideia gilbertiana de Brasil regional. Este argumento fundamenta as atividades da Comissão Nacional de Folclore (CNFL) que, na década de 1940, movimenta esforços para o resgate e valorização do folclore nacional, congregando intelectuais das diferentes regiões ou províncias do país que, por confronto-associação, compõem o cenário da identidade nacional.
OBJETIVO DO TRABALHO:
Perceber os condicionantes do campo intelectual entre as décadas de 1940-1950 que permitem com que os trabalhos sobre folclore amazônico de Mário Ypiranga Monteiro entrem em consonância com a idéia de Brasil Mestiço proposta por Gilberto Freyre.
MÉTODOS:
Eminentemente bibliográfico, o trabalho partiu do levantamento de um conjunto de obras capazes de oferecer dados sobre os itinerários do pensamento social brasileiro em relação às temáticas da identidade e da cultura nacional e regional. Em Continente e Ilha (1943) e Interpretação do Brasil (1947), Gilberto Freyre propõe pensarmos uma identidade contextualizada no tempo e no espaço, sustentada pela diversidade de regiões culturais que compõem a imagem do Brasil. A valorização desse cenário, permite com que intelectuais radicados nessas regiões possam dá vazão para representações sobre as especificidades regionais do país. Estudando o folclore regional amazônico e participando ativamente do movimento folclórico em defesa das tradições nacionais, Mário Ypiranga assume uma postura de retomada da regionalidade e, ao analisarmos obras como O Aguadeiro (1947), Folclore Amazônico (1950), O complexo gravidez-parto e suas conseqüências (1952), O regatão (1958), percebemos que, como um intelectual regional, o autor contribuiu para uma compreensão ampliada da relação de confronto-associação estabelecida entre as representações da região amazônica presentes em seus trabalhos e a perspectiva gilbertiana de um Brasil regional a fundamentar o movimento folclórico.
RESULTADOS E DISCUSSÃO:
O pensamento gilbertiano que na década de 1930 propõe a compreensão do Brasil a partir do conjunto multifacetado de regiões culturais guardiãs da tradição nacional, é o elemento de fundamentação do trabalho de resgate e de valorização do folclore das diversas regiões do país. Como participante ativo da congregação de intelectuais regionais envolvidos na valorização e defesa do folclore nacional, Mário Ypiranga emerge no interior do campo de produção do pensamento social brasileiro, apresentando um discurso criador da região amazônica que encontra legitimação em sua participação efetiva em instâncias locais de consagração e reconhecimento como o Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas e a Academia Amazonense de Letras. Neste cenário de possibilidades aberto pelo movimento folclórico a partir da década de 1940, Mário Ypiranga forja um conjunto de representações que “inventam” a região amazônica como um espaço a um só tempo natural, social e cultural, participante do conjunto abrangente da identidade e da cultura nacional.
CONCLUSÕES:
Na década de 1930, o pensamento social brasileiro estrutura-se a partir do esforço pioneiro de criação e institucionalização das ciências sociais em São Paulo e no Rio de Janeiro. Fora deste eixo, era praticamente impossível pensarmos numa produção intelectual pautada nos critérios de reconhecimento e legitimação acadêmicos. Em diversas regiões do país, os Institutos Históricos e Geográficos e as Academias de Letras, verdadeiros “lugares de fala”, atuam como instâncias de legitimação para diferentes produções e discursos geograficamente desconectados dos centros universitários do sudeste. Ao participar do movimento folclórico, considerando sua fundamentação na ideia de um Brasil regional proposta por Gilberto Freyre na década de 30, Mário Ypiranga usa de uma estratégia capaz de lhe proporcionar ganhos intelectuais, uma vez que elege como objeto de atenção, um conjunto de elementos representativos da região amazônica que permitem maior visibilidade para as especificidades desta região no conjunto da regionalidade brasileira. Participar da congregação de “intelectuais de província” empreendida pela CNFL na década de 1940, foi a oportunidade encontrada por um autor nativo da Amazônia para o ingresso no campo de produção simbólica em expansão naquele contexto.
Palavras-chave: Identidade regional, Intelectual regional, Folclore amazônico.