65ª Reunião Anual da SBPC
H. Artes, Letras e Lingüística - 5. Semiótica - 1. Semiótica
Estudo das semioses co-ocorrentes no trabalho de jogo teatral com afásicos que frequentam o Centro de Convivência de Afásicos (CCA-IEL/UNICAMP)
Amanda Moreira de Oliveira - Instituto de Artes - Graduação em Artes Cênicas - UNICAMP
Edwiges Maria Morato - Profa. Dra./Orientadora - Instituto de Estudos da Linguagem - UNICAMP
INTRODUÇÃO:
Abordamos a afasia como uma questão de linguagem, levando em conta o aspecto da interação como princípio explicativo das ações humanas (Morato, 2004). De acordo com Marcuschi, (2001) a comunicação humana se constrói em um esforço coletivo no qual os participantes buscam a construção de sentidos ao longo do processo interacional estabelecido. Portanto, o ato de comunicar-se exige do sujeito improvisação e criatividade constantes, conforme o seu uso dinâmico e coletivo, caracterizando-se como uma prática intersemiótica. Entre estas atividades, as artísticas e especialmente o fazer teatral promovem um redimencionamento das possibilidades expressivas desses indivíduos. O corpo marcado pela lesão cerebral pode (re)aprender a tornar-se comunicativo, passando pela experiência grupal (visto de teatro é arte coletiva) de tornar-se corpo cênico. Para Roubine (1987:43 apud PEREIRA, 2003:59), "assim como a voz, o corpo não é por natureza teatral. Ele precisa aprender a se movimentar, e mesmo a 'estar' no espaço virtual que é o palco". A relevância da pesquisa está baseada no estudo da ocorrência de semioses que ocorrem e co-ocorrem em uma determinada prática, visando a ampliação dos parâmetros de expressividade e de comunicação verbal e não verbal de afásicos.
OBJETIVO DO TRABALHO:
Este trabalho objetivou o desenvolvimento de atividades teatrais junto ao Centro de Convivência de Afásicos (CCA), localizado no Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), visando contribuir para a ampliação dos parâmetros de expressividade e de comunicação verbal e não-verbal dos participantes afásicos deste grupo.
MÉTODOS:
Verificamos quais e como diferentes semioses concorrem e co-ocorrem nas diferentes propostas metodológicas propostas, que se subdividem em instalação da proposta de trabalho; aquecimento vocal, corporal e exercícios de articulação e projeção da voz; exercícios de expressão corporal; jogos interativos de percepção espacial; jogos interativos de percepção do coletivo e do social e exercícios de criatividade e improvisação. Como as oficinas teatrais semanais eram filmadas, realizamos análise dos vídeos, selecionando o corpus conforme os procedimentos metodológicos adotados. Produzimos um vídeo-documentário de aproximadamente 10 minutos, que contém momentos marcantes do processo, assim como comentários de cada integrante afásico a respeito da repercussão da oficina em sua comunicação cotidiana.
As oficinas teatrais ocorreram entre março de 2010 a dezembro de 2011 no Centro de Convivência da Afásicos, local de interação entre pessoas afásicas e não-afásicas (professores, pesquisadores, familiares, terapeutas). Os nove integrantes afásicos – 4 homens e 5 mulheres - apresentam distintos quadros de afasia em diferentes graus de severidade e dificuldades de expressão, sem contudo apresentar dificuldades significativas de compreensão.
RESULTADOS E DISCUSSÃO:
Por meio da análise do corpus verificamos a ocorrência de elaboração consciente de táticas comunicativas, como gestos coordenados com outros recursos semiológicos, olhar, prosódia e movimentos corporais, que evocam diferentes processos de significação. Diferimos gesto de
simples movimento pois o primeiro apresenta-se como uma realidade simbólica interpretável pelos que partilham de parâmetros ântropo-culturais comuns. (Mármora, 2000: 42). Neste sentido, houve construção coletiva de parâmetros de significação em nossas oficinas teatrais, na qual trabalhamos a questão da gestualidade significante segundo McNeill (2000 apud Velazi,2010), praticando gesticulação, pantomina, emblema e linguagem de sinais. A gestualidade significante se opôs à apraxia, distúrbio acarretado pela lesão cerebral que leva a dificuldades de planejamento, organização e sequenciação de produção gestual. Segundo Mármora (2000), este quadro apráxico se apazigua quando o corpo afetado está contextualizado em uma situação, seja ela linguística ou não, na qual deve realizar um gesto com sentido. Sobre o assunto destacamos as palavras de Smolka (2000:137), “Palavras são signos. Corpos são signos. Sempre significativos, requerendo interpretação”.
CONCLUSÕES:
Por meio da análise das gravações das sessões teatrais, percebemos a ocorrência de diversas semioses co-ocorrentes, verificando que o corpo afásico se torna mais potencialmente expressivo quando posto em ação, contextualizado em uma situação, seja ela linguística ou não, na qual deve realizar um gesto com sentido. Notamos que a ludicidade de jogos teatrais auxilia na retomada de uma expressividade comunicativa, em significação que dialoga com o mundo, aliado ao fato de que o fazer teatral é uma prática intersemiótica por natureza, o que auxilia à emerção de complexas redes semióticas no trabalho expressivo.
Palavras-chave: Afasia, Semioses, Teatro.