65ª Reunião Anual da SBPC
C. Ciências Biológicas - 10. Microbiologia - 2. Microbiologia Aplicada
Presença de microbiota contaminante em cascas de Anacardium occidentale L. (cajueiro) comercializadas para o preparo de chás em feira livre da microrregião Seridó Oriental do Rio Grande do Norte.
Francisco Angelo Gurgel da Rocha - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do R. G. do Norte – IFRN.
Letícia Karina de Medeiros Rodrigues Bezerra - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do R. G. do Norte – IFRN.
Joyce Azevedo Bezerra de Souza - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do R. G. do Norte – IFRN.
Eduarda Denyse Medeiros de Pontes - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do R. G. do Norte – IFRN.
João Ricardo Galvão Bezerra - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do R. G. do Norte – IFRN.
Magnólia Fernandes Florêncio de Araújo - Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN.
INTRODUÇÃO:
O uso de espécies vegetais bioativas no tratamento de doenças é um traço cultural comum a todas as comunidades humanas, em especial nas situadas no Norte e Nordeste brasileiro. Contudo, apesar da sua eficácia terapêutica, reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a prática traz em si riscos, que de modo geral, são desconhecidos pelos usuários. A crença generalizada de que “o que é natural, não faz mal” é frequente e incorreta: interações medicamentosas, toxicidade intrínseca à espécie e a baixa qualidade microbiológica das plantas medicinais são problemas recorrentes. A OMS aponta a veiculação de Escherichia coli, Staphylococcus aureus e fungos como um problema de saúde pública. A comercialização do produto sob as condições higiênico-sanitárias inadequadas, geralmente presentes em feiras livres, magnifica o problema, uma vez que tais espaços representam a fonte preferencial da população mais carente para a aquisição das plantas que consome. O uso de plantas medicinais de qualidade microbiológica inadequada pode promover no usuário infecções, intoxicações ou toxinfecções de caráter crônico ou agudo e gravidade variável. Em casos mais severos, pode resultar em óbito.
OBJETIVO DO TRABALHO:
Objetivamos determinar em amostras de cascas de Anacardium occidentale L. (cajueiro) as densidades populacionais de Escherichia coli, Staphylococcus aureus, bolores e leveduras. Os resultados foram comparados aos limites recomendados pela OMS para fitoterápicos aos quais se adiciona água fervente antes do uso, classificando as amostras como adequadas ou não ao consumo humano.
MÉTODOS:
As coletas foram realizadas na feira livre do município de Currais Novos, situado na Região Seridó do Rio Grande do Norte, ao longo do mês de janeiro de 2013. Adotou-se plano de amostragem de duas classes, no qual a unidade amostral foi categorizada como aceitável ou não, admitindo-se n=10. As amostras foram selecionadas aletoriamente pelo próprio comerciante, acondicionadas em recipientes estéreis, posteriormente depositados em caixa isotérmica. O material foi conduzido ao Laboratório de Microbiologia de Alimentos/Biologia Molecular (MicroBio) do IFRN Campus Currais Novos, onde foi analisado. A partir das amostras, foram realizadas diluições decimais seriadas em solução salina peptonada, da ordem de 10-1 a 10-6. Foram quantificadas as densidades de Escherichia coli (MUG-VRBA, 35±1oC/24±2h), Staphylococcus aureus (mannitol salt agar, 35±2oC/24-48h; DNAse agar + metil green, 50±2oC/2h), bolores e leveduras (PDA acidificado, 25±1oC/5 dias). Os resultados foram expressos em UFC/g e comparados aos limites recomendados pela OMS para fitoterápicos ao quais se adiciona água fervente antes do uso, classificando as amostras como adequadas ou não ao consumo humano.
RESULTADOS E DISCUSSÃO:
O limite para bolores e leveduras (104 UFC/g) foi superado em 100% dos casos, com densidade média de 1,6x107 UFC/g. Fungos podem promover a degradação enzimática do fitocomplexo das plantas, alterando suas propriedades terapêuticas e/ou gerando toxicidade. As micotoxinas geradas por certas espécies de Aspergillus, e Penicillium, comuns no armazenamento do produto em feiras, promovem intoxicação aguda ou crônica em humanos, sendo as aflatoxinas implicadas na gênese de Hepatocarcinoma Celular (HCC). Perante Escherichia coli, 90% das amostras foram reprovadas, com densidade média equivalente a 1,5x104 UFC/g. A detecção da espécie bioindica contaminação fecal, com risco da veiculação de patógenos disseminados pela rota fecal-oral (certos vírus e bactérias, protozoários e helmintos parasitas). Detectou-se Staphylococcus aureus em 100% das amostras, com densidade média de 8,9x103 UFC/g. A OMS não explicita limites para o microrganismo, apesar de seu envolvimento em surtos de doenças estafilocócicas. Certas toxinas estafilocócicas e micotoxinas são termorresistentes, não sendo inativadas pelas temperaturas envolvidas no preparo de chás, representando risco à saúde do usuário do produto.
CONCLUSÕES:
Consideramos que 100% das amostras de Anacardium occidentale L. (Cajueiro) coletadas em diferentes pontos da feira livre de Currais Novos/RN oferecem risco à saúde humana, sendo impróprias para o preparo de chás. Tais resultados refletem a inadequação presente na sua cadeia produtiva, incluindo as etapas relacionadas ao seu armazenamento, exposição e comercialização na feira livre. Sugerimos a ampliação dos estudos, incluindo maior número de espécies e municípios, bem como o desenvolvimento de ações educativas que visem à implantação, junto aos feirantes, das Boas Práticas em seus pontos de venda. É urgente a criação no Brasil de legislação específica, voltada ao estabelecimento de parâmetros de qualidade para o comércio em feiras livres e mercados de plantas medicinais, condimentares e preparos tradicionais. À administração municipal, recomenda-se maior participação no processo de melhoria das condições estruturais e logísticas necessárias ao bom funcionamento das feiras livres, contribuindo para a boa qualidade dos produtos disponíveis aos consumidores.
Palavras-chave: contaminação, plantas medicinais, Currais Novos.