65ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 9. Sociologia - 6. Sociologia Urbana
CULTURA E IMAGINÁRIO: ELEMENTOS CONSTITUINTES DA MORADIA
Mariana Dantas Galvão - Depto. de Arquitetura e Urbanismo - UFPE
INTRODUÇÃO:
O presente artigo propõe a reflexão de que a casa do sujeito humano engloba em seu cerne valores de ordem cultural que influenciam na maneira como ela é concebida em cada sociedade, sem descartar a discussão de como ela pode ser imaginada e concebida pelo sujeito de forma afetiva ao mesmo tempo em que revela sua situação de classe. Para tanto, este trabalho inclui um embasamento teórico advindo de áreas disciplinares da arquitetura e urbanismo e da sociologia a fim de nortear o entendimento de que a casa passa a demonstrar, com todo o seu caráter concreto de bem material, que está para nós como o lugar que releva quem somos, onde nos guardamos e onde guardamos nosso sentimento no mundo. Demonstra também a fragmentação social na medida em que os condomínios fechados ou verticais, que constituem uma tendência atual, são erguidos em prol da diferenciação de classe, e os ditames do setor imobiliário tornam-se regras acatadas por aqueles que perseguem uma vida em determinada localização, com determinado grupo. Concomitantemente, a ideia de uma vivência entre paredes que tomam valor muito além de concreto armado, a casa é pensada coletivamente como o nosso lugar no mundo, onde desfrutaremos nossa vida da melhor forma que o “estar dentro” pode proporcionar, como também projeta socialmente o sujeito que se enquadra num determinado tipo de modelo tido como o do bem morar.
OBJETIVO DO TRABALHO:
Este trabalho almeja discutir como elementos culturais aliados ao imaginário “descortinam” a concepção de casa e do exercício do morar.
MÉTODOS:
Pesquisa bibliográfica, com interpretação e análise de livros, periódicos, imagens e quaisquer outras fontes que subsidiem na construção do entendimento acerca do imaginário associado à moradia e como os elementos culturais exercem influência na formação do mesmo.
RESULTADOS E DISCUSSÃO:
Temos como ponto inicial da exposição das ideias concernentes ao imaginário relacionado a casa o filme de Kurosawa, Dodeskaden – o caminho da vida (1970), que retrata vários núcleos de personagens que povoam uma área pobre do Japão, mas um que em especial chama a atenção é de pai e filho moradores de rua. Durante todo o enredo eles projetam de forma imaginária a futura moradia. Interessante observar que eles elegem como etapa pioneira da construção imaginária da casa o muro/cerca. Essa escolha pode ser interpretada como uma tentativa de diferenciação, de isolamento com relação à realidade de vida ou mesmo para o alcance da sensação de conforto proporcionada pelo fato de “estar dentro” que a condição de moradores de rua cotidianamente lhes negava. O que fica claro para o espectador no decorrer do enredo é que são criados mecanismos individuais ou mesmo coletivos em prol da não reflexão crítica da realidade através do imaginário. Em paralelo ao entendimento de que a casa, dimensão material de nossa existência, é colocada pela imaginação como o nosso lugar no mundo, onde nos encontramos e projetamos com segurança nossa vida, por vezes utilizando ela a favor de nossa própria projeção social, temos a rua como valorativamente antagônica a essa realidade, segundo demonstrado pela formação cultural brasileira, explicitada na obra “Sobrados e Mucambos” de Gilberto Freyre, que nos convida a visualizar o contexto de formação das casas no Brasil do período colonial.
CONCLUSÕES:
Dentro da reflexão que colocou a casa como o conjunto de imagens que são culturalmente valoradas, abrindo pra uma discussão que desembocou na sua análise no contexto colonial brasileiro, temos que a mesma diz mais do que simplesmente abrigo e teto para guarida às práticas humanas de vida, como também revela mais pra quem é exterior em relação a ela, auxiliando na “leitura social” de quem nela está contido. Assim foi explicitado no nosso passado histórico com a casa grande do senhor patriarcal, com os sucessores sobrados que se adaptaram à vida citadina até as atuais estruturas arquitetônicas que se prestam a perpassar o modelo de moradia utilizado pela classe economicamente dominante. Culturamente, a casa constitui um símbolo de poder social no caso brasileiro. Contudo, esse aspecto de nossa realidade social promove uma série de consequências negativas que desembocam numa fragmentação sócio-espacial; na formação de uma mentalidade produtora de estereótipos sociais; desprezo ao espaço público da rua; constituição de certo padrão de consumo que muitas vezes gera revolta e frustração por parte daqueles que não conseguem se enquadrar e tantas outras situações desfavoráveis ao convívio social para além da moradia. Com todas as suas características,a casa faz parte do imaginário coletivo, aquele que é reiterado pelo conjunto dos indivíduos na sociedade, representando um dos bens materiais mais caros ao homem.Porém, pode ser mecanismo promovedor da acentuação das diferenças sociais.
Palavras-chave: casa, subjetividade, projeção social.