65ª Reunião Anual da SBPC
F. Ciências Sociais Aplicadas - 10. Comunicação - 4. Jornalismo e Editoração
Ana das Carrancas no Jornalismo Cultural Pernambucano
Tamires Ferreira Coêlho - Mestranda na UNISINOS/CNPq; Graduada no Depto. de Comunicação Social - UFPI
Ana Regina Barros Rêgo Leal - Profa. Dra./Orientadora - Depto.de Comunicação Social – UFPI
INTRODUÇÃO:
A análise da projeção de Ana das Carrancas a partir do jornalismo cultural considera os conceitos relativos a “identidade” – Hall (2003), Oliveira (2010), Miranda & Simeão (2003); “cultura” – Eagleton (2005), Kellner (2001), Williams (2000) e Bosi (2006); e “Análise de Discursos” – Maingueneau (2008a, 2008b) e Bakhtin (1992). O jornalismo trabalha com fatos e práticas inerentes à sociedade, o que abrange, portanto, a cultura e suas mudanças. Na busca por entender, descrever e explicar a produção de sentidos vinculados à artesã, a pesquisa tem sua relevância científica, contribuindo com a expansão de material teórico sobre a cultura popular, tendo em vista também que não há muitas referências bibliográficas sobre cultura popular em Petrolina-PE e sobre Ana das Carrancas, apesar de ela ter sido renomada. Em nível individual, a pesquisa pode ser justificada pela afinidade da pesquisadora com o tema e pelo interesse particular em contribuir para a disseminação da cultura popular pernambucana em âmbito acadêmico. A relevância social está no interesse do trabalho em descobrir de que forma o jornalismo cultural e suas apropriações podem destacar uma personagem na sociedade e em uma instituição social – no caso, a cultura –, de forma a projetá-la diante dos leitores.
OBJETIVO DO TRABALHO:
Analisar a projeção da artista popular Ana das Carrancas no jornalismo cultural pernambucano e, mais especificamente, nos meios de comunicação impressos Jornal do Commércio, Diário de Pernambuco e Gazzeta do São Francisco desde 1976 até 2010. Identificar como essa personagem popular é construída nas matérias dos veículos jornalísticos selecionados para análise.
MÉTODOS:
O corpus analisado é constituído por 24 matérias: 8 matérias (notícias e reportagens) de cada jornal – Diário de Pernambuco, Gazzeta do São Francisco e Jornal do Commércio – entre 1976 e 2010. A escolha dos veículos teve como base a frequência de matérias relacionadas ao objeto de estudo, de acordo com uma análise quantitativa de dados feita na pesquisa exploratória. Todo o material foi analisado por meio de categorias, para facilitar a elaboração do estudo face à metodologia escolhida – a Análise de Discursos (AD). Essas categorias estão relacionadas à visibilidade da artista Ana das Carrancas nos jornais diários de Pernambuco e às marcas enunciativas escolhidas pelos meios analisados. Foram eleitos enquanto categorias de análise alguns conceitos teóricos de AD que permitiram elucidar melhor como Ana das Carrancas é projetada: polifonia, dialogismo, contrato de leitura e heterogeneidades discursivas – conceitos esses que casam perfeitamente com o conteúdo selecionado para análise. O material do corpus foi encontrado no acervo da família da artesã, em arquivos pessoais de pesquisadores e jornalistas, no Arquivo Público do estado de Pernambuco, na Fundação Joaquim Nabuco (Pernambuco) e no arquivo do jornal Gazzeta do São Francisco.
RESULTADOS E DISCUSSÃO:
A partir de conceitos aprofundados por teóricos como Verón, Maingueneau e Bakhtin, sobretudo quanto a concepções relativas a dialogismo, polifonia, heterogeneidades e contrato de leitura – verifica-se que Ana das Carrancas é uma personagem constituinte da identidade cultural pernambucana desde que ganha visibilidade midiática. Há muitos discursos que interferem nos ditos e não ditos presentes nas matérias, bem como há uma construção discursiva que parte de vozes conscientes e inconscientes. Os veículos consideram a artesã uma espécie de “celebridade” reconhecida o suficiente para que o leitor tenha interesse pela sua arte e sua vida. Há heterogeneidade constitutiva na atribuição de Ana como símbolo cultural, o que evidencia também um possível embate de vozes entre campos, incluindo o próprio campo artístico. A publicação de matérias à ocasião da morte de Ana das Carrancas deve-se ao contrato de leitura com seus públicos, que provavelmente esperavam ter informações sobre a morte da artista e encontrar homenagens à artesã nos impressos. A voz do campo midiático se mistura à de outros campos e esse campo coloca-se como profundo conhecedor do campo artístico e analisa ele mesmo as mudanças nas obras de Ana, sem adicionar falas do campo artístico para legitimar os enunciados.
CONCLUSÕES:
Constata-se a existência de um discurso positivo sobre Ana das Carrancas nos jornais analisados – o que confirma uma das nossas hipóteses - além da relação direta entre a artista e a cultura popular pernambucana. Outra hipótese confirmada considera a possibilidade de a projeção midiática da artista direcionar o seu trabalho para a produção específica de carrancas, tendo em vista que outros produtos dela são praticamente suprimidos no discurso midiático em detrimento das figuras lendárias. Os três jornais promovem a artesã e suas carrancas incentivando os leitores a conhecê-la melhor e a comprar suas obras. Cada impresso estabelece seu próprio contrato de leitura e idealiza seu leitor, dirigindo-se a ele de forma distinta, mas há similaridades entre o Diário de Pernambuco e do Jornal do Commércio. A análise da projeção de Ana nos jornais permite identificar de que forma o jornalismo cultural se diferencia de outras editorias pelos temas abordados, pela linguagem e pelas estratégias utilizadas. Ana das Carrancas é descrita e idealizada de forma que sua projeção midiática pode ser considerada mitificada em alguns enunciados. As relações de poder evidenciam-se no discurso do campo da mídia com a escolha de personagens “autorizados” a falar e a legitimação de instituições e discursos.
Palavras-chave: Cultura Popular, Identidade Cultural, Análise de Discursos.