65ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 7. Educação - 11. Ensino-Aprendizagem
INVESTIGANDO PRÁTICAS INCLUSIVAS EM TURMAS COM SURDOS E EM TURMAS DE SURDOS: PADRÕES INTERACIONAIS E OPORTUNIDADES DE APRENDIZAGEM E PARTICIPAÇÃO
Luanda Cardoso Martins Rampinelli - Gees-Neped/ Faculdade de Educação - UFJF
Carlos Henrique Rodrigues - Prof. Orientador - Gees-Neped/ Faculdade de Educação - UFJF
INTRODUÇÃO:
Com o reconhecimento do status linguístico das línguas de sinais e com a consolidação da visão sócio-antropológica da surdez – pilares fundamentais da concepção dos surdos como minoria linguística e cultural – mudanças conceituais, sociais e atitudinais em relação à Educação de Surdos têm se intensificado. Além disso, os redimensionamentos legais e políticos, sustentados fundamentalmente pela Lei 10.436/02 e pelo Decreto 5.626/05, têm fortalecido o Movimento Surdo em prol de uma educação de qualidade, nesse caso uma educação bilíngue. O reconhecimento da surdez como diferença, e não como mera deficiência sensorial, impacta significativamente a realidade escolar. Nesse sentido, a escola vivencia mudanças, tanto no campo das ideias quanto no das ações, proporcionadas pela presença da língua de sinais e pela significativa participação de surdos, não só como alunos, mas, também, como professores e pesquisadores. Considerando-se esse novo contexto social contemporâneo, tecemos reflexões sobre duas práticas inclusivas presentes na educação de surdos: a formação de turmas com surdos e de turmas de surdos.
OBJETIVO DO TRABALHO:
A investigação do que acontece nessas turmas com surdos e de surdos visou à identificação, ao entendimento e à análise da organização, das ações e das interações nesses dois espaços com o intuito de se conhecer o processo de construção e de apropriação de oportunidades de aprendizagem e de participação em salas de aula marcadas por questões linguísticas e culturais.
MÉTODOS:
Adotamos a lógica da abordagem etnográfica em educação (GREEN et al., 2001), apoiada pelas perspectivas da sociolinguística interacional (GUMPERZ, 1982). Portanto, ancorados na observação participante (SPRADLEY, 1980) e direcionados pela perspectiva interpretativista (CASTANHEIRA, 2004), integramos, durante determinado período, o cotidiano de duas turmas específicas: uma turma com surdos e outra de surdos, com o intuito de compreender as linguagens e as práticas presentes nesses espaços e, assim, entender a vida dessas diferentes salas de aula. Os dados coletados foram registrados através de filmagens e anotações de campo. As filmagens foram feitas com o intuito de garantir as releituras sucessivas do cotidiano da sala de aula, a segurança na análise interpretativa dos dados e o maior entendimento da complexidade que constitui a turma com surdos e a de surdos. E as notas de campo tiveram como objetivo registrar as situações vividas na turma e as conversas informais, assim como as percepções, inferências e comentários dos pesquisadores, para posteriores consultas. Para amparar nossas reflexões, realizamos entrevistas semi-estruturadas com professores, alunos e gestores. As filmagens da sala de aula e as entrevistas foram devidamente transcritas, informatizadas e analisadas.
RESULTADOS E DISCUSSÃO:
As turmas com surdos e as de surdos diferenciam-se, não somente pelos sujeitos que os compõem, mas pelos impactos de fatores linguísticos e culturais na maneira por meio da qual são constituídas e apropriadas as oportunidades de aprendizagem e de participação. As filmagens e entrevistas evidenciaram diferentes padrões interacionais nessas turmas. Dentre esses padrões, vemos que, ao contrário da turma com surdos, o ponto central de destaque na turma de surdos foi a possibilidade de os alunos interagirem numa língua que podiam compartilhar. Além disso, os alunos da turma de surdos tiveram o contato com surdos adultos sinalizadores como professores, o acesso ao aprendizado da Libras como disciplina curricular e ao ensino do Português como segunda língua. Atribuímos o caráter positivo da interação, destacado pelos participantes da turma de surdos, ao uso constante da Libras, tanto na turma quanto nos demais espaços escolares. Nesse sentido, as oportunidades de aprender e participar, nas quais a Libras é a língua da interação, tornam-se centrais e acessíveis aos alunos surdos. Além do uso da Libras, faz-se essencial, por exemplo, uma profunda mudança nas organizações, conceitos, diretrizes, metodologias, posturas e concepções educacionais.
CONCLUSÕES:
Ao contrário do que se pode pensar, a turma de surdos reúne condições favoráveis ao processo de ensino-aprendizagem de falantes de Libras e favorece o processo educacional desses alunos, ao se apresentar como um espaço inclusivo que respeita a especificidade linguística e cultural, ao mesmo tempo em que congrega a diferença e a diversidade, já que cada surdo é único. Todos os alunos têm a possibilidade de interagir na língua de sinais entre si e, inclusive, com professores e demais membros da comunidade escolar. Em suma, os embates teóricos travados em cima de concepções e conceitos de educação especial e/ ou inclusiva precisam ser superados em prol da construção de uma educação de qualidade acessível a todos. Visões reducionistas que veem a turma de surdos limitada à antiga noção de educação especial, colocando-a na contramão do atual movimento de inclusão e desconsiderando a realidade dos sujeitos surdos em nome da mera imposição de crenças e concepções, estão cada vez mais ultrapassadas e devem ser substituídas. Portanto, as políticas precisam tratar os alunos ouvintes como ouvintes, os surdos como surdos e os com deficiência auditiva como alunos com deficiência auditiva, considerando as especificidades do indivíduo e visando ao seu pleno desenvolvimento.
Palavras-chave: Surdez, Intérpretes de Sinais, Libras.