65ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 1. Antropologia - 8. Antropologia
CONSTRUÇÃO E SIGNIFICADOS DOS ATENDIMENTOS MULTIPROFISSIONAIS A LITIGANTES NO JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA DO NÚCLEO BANDEIRANTE
Nicholas Moreira Borges de Castro - Dpto. de Antropologia - Universidade de Brasília - UnB
Daniel Schroeter Simião - Prof. Doutor/Orientador - Dpto. de Antropologia - UnB
INTRODUÇÃO:
A realização do presente trabalho insere-se no contexto das discussões sobre o tratamento da Justiça aos conflitos substancializados na forma de processo judicial. De modo mais específico, as preocupações deste texto situam-se no campo de estudos dos discursos e práticas da Justiça brasileira perante a violência doméstica e de gênero. A literatura especializada evidencia um processo histórico em que, paulatinamente, a violência nesses contextos foi ganhando status de problema público.
O campo etnográfico de meu trabalho se desenvolveu acompanhando atendimentos a conflitos de violência doméstica realizado por profissionais de um juizado especializado no Distrito Federal. Entendo, assim, que a realização desta pesquisa é relevante no sentido de problematizar novas práticas assumidas pelo Judiciário brasileiro no que se refere ao tratamento de conflitos no âmbito da Lei Maria da Penha.
OBJETIVO DO TRABALHO:
O objetivo da pesquisa foi analisar de que maneira as percepções dos(as) profissionais da equipe sobre a natureza dos conflitos, bem como as moralidades presentes nos discursos das partes influenciavam as características assumidas pelos atendimentos e rumos que estes podiam tomar.
MÉTODOS:
Os atendimentos aos sujeitos dos processos foram acompanhados através de observações diretas, de modo que pude assisti-los integralmente entre os períodos de março a junho de 2012. A realização dessa etapa da pesquisa demandou a produção de relatos acerca dos atendimentos observados, os quais foram discutidos durante as reuniões do grupo de pesquisa do projeto “Reparação, justiça e violência doméstica: perspectivas para reflexão e ação”. Foram analisados ao todo 23 relatos de atendimentos durante esse período. Entrevistas com profissionais da equipe que realiza os atendimentos também foram realizadas a fim de analisar o entendimento que têm de seu trabalho nos atendimentos no contexto de sua importância para a administração dos conflitos que chegam ao Juizado.
As análises permitiram que categorias como “sentidos de justiça” e “sentidos de violência” fossem criadas e utilizadas no intuito de problematizar a realidade social etnografada, visto que procurei as expressões que expusessem as moralidades presentes no discurso dos sujeitos.
RESULTADOS E DISCUSSÃO:
A pesquisa de campo no 1º Juizado de violência doméstica do Núcleo Bandeirante permite afirmar que, naquele contexto, diferentes tipos de casos, em suas respectivas idiossincrasias e formas de violências abarcadas, não passavam conformados da mesma maneira aos procedimentos que constituíam os atendimentos.
As reações dos(as) profissionais do juizado aparentes nas escolhas de construção do discurso perante às partes do processo indicam que suas percepções de gênero e da violência nesse contexto se constituem em uma moralidade que influencia diretamente a condução e caracterização dos atendimentos.
Percebeu-se também que mulheres (requerentes no processo) e homens (requeridos) usavam o espaço do atendimento, constantemente, de maneiras semelhantes. Essa situação, por sua vez, não correspondia a tratamentos semelhantes dos(as) profissionais no que dizia respeito ao compartilhamento de determinados sentidos e afetos, destituindo qualquer possibilidade de padronização no tratamento de requerentes e requeridos.
CONCLUSÕES:
Os atendimentos não se caracterizam apenas pela formalização e procedimentos impostos pelas(os) profissionais do Juizado. O próprio conteúdo do discurso desses atores é fortemente condicionado pelo que se apresenta a eles no momento por parte das/os litigantes. Consequentemente, aquele não é um espaço que se define pela sua burocratização: os atendimentos no 1º juizado de violência doméstica e familiar contra a mulher do Fórum do Núcleo Bandeirante não se configuram como uma escuta insensível e passiva apenas disposta a registrar e encaminhar os casos no processo do trâmite judicial, mas são efetivos momentos de confronto e negociação de moralidades, onde podem ser discutidos e ressignificados sentidos de justiça e de violência, bem como se constituem numa vontade político-pedagógica de interferir na realidade das pessoas que demandam a ação do Judiciário.
Palavras-chave: sensibilidades jurídicas, judicialização, moralidades.