65ª Reunião Anual da SBPC
F. Ciências Sociais Aplicadas - 10. Comunicação - 3. Comunicação Visual
Ética e estética do documentário no interior do Rio Grande do Sul
Dieison Marconi - Departamento de Ciências da Comunicação -UFSM
Cássio dos Santos Tomaim - Prof. Dr./Orientador- Departamento de Ciências da Comunicação- UFSM
INTRODUÇÃO:
De acordo com Marcos Pinho Gomes (1995) no Rio Grande do Sul a produção cinematográfica na primeira metade do século XX deu seus primeiros passos por meio de documentários e cinejornais, quando ainda não havia cinema de ficção ou de enredo e os filmes produzidos eram voltados para fatos sociais e políticos. Por meio do projeto Documentário Gaúcho contemporâneo: memória e identidade -1995/2010 propomos mapear onde, o que, como e quem produz documentário no RS, e onde e de que forma esses filmes são exibidos, além de compreender qual a atual contribuição que tem dado para a vitalidade do cinema produzido no estado. Entre os resultados obtidos na fase de catalogação perceber-se que Porto Alegre se destaca como polo produtor de cinema de não ficção, no entanto, o interior gaúcho, com destaque para Santa Maria e Caxias do Sul, também tem mostrado uma vocação para o documentário. Dos 96 filmes catalogados, 74 deles foram realizados por produtoras com sede em Porto Alegre. No entanto, Santa Maria e Caxias do Sul produziram juntas 18 filmes, sendo responsáveis por 18,75% de toda a produção no período analisado. Isso nos chamou a atenção por representar uma recente contribuição para a descentralização da produção cinematográfica no RS. Assim, nos interessa investigar o perfil desta produção no interior do estado, levando em consideração que o documentário se apresenta como o gênero em que a maioria dos realizadores destas cidades iniciou suas primeiras investidas no audiovisual.
OBJETIVO DO TRABALHO:
O objetivo deste trabalho é analisar e caracterizar a atual produção de documentários de Santa Maria e Caxias do Sul, a partir da visão de seus realizadores e de um estudo comparativo dos aspectos éticos e estéticos de uma amostra desta produção não ficcional.
MÉTODOS:
Para caracterizar o cinema de não ficção produzido em Santa Maria e Caxias do Sul foi consultado o nosso banco de dados com mais de 90 documentários cadastrados. Outro recurso para construir o presente trabalho foi a leitura e análise das entrevistas em profundidade, na modalidade semi-estruturada, realizadas com os cineastas em 2010 e 2011, a fim de identificarmos o perfil dos realizadores no interior do Rio Grande do Sul. Dos nove documentaristas de Caxias do Sul e Santa Maria catalogados, quatro foram selecionados por apresentarem uma produção contínua de documentários, com mais de um filme realizado entre 1995 e 2010. São eles: Lisandro Stallivieri, Marcos Borba, Carolina Berger e Luiz Alberto Cassol. Procedemos também a uma análise comparativa baseada nos estudos de Bill Nicholls e Fernão Ramos, trata-se de um percurso metodológico que visa analisar os aspectos éticos e estéticos da amostra selecionada para análise. Os critérios para esta análise estão dispostos em uma ficha analítica desenvolvida para o projeto, são eles: narrativa, modos de representação, fluxos de provas, pontos de identificação, campos éticos e presença do sujeito-da-câmera. Os filmes escolhidos foram: Herança (Carolina Berger, 2007), Super 70 (Luíz Alberto Cassol, 2006), A montanha do sonho imigrante (Lisandro Stallivieri, 2005) e 1ª quadra (Marcos Borba, 2009). A escolha se deu por serem filmes representativos do período de maior produção de documentários no interior gaúcho, entre 2005 e 2010.
RESULTADOS E DISCUSSÃO:
Os quatro cineastas em questão tem formação em Jornalismo, embora a relação com o documentário tenha vindo antes da formação acadêmica. Questionados sobre o formato fílmico, há um consenso de que a escolha pelo média e curta metragem se dá em função dos recursos e financiamentos disponíveis para a produção. “Já é um desafio fazer cinema na própria capital gaúcha; eu acho que o problema maior é a questão de financiamentos, que é muito atrelado ao estado”, diz Carolina Berger. Dos quatro filmes analisados, com exceção de Herança de Berger, que se valeu da temática família, realidade do cotidiano, os outros três documentários se enquadram na temática memória/história. Isso justifica o uso de materiais de arquivos em Super 70, O sonho da Montanha Imigrante e 1° Quadra. Quanto ao tratamento estético, não houve um predomínio de um modo de representar o real, apesar de terem séria dependência narrativa nos depoimentos dos personagens sociais, a maioria dos filmes mostra ousadia e experimentalismo diante do enunciado não ficcional, oscilando entre o documentário poético, reflexivo, expositivo e observativo. Houve predominância do uso de provas inartísticas, ou seja, estes documentários recorrem com frequência aos materiais de arquivos e testemunhos para comprovar seus argumentos. Quanto aos aspectos éticos, foi possível identificar o predomínio de uma ética da imparcialidade/recuo diante do objeto retratado. A exceção a cargo de Super 70 que primou por uma ética interativo-reflexiva.
CONCLUSÕES:
Por meio desta amostra de documentários do interior do RS, podemos considerar que foi identificada uma narração marcada pela entrevista e de fluxos de provas inartísticas, indícios de que os filmes apostam nos seus personagens para conquistar o espectador e desenvolver sua própria narrativa. Por outro lado, ainda é preciso problematizar com mais detalhes em que medida esta vocação do cineasta do interior do RS por uma ética da imparcialidade/recuo, no nível da ocultação, compromete ou auxilia em um tratamento mais criativo da realidade.
Palavras-chave: Cinema documentário, Santa Maria, Caxias do Sul.