65ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 3. Filosofia - 2. Filosofia
A CIENTIFICIDADE DA PSICANÁLISE FREUDIANA SEGUNDO A FILOSOFIA DE MARTIN HEIDEGGER
Rafael Souza Dantas - Depto. de Ciências Humanas e Filosofia - UEFS
Caroline Vasconcelos Ribeiro - Profa. Dra./Orientadora - Depto. de Ciências Humanas e Filosofia - UEFS
INTRODUÇÃO:
Na obra Seminários de Zollikon encontramos os conteúdos das palestras ministradas por Heidegger a psiquiatras e estudantes de psiquiatria suíços. Esta obra é composta pelas atas dos referidos seminários (1959-1969), além dos diálogos taquigrafados entre o filósofo e o psiquiatra Medard Boss (1961-1972) e das cartas de Heidegger enviadas a este (1947-1971). Ao longo dos seminários, Heidegger tratou de estabelecer as diretrizes para a desconstrução da teoria psicanalítica, tomando como base de sua argumentação a concepção de homem enquanto Dasein, oriunda da analítica existencial formulada em Ser e Tempo. O ponto de partida desta desconstrução foi a indicação heideggeriana de que a dimensão mais fundamental do existir humano não se ancora na representação de objetos e sim na compreensão pré-teórica das coisas que estão no mundo. Na medida em que aponta a inadequação da Psicanálise na abordagem do ser humano, o filósofo enfatiza que a teoria psicanalítica é elaborada com base no método arquitetado para as ciências naturais, tributário da metafísica moderna, o que equivale dizer que a psicanálise freudiana é uma ciência natural. Foi com base nesta proposição que conduzimos a nossa pesquisa.
OBJETIVO DO TRABALHO:
O trabalho consiste na apresentação de resultados oriundos da investigação acerca dos fundamentos filosóficos que sustentam a classificação da psicanálise freudiana como uma ciência da natureza, efetuada pelo filósofo alemão Martin Heidegger.
MÉTODOS:
A pesquisa a qual se relaciona este resumo está vinculada a uma análise cuja natureza metodológica é bibliográfica. Nos pautamos, primordialmente, na leitura e problematização da obra em que Heidegger dirige seu olhar filosófico para a psicanálise freudiana, a saber, Seminários de Zollikon. No que tange a Freud, utilizamos, principalmente, seus Artigos sobre Metapsicologia. Usamos, ainda, o recurso de comparar a posição de Heidegger com a de comentadores e epistemólogos da psicanálise freudiana, a saber: Paul Ricouer, Monzani, Loparic, Hilton Japiassu e Leopoldo Fulgencio. Tendo a argumentação heideggeriana como fio condutor, investigamos as características relativas ao que o filósofo nomeia de Ciência Natural e as relacionamos aos procedimentos investigativos do pai da psicanálise. Num segundo momento, fizemos o contraponto entre a perspectiva heideggeriana e as abordagens que avaliam o estatuto científico da psicanálise de modo distinto. A partir deste debate, percebemos que, de acordo com a interpretação que se dá à parte especulativa da psicanálise – a metapsicologia – o estatuto epistemológico do campo de saber criado por Freud se modifica. Por conta disso, realizamos uma investigação acerca dos sentidos dados à metapsicologia, seus conceitos, funções e fundamentos filosóficos.
RESULTADOS E DISCUSSÃO:
Na elaboração desta pesquisa procuramos seguir a trilha aberta por Heidegger para a difícil classificação da psicanálise como uma ciência natural. Vimos que esta designação não é hegemônica e que existe um amplo debate em torno do estatuto epistemológico deste campo de saber. Com o objetivo de explicitar os fundamentos filosóficos que autorizam Heidegger a imprimir-lhe este tipo de classificação, realizamos uma investigação sistemática de leituras que advogam por uma abordagem diferente. As concepções acerca do estatuto científico da psicanálise freudiana que sofreram questionamentos durante a pesquisa foram as seguintes: a psicanálise é uma pseudociência; a psicanálise é uma contraciência; a psicanálise é uma hermenêutica. A partir de um exame rigoroso dessas três argumentações, concluímos nossa análise visando colocá-las em xeque e, em contrapartida, almejando fundamentar a tese heideggeriana de que a psicanálise é uma ciência natural.
CONCLUSÕES:
Uma vez que o enquadre do estatuto científico da psicanálise nas categorias pseudociência, contraciência e hermenêutica é passível de refutação, podemos concluir que, se abordados à luz da ontologia de Heidegger, os argumentos usados para tais classificações não se sustentam. A partir de um olhar criterioso voltado para o fundamento, para os pressupostos ontológicos subjacentes ao arcabouço da teoria freudiana, percebemos: 1) a influência do programa kantiano para as ciências da natureza na formação científica de Freud; 2) A presença marcante dos preceitos da escola de Helmholtz e suas pretensões fisicalistas; 3) O pressuposto da objetividade de todos os fenômenos; 4) A utilização de uma semântica oriunda da física e o uso de analogias com aparelhos para descrição dos fenômenos humanos; 5) O recurso a uma linguagem objetificante e naturalizante para descrever um ente que não tem o estatuto de coisa natural. Em função da marcante presença desses elementos no fazer científico de Freud, podemos concluir, com Heidegger, que o pai da psicanálise se enquadra no rol dos cientistas naturais do seu tempo. Aliás, essa foi a grande pretensão e meta do psicanalista. Acreditamos que o esforço de Freud para que sua psicanálise recebesse o estatuto de ciência natural foi exitoso.
Palavras-chave: Ciência Natural, Freud, Heidegger.