65ª Reunião Anual da SBPC
F. Ciências Sociais Aplicadas - 10. Comunicação - 4. Jornalismo e Editoração
A questão da ética jornalística nas reportagens do livro “O olho da rua”, de Eliane Brum
Arthur de Oliveira Rocha - Depto. de Comunicação Social - UFRN
Maria do Socorro Furtado Veloso - Profa. Dra./Orientadora - Depto. de Comunicação Social - UFRN
INTRODUÇÃO:
Ética vem do grego “ethos”, que significa “hábito”, “costume”. Segundo Christofoletti (2008, p.18), trata-se de “um conjunto de processos mentais e reflexivos que derivam em práticas concretas na vida”. A ética estuda os preceitos que justificam as escolhas do indivíduo. Ultrapassa julgamentos e valores, não tendo o caráter obrigatório e normativo da moral. É questionadora, reflexiva.
As questões éticas às quais está sujeito o jornalista encontram sua resposta num discurso da ética do campo. “Um jornalista pode achar moralmente errado mentir, mas sua ética jornalística, aliada inconscientemente aos interesses do campo e justificada dessa maneira, pode mentir para obter uma informação” (MARTINO, 2010, p.37).
No terceiro livro da jornalista Eliane Brum, "O olho da rua" (Globo, 2008), o trabalho de repórter leva a autora a passar por situações que envolvem conflitos éticos. Para Eliane, a reportagem é um ato de entrega e envolvimento intenso com suas fontes. Esse envolvimento acarreta confiança recíproca e o jornalista fica numa linha tênue entre agir com ética e agir movido pelos interesses profissionais. Esse impasse corresponde ao que Fidalgo (1997) trata como ética de foro individual (a ética da convicção) e ética profissional (a ética da responsabilidade).
OBJETIVO DO TRABALHO:
Este trabalho tem a finalidade de identificar situações que envolvam questões da ética jornalística no trabalho de Eliane Brum, tomando por objetos dez reportagens que integram o livro "O olho da rua". A partir daí, pretende-se relacionar situações vividas no processo de apuração das matérias com as orientações do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros e pesquisas na área.
MÉTODOS:
A metodologia aplicada à pesquisa inclui levantamento bibliográfico para elaboração do referencial teórico que serviu como suporte para o estudo, bem como análise de conteúdo da coletânea de dez reportagens escritas para a revista Época e publicadas no livro "O olho da rua", da jornalista Eliane Brum. Também foram consultados, na internet, vídeos de entrevistas concedidas por Eliane para programas de televisão brasileiros.
Neste trabalho foram analisadas as questões éticas abordadas por Eliane Brum em "O olho da rua", em especial o conteúdo dos capítulos em que Eliane revela os bastidores de cada uma das dez reportagens que compõem o livro.
Também foram relacionadas situações como o envolvimento com as fontes, presença do repórter como personagem na matéria, ética do jornalista-cidadão e rigor na apuração jornalística com o que determina o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros e com o que dizem pesquisadores e estudiosos da ética jornalística, como Cláudio Abramo, António Fidalgo, Eugênio Bucci, Rogério Christofoletti, Francisco José Karam, Luís Sá Martino, Juremir Machado da Silva e Luciene Tófoli.
RESULTADOS E DISCUSSÃO:
Em "O olho da rua", Eliane Brum prima por métodos rigorosos de pesquisa e apuração. Tratar a apuração jornalística com rigor faz parte dos princípios deontológicos do jornalismo. Apesar disso, a jornalista comete falhas na apuração, descritas pela própria autora no livro.
Eliane Brum vê, nas reportagens, o envolvimento com a fonte como fundamental. No entanto, esse aspecto pode ser questionado, por exemplo, quando a jornalista se torna madrinha do casamento de uma fonte.
A participação do jornalista nas reportagens, para Eliane, é válida se revelar mais do outro que de si mesmo. Quando não, o jornalista deve estar na reportagem para comunicar assuntos de interesse público e não para dar vazão à vaidade jornalística.
Quanto à isenção e objetividade jornalística, “nossa simples presença – ou decisão de fazer uma reportagem – já altera a realidade sobre a qual vamos escrever” (BRUM, 2008, p.419). Em "O olho da rua", Eliane fala que interferências podem ser evitadas e que é importante manter o leitor informado quanto a essas dificuldades.
Levando em consideração o que diz Abramo sobre a ética do jornalista ser a mesma do cidadão, Eliane pede, sete anos depois, desculpas aos personagens da reportagem “A casa de velhos”. Essa foi uma atitude ética de jornalista-cidadão.
CONCLUSÕES:
Em “O olho da rua”, Eliane Brum preza pela ética – em suas esferas individual e coletiva. Preza também pelo rigor na apuração. Não se dá por satisfeita com um trabalho de apuração pela metade. Age eticamente quando está in loco, respeitando as diferenças e a pluralidade, compreendendo o outro em sua complexidade e expressando bem essa compreensão em seus textos.
Dentre suas atitudes no processo de construção das reportagens, Eliane deixa bem claro aos leitores qual seu lugar na matéria e até onde ela, como repórter, interferiu naqueles acontecimentos. Para a autora, o jornalista deve tentar intervir o mínimo possível no ambiente e nas escolhas das pessoas que compõem a reportagem. É defensora da não edição das falas das fontes para padronizá-las à norma culta, o que, no seu modo de ver, apaga a personalidade do personagem. A forma de falar reflete quem cada um de nós é.
Mas as reportagens de Eliane Brum, algumas vezes, expõem excessivamente alguns personagens, chegando a provocar certo mal estar. São passíveis de questionamento também algumas atitudes da repórter, como a grande proximidade que mantém com algumas fontes, como quando aceitou ser madrinha de casamento de uma personagem ou quando cuidou de outra em seus últimos dias de vida.
Palavras-chave: Ética Jornalística, O olho da rua, Eliane Brum.