65ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 5. História - 8. História Regional do Brasil
A URBANIDADE DO AÇÚCAR: MARCAS ESPACIAIS DO TRANSPORTE E COMÉRCIO DO AÇÚCAR NO RECIFE DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XIX.
Davi Costa Aroucha - Graduando em História – UFPE
Christine Paulette Yves Rufino Dabat - Profa. Dra./Orientadora – Departamento de História – UFPE
INTRODUÇÃO:
Não há dúvidas que o açúcar foi, desde o século XVI, o principal produto gerador de riqueza na economia pernambucana . Sob a sombra das plantações de cana no interior da província, a cidade do Recife se desenvolveu como ponto de contato entre a economia açucareira e o mercado consumidor externo. Assim, o bairro do Recife, onde se localizava o porto da cidade, possuía grande importância para a economia local por funcionar como ponto de chegada e escoamento de produtos para o além-mar.
O século XIX assistiu a um crescimento populacional jamais visto no espaço urbano recifense - estima-se que a população do Recife saltou de 34 mil habitantes em 1822 para 150 mil em 1893 - o que implicou em uma série de reestruturações e expansão da malha urbana da cidade. Paralelo a isso, o Recife buscava integrar-se ao mercado capitalista internacional mediante exportação da produção local, que tinha como destaque o açúcar, e importação de produtos, valores e pessoas dos grandes centros metropolitanos europeus, a exemplo de Londres e Paris. O açúcar consistia, portanto, peça fundamental na integração do Recife a este mundo símbolo da civilização e do progresso e passou a delimitar seus espaços no cotidiano da cidade do Recife, estabelecendo marcas na configuração do espaço urbano local.
OBJETIVO DO TRABALHO:
Este trabalho teve como objetivo delimitar os espaços de atuação do açúcar no interior da malha urbana recifense na segunda metade do século XIX. Além disso, destacou-se a presença constante do açúcar no Recife dos oitocentos através das demandas de transporte e escoamento do produto do interior pernambucano para o porto recifense.
MÉTODOS:
O espaço urbano do Recife foi alvo de uma série de reformas e alterações substanciais ao longo dos séculos XIX e XX, o que dificultou a identificação dos antigos locais de atuação do sistema econômico açucareiro na cidade recifense. A despeito disso, as demandas do transporte e comercialização do açúcar marcaram longamente o cotidiano da capital pernambucana, na qual o açúcar influenciou o ordenamento da cidade ao ponto de atribuir funções econômicas a certos locais do espaço urbano local.
Nesse sentido, para resgatar os locais de atuação do açúcar no interior da cidade buscou-se relatos de contemporâneos e de viajantes estrangeiros que aportaram no Recife e registraram suas impressões da cidade durante o século XIX. Além disso, foram consultadas as Leis Provinciais de Pernambuco do período de 1869 a 1877 e as Posturas da Câmara Municipal do Recife do século XIX no intuito de verificar qual a posição do Estado em relação à ordenação e produção do espaço urbano nas atividades de transporte, armazenamento e comércio do açúcar. Tal pesquisa documental foi acompanhada de uma constante revisão bibliográfica, que concedeu o embasamento teórico e metodológico para a concretização deste trabalho.
RESULTADOS E DISCUSSÃO:
Grande parte da produção açucareira da província de Pernambuco foi orientada para o mercado consumidor externo: entre os anos de 1856 e 1890, cerca de 80% do açúcar pernambucano destinava-se à exportação . Dessa forma, o porto do Recife era destino final de quase toda a produção açucareira local e consolidou-se, desde o século XVI , como espaço urbano do açúcar. Canoas, barcaças e carroças de tração animal conduziram o açúcar do interior pernambucano ao bairro do Recife alterando o fluxo de pessoas e mercadorias na capital pernambucana e evidenciando cotidianamente a presença da economia açucareira na província de Pernambuco. Tal presença é marcante nas descrições de estrangeiros e pernambucanos das cenas da vida recifense durante o século XIX, nas quais se destacou armazéns e casas de comércio como prédios característicos de ruas centrais do bairro do Recife, como a Rua do Apolo e a Rua Nova .
A introdução das ferrovias a partir de 1862 trouxe um novo panorama ao transporte urbano do açúcar: os terminais ferroviários criaram novos espaços do açúcar em regiões periféricas da cidade. As linhas férreas, entretanto, não bastavam para o transporte do açúcar até seu destino final, de forma que este transporte teve de atuar em parceria com as tradicionais carroças de tração animal e barcaças para o translado do açúcar até o porto recifense, fazendo sentir a presença do açúcar no cotidiano recifense em meio ao processo de mudanças verificado no último quarto do século XIX.
CONCLUSÕES:
A economia açucareira fez parte do cotidiano da cidade do Recife desde os primórdios de sua formação. Pode-se afirmar, inclusive, que foi a cana-de-açúcar que deu viabilidade financeira ao empreendimento colonial na província de Pernambuco. Neste sentido, o espaço urbano do Recife foi constantemente marcado por esses locais de transporte, armazenamento e comércio de açúcar.
O século XIX foi marcado por um aumento populacional nunca antes visto na província de Pernambuco, o que trouxe grandes repercussões para a constituição do espaço urbano recifense e seu crescimento. As mudanças no processo de produção, transporte e armazenamento do açúcar ocorridas no último quarto dos oitocentos, sobretudo em virtude da adoção das ferrovias, fizeram com que a economia açucareira ocupasse novos espaços dentro da cidade, dirigindo-se às regiões periféricas nas quais se localizaram os terminas ferroviários. Apesar dessas mudanças na ordem urbana recifense, o açúcar se manteve como elemento presente na cidade, e, portanto, criou demandas e contribuiu de forma direta para a formação e expansão do espaço urbano do Recife oitocentista.
Palavras-chave: Urbanização, Recife Oitocentista, Açúcar.