65ª Reunião Anual da SBPC
F. Ciências Sociais Aplicadas - 13. Serviço Social - 1. Serviço Social Aplicado
"RUA DO MEDO": RELATOS DE VIOLÊNCIA E INSEGURANÇA NO BAIRRO ELLERY ( FORTALEZA/CE)
Anielly Maria Aquino Bezerra - Centro de Estudos Sociais Aplicados - UECE
Nayá Perdigão Bezerra - Centro de Estudos Sociais Aplicados - UECE
Michel Carvalho Barbosa - Centro de Estudos Sociais Aplicados - UECE
Vaneska Tavares Leite Andrade - Centro de Estudos Sociais Aplicados - UECE
Maria Glaucíria Mota Brasil - Profa. Dra./Orientadora - Centro de Estudos Sociais Aplicados - UECE
INTRODUÇÃO:
Tendo em vista a crescente violência urbana no Estado do Ceará, cujo Mapa da Violência 2013 aponta o total de 2.056 homicídios no ano de 2010, este trabalho estabelece foco na capital – Fortaleza – na qual o crescimento de homicídios por armas de fogo apresentou um significativo acréscimo. Fortaleza, segundo o Mapa, possui o total de 346 mortos por armas de fogo em 2000. Já em 2010 esses dados são de 1.159, o qual apresenta um acréscimo de quase 243%. Imerso a esta realidade encontra-se o bairro Ellery, cuja aparição nos veículos de comunicação tem sido recorrente, sobretudo após o ocorrido no mês de janeiro (2013). Situação na qual policiais do Ronda do Quarteirão, chamados a interferir num evento comemorativo local – por razão de som automotivo – balearam cinco pessoas, dentre as quais totalizam as mortes de dois jovens (16 e 18 anos). Tem-se como ponto de partida este evento de notável repercussão midiática, o qual intensificou as discussões acerca do modelo de Polícia Comunitária no Estado, denominado Ronda do Quarteirão (2007). É de relevante importância analisar os relatos de moradores da rua Almeida Filho (bairro Ellery) – denominada por parte dos moradores de “rua do medo” – sob o ângulo interpretativo, percepções como: violência, policiamento comunitário e segurança.
OBJETIVO DO TRABALHO:
Conhecer e analisar – de modo quanti-qualitativo – as percepções dos moradores do bairro Ellery, situado na cidade de Fortaleza/Ce. Percepções acerca da violência urbana, dos Direitos Humanos e da atuação do Ronda do Quarteirão na comunidade. Interpretar de que forma o evento ocorrido influencia a relação da comunidade com o Ronda do Quarteirão, também conhecido por “Polícia da boa vizinhança”.
MÉTODOS:
Trata-se de uma pesquisa exploratória. A pesquisa teve início no ano de 2012. Assim, em primeiro lugar, como percurso metodológico, foi realizado um levantamento bibliográfico acerca das categorias Violência Urbana, Segurança Pública e Direitos Humanos. Em segundo lugar, foram realizadas 12 entrevistas com o intuito de coletar os dados empíricos da pesquisa. As entrevistas utilizadas foram semi-estruturadas, realizadas com os moradores da Rua Almeida Filho, denominada pelos membros da própria comunidade de “rua do medo”, localizada no bairro Ellery (Fortzlea/Ce). O instrumental feito pelos pesquisadores foi constituído por 10 perguntas abertas, a fim de conhecer a opinião dos moradores a respeito das mudanças que ocorreram no bairro desde que ali moravam, percepção sobre direitos humanos, violência, polícia comunitária, segurança pública e sobre possíveis mudanças almejadas pela comunidade. Para a análise dos resultados, adota-se uma pesquisa qualitativa – como a análise do conteúdo/discurso. Vale ressaltar que a pesquisa foi realizada a partir da percepção dos moradores do bairro Ellery, onde a violência urbana e a insegurança tornaram-se parte do cotidiano dos seus moradores. Tem-se como base, para análise da ação policial, as ações do Programa do Ronda do Quarteirão.
RESULTADOS E DISCUSSÃO:
A partir da tabulação e análise dos dados, percebe-se que a insegurança no local é constante, a “exceção tornou-se a regra” (Agamben). Assim, dos 12 entrevistados, 9 atribuíram nota 0 para a segurança no bairro, os outros 3 sujeitos atribuíram notas entre 1 e 3. Sobre a atuação do Ronda do Quarteirão; metade dos entrevistados não tinha informações ou sabia acerca do policiamento comunitário e também desconheciam que o Ronda foi criado para atuar por meio do policiamento de proximidade com a população, de modo mais preventivo do que repressivo e orientado pela filosofia do policiamento comunitário. Já os outros 6 pesquisados sabiam qual o significado de policiamento comunitário e que o Ronda faz parte dele, contudo afirmaram que essa prática é ineficaz e que a Polícia denominada “Policia da boa vizinhança” é mais violenta e autoritária. Afirmaram ainda de forma unanime que o Raio (Ronda de Ações Intensivas e Ostensivas) é bem mais eficiente, de modo que eles, no bairro, fazem rotineiramente o trabalho de abordagem dos indivíduos. Quando o assunto em pauta dizia respeito aos Direitos Humanos, dos 12, 4 afirmaram que a criação desse conceito defendia somente indivíduos em conflito com a lei. Desse universo de 12 entrevistados, 3 não sabiam a finalidade dos Direitos Humanos.
CONCLUSÕES:
Ao analisarmos os relatos dos moradores, destaca-se a questão do medo como eixo principal dos discursos. A interação do Ronda do Quarteirão com a comunidade, a qual deveria ser regida pelos princípios do Policiamento Comunitário, de diálogo e conhecimento acerca dos problemas do bairro, mostrou-se ineficaz no enfrentamento da criminalidade e da violência. A constante sensação de medo, como também as problemáticas da violência – para os moradores – poderiam ser solucionadas por meio do patrulhamento ostensivo do Raio (Ronda de Ações Intensivas e Ostensivas). No imaginário dos moradores, essa é a “polícia eficaz” em seu modelo ostensivo e repressivo. No caso dos jovens baleados pelo Ronda do Quarteirão (2013), ponto de partida deste trabalho, conclui-se que este fato estabeleceu um marco na visão dos moradores acerca do modelo de Polícia Comunitária, dito de outra maneira, esse modelo é tido como desastroso e mal preparado para interferir nos conflitos do bairro. O fato da maioria dos entrevistados desconhecerem o Ronda do Quarteirão como proposta de atuação mais preventiva do que repressiva revela não só o fracasso desse modelo como Policiamento Comunitário como expõe os equívocos da política de segurança pública do Estado do Ceará, frente ao crescimento da violência fatal.
Palavras-chave: Ceará, Ronda do Quarteirão, Violência fatal.