65ª Reunião Anual da SBPC
F. Ciências Sociais Aplicadas - 2. Gestão e Administração - 3. Gestão da Produção e Marketing
PARADOXOS DO DISCURSO DO CONSUMO “CONSCIENTE” DE MODA
Adriana Tenório Cordeiro - Universidade de Pernambuco - UPE
Marcela de Moraes Batista - Lócus de Investigação em Economia Criativa/ PROPAD/ UFPE
Mayara Andresa Pires da Silva - Escola de Referência em Ensino Médio Professor Antônio Farias - PE
Girlaynne Danusia Farias Pereira - Lócus de Investigação em Economia Criativa/ PROPAD/ UFPE
INTRODUÇÃO:
Na sociedade do espetáculo (DEBORD, 2005), a moda-vestuário compõe o palco, e é usada como uma extensão do que o sujeito ‘é’ ou ‘gostaria de ser’. Apesar de seu status ambivalente (BARNARD, 2003), a moda contempla uma maneira pela qual o espaço social tem sido experimentado, explorado, comunicado e reproduzido, sendo que o discurso da moda, com estruturações diversas, possui recortes específicos que estabelecem acordos ou polêmicas com algum discurso de base. Uma análise subjacente do discurso da moda permitiria reconhecer como manifestações textuais individualizadoras, constituintes de épocas, estilos, assim como de quem as adota, são valoradas na sociedade e passam a valorar o próprio sujeito-usuário (CASTILHO, 2004). No repertório mercadológico, em especial, a questão da responsabilidade que tem sido atribuída ao consumidor de moda no que diz respeito a problemas ambientais fortalece a ideia de um consumidor “soberano” em contraposição à lógica da ação do Estado, e representa objeto de análise nesta pesquisa. Na narrativa de consumidoras locais de moda tentamos compreender como problemáticas socioculturais e ambientais são (re)descritas segundo uma prática supostamente “consciente” no consumo de moda.
OBJETIVO DO TRABALHO:
Este trabalho tem a finalidade de identificar, em práticas discursivas no contexto do consumo de moda, aspectos da linguagem que indicam maneiras pelas quais a moda-vestuário é usada para legitimar, modificar ou reconstruir o espaço social. Pretende-se identificar, especificamente, como problemáticas socioculturais e ambientais são (re)descritas pela consumidora de moda.
MÉTODOS:
Foi conduzida uma pesquisa exploratória qualitativa no contexto do Polo de Confecções do Agreste pernambucano. Após desk research, foi construído um corpus (SINCLAIR, 1991) a partir de: 10 entrevistas em profundidade feitas com jovens consumidoras de moda. Dados suplementares incluíram fontes diversas: artigos e conferências; matérias e notícias de jornais, revistas e internet sobre o consumo de moda no Agreste pernambucano, totalizando 70 artigos/matérias. Realizamos uma análise de conteúdo clássica (BARDIN, 1977), com auxílio de mapa de codificação adaptado a partir de tipologia proposta por Miranda (2008). Foram incorporadas novas dimensões ao longo do processo analítico, e o mapa final incluiu 07 dimensões - social (social-simbolismo); comunicacional (auto-simbolismo); motivacional (necessidades simbólicas e funcionais); política (racionalidade sociopolítica e moda); ambiental; econômica (racionalidade econômica e moda); e cultural (elementos histórico-culturais e moda) -; foram definidos 45 eixos de análise e 95 códigos. As etapas da análise incluíram: desmembramento dos dados brutos; identificação e codificação dos elementos representativos; mensuração da quantidade de vezes com que os elementos foram mencionados; e análise secundária de frequências.
RESULTADOS E DISCUSSÃO:
A dimensão comunicacional representa o sujeito e constitui uma fronteira entre o eu e o outro, problematizando as relações simbólicas envolvidas no consumo de moda, em especial o modo como o discurso da moda é atrelado ao status. A marca faz parte do projeto identitário da jovem consumidora, sendo que esta não apenas responde à identidade de marca, mas negocia a marca em relação a sua própria identidade. Na esfera motivacional, o apelo estético é tão sedutor que as jovens se submetem a sofrerem com produtos desconfortáveis em prol de uma espécie de ditadura da beleza. Apesar da dor, o consumo da mercadoria faz com que sua usuária conquiste a felicidade, representada pela inveja e atenção dos outros (SOARES, 2010). A jovem é interpelada a assumir responsabilidades que eram consideradas do Estado, evidenciando-se o entrelaçamento das dimensões política e ambiental no contexto de consumo. Por um lado, as empresas absorveram o discurso da responsabilidade socioambiental, mas por outro a consumidora se vê diante do impasse de fazer escolhas e de se responsabilizar por algo que está além da sua capacidade de compreensão e atuação (FONTENELLE, 2006). Além disso, a constante troca e descarte de produtos coloca a consumidora diante de um conflito que embota a sua prática “consciente”.
CONCLUSÕES:
Nas práticas discursivas no contexto do consumo de moda, problematizamos a relação entre inveja e felicidade como marcador importante, sendo que as ressonâncias da atividade publicitária são intensas na transferência de significados culturais a objetos que seriam, de outro modo, considerados meramente funcionais. Ao olhar o consumo de moda como manifestação da subjetividade, buscamos desmistificar alguns dos rótulos comumente atribuídos à moda (como “simples trivialidade”, por exemplo), evidenciando-a como parte dos recursos empregados pelo sujeito para construção identitária. O consumo de moda atuaria como um dos tipos de ‘substituto’ do desenvolvimento do eu, bem como de reprodução cultural na sociedade contemporânea. sendo que a moda que funciona como parte dos recursos empregados pelo sujeito para construção identitária e reprodução cultural. Observam-se paradoxos de um consumo “ecologicamente correto” de moda, desmitificando-se a ideia de que o consumo “consciente” de moda é simplesmente uma questão de “escolha”. O próprio uso de matérias-primas sustentáveis não subverte a filosofia de descarte intrínseca à moda, devendo-se refletir de forma crítica acerca da possibilidade de uma “consciência parcial” no âmbito do consumo de moda.
Palavras-chave: Subjetividade contemporânea, Práticas discursivas, Questão ambiental.