65ª Reunião Anual da SBPC
H. Artes, Letras e Lingüística - 4. Linguística - 6. Liguística
PARA VENDER, PARA LUCRAR: UMA ANÁLISE DO DISCURSO DA “MERCANTILIZAÇÃO” DA MORTE A PARTIR DA COMUNICAÇÃO PUBLICITÁRIA EM ALAGOAS
Mercia Sylvianne Rodrigues Pimentel - Universidade Federal de Alagoas
INTRODUÇÃO:
Os sentidos relativos à morte mudam conforme as culturas que os produziram, são reflexo das relações estabelecidas entre os homens; pois suas práticas se convertem ideologicamente em crenças e valores que são disseminados através das culturas. Assim como a ideia de vida, a de morte também reflete o sistema de dominação político vigente. Como o modo de produção capitalista vigora mundialmente, consequentemente a visão que as sociedades têm da morte reproduz as relações estabelecidas neste sistema. Para o capitalismo, tudo é passível de lucro, até mesmo a morte, sendo sua comercialização mediada pela linguagem da publicidade e da propaganda. Levando isso em consideração, o discurso sobre a morte na perspectiva do capital merece ser observado, pois atualmente o morrer humano vem se tornando alvo de constantes peças publicitárias, sendo doutrinariamente trabalhado para vender, para lucrar. Desse modo, pretendemos analisar o discurso da “mercantilização” da morte a partir da comunicação publicitária em Alagoas, tomando como arcabouço teórico norteador a Análise do Discurso fundada por Pêcheux.
OBJETIVO DO TRABALHO:
O crescente aumento do mercado funerário, demonstrado a partir do “boom” de anúncios publicitários sobre a morte, causa-nos inquietação e provoca alguns questionamentos. Por isso, pretendemos compreender, a partir da análise discursiva de peças publicitárias elaboradas por empresas do segmento funerário de Alagoas, como se dá o processo de significação e apropriação da morte como mercadoria.
MÉTODOS:
O corpus heterogêneo se constitui de anúncios (comunicação gráfica veiculada nos meios de comunicação), comerciais (comunicação cinemática para cinema e Tv), fonograma (comunicação sonora para rádio: spots, jingles) e cartaz (comunicação gráfica utilizada em paredes, painéis, muros, como os outdoors que são afixados em grandes painéis). Desse material publicitário, extraímos sequências discursivas para analisá-las conforme as condições históricas em que foram produzidas. Utilizamos os dispositivos teóricos da Análise do Discurso de linha pecheutiana (condições de produção, interdiscurso, memória, formação discursiva, formação ideológica), fazendo também uma interlocução com outras áreas do conhecimento, como o Materialismo Histórico, a Tanatologia, a Antropologia, a Filosofia e a Teoria da Comunicação (campos da Publicidade e da Propaganda). Procuramos, além de analisar os enunciados contidos nas materialidades discursivas, compreender os efeitos de sentido possibilitados pela leitura do não-verbal. O percurso analítico nos permitiu compreender, via discurso, de que forma ocorre o processo de mercantilização da morte, como a estrutura capitalista transforma a morte em produto, de que maneira a publicidade atua nesse funcionamento discursivo.
RESULTADOS E DISCUSSÃO:
Falar de morte no cotidiano dos sujeitos soa como mau agouro ou mau gosto. No entanto, as práticas ideológicas do sistema capitalista de produção parecem desafiar essa esfera do “indiscutível”, transformando o abstrato em concreto, ou seja, morte em mercadoria, através do discurso publicitário. Ávidos pelo consumo desenfreado, os sujeitos anseiam por comprar mais e mais; a morte seria uma interrupção dessa prática hedonista, tornando-se algo angustiante, tanto que nas peças publicitárias observadas não se percebe qualquer reflexão sobre o sentido da vida e o valor da morte. Mas as práticas sociais capitalistas vêm demonstrando que o espetáculo midiático pode tornar o assunto interessante e engraçado, e por que não rentável. Recorrendo ao humor e à banalização do tema, a publicidade empresarial se utiliza de já-ditos metaforizados no universo social, imprimindo-lhes novos sentidos e reforçando os ideais de consumo, como os desejos de comodidade, facilidade no pagamento e conforto. “Quem é esperto compra logo” e “um espaço perfeito para morrer” são paráfrases desses dizeres. Assim, se tudo se converte em lucro, a morte também se converte em potencial mercadoria, sendo a comercialização mediada pela linguagem da publicidade e da propaganda.
CONCLUSÕES:
A esfera da comunicação midiática muitas vezes serviu para reproduzir o sistema dominante vigente, uma vez que os interesses dos que estão no poder são reforçados pelas práticas da publicidade e da propaganda. Historicamente, esses campos foram criados para “vender” ideias (no caso da propaganda) e vender produtos e serviços (no caso da publicidade); trata-se de esferas inter-relacionadas, que não surgiram no modo de produção capitalista, mas que encontraram nele um bom lugar para germinar suas práticas. O capitalismo abarca os campos da publicidade e da propaganda, sempre atualizando-as conforme as necessidades do sistema. Apropria-se também da morte, convertendo-a simbolicamente em produto de consumo; e isso o faz mediado pela linguagem publicitária, através do funcionamento ideológico, que cria evidências, fazendo com que as ideias dominantes sejam naturalizadas. Acreditamos que refletir sobre o processo de “empresariamento” da morte mediado pelo discurso publicitário nos permitirá compreender melhor a estrutura sob a qual a sociedade está assentada, as contradições inerentes ao sistema, nossa condição enquanto ser social.
Palavras-chave: Análise do Discurso, Finitude, Capitalismo.