65ª Reunião Anual da SBPC
D. Ciências da Saúde - 1. Enfermagem - 7. Enfermagem
A PROFISSIONALIZAÇÃO DA ENFERMAGEM BRASILEIRA: UMA ABORDAGEM DISCURSIVA
Marlus Dilvo Melo Souza - Graduando/Autor – Enfermagem – UFAL
Sóstenes Ericson Vicente da Silva - Prof. MsC./Orientador – Enfermagem – UFAL
INTRODUÇÃO:
Historicamente, a Enfermagem tem sido considerada uma profissão, predominantemente, feminina. Numa concepção ontológica, o cuidado é considerado enquanto necessidade humana básica. No entanto, o advento da Enfermagem moderna tem contribuído para o desenvolvimento de um caráter multifacetado, sob a ótica do cuidado de Enfermagem, cuja expressão se origina do processo de mercadorização da prática do cuidar, acirrado pela divisão sexual e técnica do trabalho. Desse modo, o cuidado se inscreve a partir do processo de hierarquização da Enfermagem e da precarização das relações de trabalho. Esta condição atravessa o processo de construção da identidade profissional, evidenciando interferências ideológicas, políticas, econômicas, sociais, religiosas e culturais, que incidem nos sentidos produzidos pela projeção da profissão. É relevante compreender como o discurso midiático sobre a Enfermagem (re) produz sentidos que se movem nas contradições das relações sociais, evidenciando a sua subordinação às determinações históricas e ideológicas, que perfazem a (re) produção da projeção da Enfermagem e os efeitos de sentido (re) produzidos. Nesse contexto, a mídia pode atuar como instrumento de reprodução e sedimentação de desigualdades presentes na sociedade (MALAGUTTI, 2007, p. 32).
OBJETIVO DO TRABALHO:
O presente estudo buscou identificar as formações discursivas e ideológicas presentes no discurso da mídia sobre a Enfermagem, como também compreender o funcionamento do referido discursivo, com base nos implícitos e silenciamentos, tendo por objetivo geral analisar o discurso da mídia sobre a profissionalização da Enfermagem.
MÉTODOS:
O presente estudo decorre de uma pesquisa realizada no período de 2011 a 2012, na qual foi analisado o discurso da mídia sobre a Enfermagem. Toma como aporte teórico a Análise do Discurso (AD), de linha francesa, com base nos estudos de Pêcheux (2009). Partimos das materialidades linguísticas do discurso, recuperando as suas condições de produção, para alcançar suas filiações discursivas e ideológicas. Destacamos que, inicialmente, foi realizada uma busca aleatória em reportagens da Revista Veja, disponíveis em versão eletrônica, considerando o período de 2001 a 2010, utilizando como descritores: Enfermagem. Enfermeira. Enfermeiro. Ao todo foram identificadas 252 citações (e dentre essas 43 reportagens) sobre a Enfermagem, variando entre abordagens sobre profissão, aspectos éticos e legais, mercado de trabalho e temas gerais, como propaganda. Com base no objetivo do estudo, selecionamos as reportagens que tratavam sobre a profissionalização da Enfermagem (ingresso no Curso, formação profissional, mercado de trabalho, relações profissionais), o que possibilitou a composição de um corpus a ser analisado, segundo as Condições de Produção do discurso, os Implícitos e Silenciamentos, como também a noção de Formação Discursiva (FD) e de Formação Ideológica (FI).
RESULTADOS E DISCUSSÃO:
Das 32 sequências discursivas (SD) analisadas, traremos apenas uma para analisar como os sentidos funcionam no discurso. Consideramos a Veja como sujeito enunciador e a mídia como sujeito universal. (SD) – “De uns anos para cá, os bons hospitais particulares fizeram um investimento notável em infra-estrutura, equipamento e também na qualificação de mão-de-obra. A transformação produziu um efeito prático na vida dos enfermeiros com curso superior. Aqueles que se graduavam em enfermagem viam seu posto de trabalho ser ocupado por pessoas com 2º grau e curso técnico. Em razão do amadorismo, formados e não formados disputavam os mesmos empregos e salários muito baixos. Os ganhos não se tornaram exuberantes, mas a passagem pela universidade está mais valorizada do que nunca.” Em seus fundamentos, o incentivo à formação profissional em Enfermagem remonta aos anos 1960/70, quando o país passou a ser industrializado, requisitando do Estado investimentos em áreas prioritárias, com ênfase na assistência hospitalar, no incentivo às especialidades e na ampliação de novas tecnologias hospitalares. É nesse campo que estamos compreendendo o discurso da Revista Veja, incentivando a profissionalização universitária, apesar da baixa remuneração, como algo naturalmente dado.
CONCLUSÕES:
Buscamos apreender, através do discurso, como os efeitos de sentido são produzidos no que se refere à profissionalização da Enfermagem. A Revista Veja se inscreve na FD midiática e filia-se a FI capitalista, buscando através da memória discursiva evocar os sentidos de profissionalização, enquanto silencia suas determinações históricas. Em tal discurso, está implícita a necessidade de manutenção da hierarquização da Enfermagem, como os sentidos de naturalização da baixa remuneração salarial. Ao tratar sobre o curso de Enfermagem, ou mesmo sobre o mercado de trabalho e as relações profissionais, a Revista evidencia (ainda que por vezes implicitamente) as bases históricas da profissão, com ênfase para a divisão sexual do trabalho (paradigma da feminização) e para a hierarquização (externa e interna à profissão). Para além das inquietações que nos acompanham, apontamos que a superação dessa ordem desumana de coisas só será efetivada quando suas bases forem radicalmente removidas, o que impõe o desafio histórico da classe trabalhadora rumo à superação da sociedade do capital, e na consequente construção de uma sociedade efetivamente humana e livre, na qual o cuidado se destinará essencial e completamente à satisfação das necessidades humanas.
Palavras-chave: Enfermagem, Mídia, Discurso.