65ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 7. Educação - 12. Ensino de Ciências
QUEM DESCOBRIU A EXPANSÃO DO UNIVERSO? HISTÓRIA DA COSMOLOGIA NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES
Alexandre Bagdonas - Programa Interunidades em Ensino de Ciências, Universidade de São Paulo
João Zanetic - Instituto de Física, Universidade de São Paulo.
Ivã Gurgel - Instituto de Física, Universidade de São Paulo
INTRODUÇÃO:
Pesquisas na área de ensino de ciências tem enfatizado a importância de não somente buscar ensinar conteúdos específicos, mas também trazer discussões metacientíficas, sobre as ciências. As visões ingênuas sobre a ciência, tais como a visão de que as descobertas científicas são realizadas por gênios isolados, sem mostrar o aspecto coletivo das contribuições científicas, foram amplamente criticadas por historiadores, filósofos e sociólogos da ciência ao longo do século XX (Zanetic 1990, Henrique 2011). Não só na divulgação científica, mas também em enciclopédias e em grande parte dos livros sobre cosmologia, se atribui a Edwin Hubble a descoberta do universo em expansão. A relação entre velocidade de recessão das galáxias e sua distância (V = H . d) ficou conhecida como Lei de Hubble, sendo a constante de proporcionalidade H denominada constante de Hubble. Contudo, com base em estudos realizados por historiadores da cosmologia (North 1965, Smith1982, Kragh 1996), argumentamos que o ensino sobre esse episódio histórico seria muito mais rico e adequado se apresentasse a expansão do universo como uma construção coletiva, em que Hubble teve um papel importante, mas que certamente não foi um “descobridor” isolado.
OBJETIVO DO TRABALHO:
Analisamos e confrontamos diferentes versões entre historiadores da ciência sobre a criação da relação redshift-distância, atualmente chamada de Lei de Hubble, com o intuito de trazer discussões sobre o conceito de “descoberta” na ciência para a formação de professores de ciência.
MÉTODOS:
Análise historiográfica baseada em fontes primárias (os artigos de Vesto Slipher, Carl Wirtz, Ludwik Silberstein, Knut Lundmark, Georges Lemaître e Edwin Hubble) e fontes secundárias, obras de historiadores da ciência que trataram deste tema.
RESULTADOS E DISCUSSÃO:
A relação entre o desvio espectral dos corpos celestes e sua distância já havia sido estudada por diversos astrônomos, como Slipher (1917), Wirtz (1922), Silberstein (1924), Lundmark (1924) e sua interpretação gerou debates tanto entre os astrônomos quanto entre estudiosos da cosmologia relativística, tais como Willem De Sitter e Georges Lemaître. A criação da teoria do universo em expansão teve vários colaboradores, em um processo que durou alguns anos, envolvendo tanto aspectos teóricos quanto experimentais. A ideia do universo em expansão surgiu teoricamente em 1922 com Friedmann, observacionalmente com Slipher em 1912, e a relação redshift distância foi proposta por Wirtz (1922), Lundmark (1924), Silberstein (1924), mas confirmada com medidas mais precisas de distâncias por Hubble,em 1929. Contudo, ele mesmo não viu seu trabalho como confirmação da expansão do universo. Essa interpretação só passou a ser aceita pela maioria da comunidade científica na década de 1930, com a divulgação dos trabalhos de Lemaître de 1927, processo em que Eddington teve papel preponderante
CONCLUSÕES:
Nossa intenção nesse trabalho não é “desmantelar o legado de Hubble”, diminuir sua importância na história da ciência ou defender a importância de se dar crédito a outros autores. Buscamos ao invés disso debater diversos sentidos possíveis para o termo “descoberta”, evidenciar influências de concepções filosóficas, crenças particulares e motivações pessoais dos cientistas no processo de aceitação das teorias, assim como na criação da versão oficial da história da ciência transmitida pelos livros escritos pelos cientistas e divulgadores das ciências. Consideramos que na educação básica não se deve apresentar a história da cosmologia como um conjunto de nomes, fatos e datas como as descobertas realizadas pelos grandes cientistas que devem ser memorizadas pelos alunos. A tradição dos cientistas de contar os resultados que a comunidade considera mais relevantes faz com que os manuais, os livros utilizados pelos cientistas em sua formação, atribuam os fenômenos naturais particulares aos personagens históricos que supostamente os teriam descoberto. Com isso, fazer descobertas individuais torna-se um objetivo para muitos cientistas, o que explica o acontecimento de constantes disputas por prioridade. Defendemos que seria muito mais interessante, tanto na educação básica quanto na formação de cientistas, apresentar a criação das teorias como um processo estendido por um período e que envolve vários colaboradores.
Palavras-chave: Cosmologia, Filosofia da ciência, História da ciência.