65ª Reunião Anual da SBPC
H. Artes, Letras e Lingüística - 4. Linguística - 6. Liguística
Responsabilidade Social e manutenção das relações de produção
Ana Paula Santos de Oliveira - Universidade Federal de Alagoas - UFAL
INTRODUÇÃO:
Este estudo investiga os efeitos de sentidos que perpassam a proposta pedagógica do programa de inclusão digital da ONG Comitê para Democratização da Informática (CDI). Surgida em 1995 com o objetivo de reduzir o apartheid digital, a instituição parte do princípio de que o acesso à ferramenta computacional possibilita a inclusão social de moradores de comunidades carentes. Fundamentada na Análise de Discurso de filiação francesa, a pesquisa - que segue a orientação de Michel Pêcheux, cujo interesse está centrado na ideologia -, será direcionada para a influência que o mercado globalizado exerce sobre o CDI. A análise será dirigida por meio dos pré-construídos modelo de gestão, ambientes corporativos e visibilidade ao investimento, os quais, antes restritos ao ambiente empresarial, foram incorporados ao ambiente educacional com a globalização do capitalismo. Investigaremos ainda como o termo Responsabilidade social ressignificou a postura das grandes empresas no que se refere a sua atuação junto às instituições sociais.
OBJETIVO DO TRABALHO:
Partindo do princípio de que o discurso é produto da relação social, refletindo uma visão de mundo determinada, e de que a educação tanto pode ser direcionada para a manutenção da hierarquia social como pode ser um instrumento para a transformação da sociedade, o objetivo deste estudo é analisar a posição ideológica ocupada pelo CDI dentro de uma formação social marcada pela divisão de classes.
MÉTODOS:
O referencial teórico-metodológico norteador é a Análise de Discurso de linha francesa, doravante AD. Segundo Pêcheux, um de seus fundadores, o sentido “é determinado pelas posições ideológicas que estão em jogo no processo sócio-histórico no qual as palavras, expressões e proposições são produzidas” (1988, p.60). Ao colocar a exterioridade como marca fundamental, a partir da relação necessária entre o dizer e um dado contexto histórico-social, estabelecendo-se daí os sentidos que levarão o sujeito a assumir uma posição no interior de uma formação social caracterizada pelo antagonismo de classes, a AD parte do pressuposto de que o discurso é práxis social. A pesquisa será direcionada para a análise da proposta pedagógica do programa de inclusão digital desenvolvido pelo CDI. Serão investigados, por meio da identificação das marcas ideológicas, quais efeitos de sentidos perpassam uma das sequências discursivas retirada da proposta da ONG.
RESULTADOS E DISCUSSÃO:
Repletos de termos provenientes do mercado globalizado, o discurso neoliberal objetiva ganhar e manter a adesão da sociedade com relação à redução do papel do Estado no setor público. Para tanto, uma série de estratégias são lançadas. Segundo Santomé (2003, p.86), a eficiência do setor privado frente ao público é o argumento mais repetido por aqueles que “sacralizam o mercado”. Adotada pelas grandes corporações a partir da expansão da globalização do capitalismo, a prática de responsabilidade social, funciona, sobretudo, como uma estratégia de negócios. Para conquistar clientes e manter os antigos, as empresas assumem uma postura comprometida com as questões sociais, agregando, ao mesmo tempo, valor a suas marcas e produtos. Assim, as empresas foram favorecidas de ambos os lados. Pelo governo, através das privatizações, da transferência da regulação da economia para as mãos da iniciativa privada e da implementação da “política de incentivo às empresas para se apropriarem das estratégias de reestruturação do processo de acumulação capitalista incrementadas pelos países desenvolvidos”, conforme Amaral (2007, p.59-60), bem como através de parcerias firmadas com o terceiro setor, dissimulando uma interconexão entre o investimento em ações sociais e o foco de atuação das empresas.
CONCLUSÕES:
Meramente assistencialistas, os programas sociais desenvolvidos pelas denominadas entidades sem fins lucrativos, desvinculadas, em princípio, do Estado, funcionam como medidas paliativas, de caráter emergencial, destituídas de um projeto voltado para a transformação da sociedade em geral. Com relação às empresas que financiam programas sociais, ou seja, por trás do que se convencionou denominar de responsabilidade social, escondem-se seus reais interesses: a busca, sobretudo, de novos caminhos que as façam ainda mais lucrativas, possibilitando que seus produtos e marcas mantenham-se sempre vivos na mentalidade dos consumidores. Assim, quando assumem o papel de “salvadores” de grupos marginalizados, diluindo a referência pública e política no que diz respeito à redução das injustiças sociais, as grandes empresas, em verdade, nutrem-se da ausência e da conivência do Estado a fim de manter a classe oprimida numa situação de dependência.
Palavras-chave: Ideologia, Responsabilidade social, ONG.