65ª Reunião Anual da SBPC
F. Ciências Sociais Aplicadas - 5. Direito - 9. Direito Penal
O ARTIGO 14 DO ANTEPROJETO DO NOVO CÓDIGO PENAL E A TEORIA DA OFENSIVIDADE: BREVES APONTAMENTOS
Milton Gustavo Vasconcelos Barbosa - Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais, – PUCRS
Thayara S. Castelo Branco - Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais, – PUCRS
Thiago Hanney Medeiros de Souza - Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais, – PUCRS
Álvaro Filipe Oxley da Rocha - Prof. Dr. Orientador – Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais – PUCRS
INTRODUÇÃO:
Trata-se de uma análise do artigo 14 do anteprojeto do novo código penal brasileiro, à luz da historia da ofensividade penal e deste na jurisprudência nacional. Propõe o anteprojeto que crime é o fato criminoso que exige ação ou omissão, dolosa ou culposa, que produza ofensa, potencial ou efetiva, a determinado bem jurídico. Há no texto do novo artigo 14 uma significativa alteração no conceito de crime, desta vez acolhendo o que vinha a certo tempo sendo reconhecido por parte crescente da jurisprudência, o princípio da ofensividade penal. No presente trabalho buscou-se as origens da ideia de crime como ofensa, partindo do utilitarismo penal no século XVIII até as modernas leituras da ofensividade como dever de resguardo aos bens jurídicos que apresentem dignidade constitucional. Igualmente foi procedida uma pesquisa jurisprudencial sobre a crescente aceitação do princípio da ofensividade como decorrência dos princípios da proporcionalidade, liberdade, necessidade e dignidade da pessoa humana.
OBJETIVO DO TRABALHO:
O objetivo da pesquisa é analisar o princípio da ofensividade como uma garantia clássica herdada do período iluminista e apresentar sua moderna concepção à luz da jurisprudência pátria, bem como do novel artigo 14 do anteprojeto de código penal ora em tramitação.
MÉTODOS:
Inicialmente foi realizada uma pesquisa bibliográfica, que envolveu a busca pelo conceito de ofensividade nos utilitaristas do século XVIII, passando pelos fundadores do moderno direito penal da Alemanha início do século XIX, pelos historicistas, pela escola clássica, escola de Baden, Terza Scuola italiana, chegando aos finalistas e funcionalistas da segunda metade do século XX. Posteriormente foram coletados julgados das cortes superiores, encontrados nos sites do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, para entender como a evolução da doutrina correlata à ofensividade influenciou nos julgados desses Tribunais. Coletou-se igualmente julgados que não reconhecem a ofensividade penal como caractere da tipicidade material, nos quais buscou-se compreender a posição de nossos ministros quanto ao mencionado princípio. Por fim, foi feita uma breve discussão sobre a influência das decisões jurisprudenciais na formatação do art. 14 defendida no anteprojeto.
RESULTADOS E DISCUSSÃO:
Os resultados da pesquisa bibliográfica apontaram o princípio da ofensividade como um dos pilares de fundação do direito penal moderno secularizado. Naquela ocasião foi fundamental para pensar além do direito penal do autor e do direito penal de mera obediência. No início do século XIX, a partir da obra de Birnbaum, o princípio da ofensividade se liga indissoluvelmente à noção de bem jurídico, dando as feições muito próximas do que se pretende no hodiernamente. A pesquisa bibliográfica revelou que o princípio da ofensividade, longe de ser um resultado da moderna dogmática penal, está na própria base do direito penal do fato e da superação da noção de súdito e o reconhecimento da liberdade individual desligada de qualquer laço de fidelidade para com o soberano. A pesquisa jurisprudencial verificou 775 ocorrências do termo ofensividade no STJ e 132 no STF. Após a análise dos julgados, as observações evoluíram no sentido de que boa parte das decisões não reconhecem a ausência de ofensividade na reiteração de crimes de bagatela, o que será superado se o artigo 14 do anteprojeto entrar em vigor nos moldes em que hoje se encontra.
CONCLUSÕES:
Conclui-se que o princípio da ofensividade, que se pretende positivar no artigo 14 do anteprojeto do novo código penal, decorre de uma longa tradição utilitarista do direito penal do século XVIII. Com a formulação da ideia de bem jurídico durante o século XIX, o princípio da ofensividade se revestiu como garantia. Porém, durante o século XX, em especial no regime nazista e no soviético, uma excessiva abertura na noção de bem jurídico fez com que o princípio da ofensividade perde-se de todo o seu potencial crítico. Com o retorno do conteúdo axiológico dos bens jurídicos, a partir da escola funcionalista, o princípio da ofensividade reassume sua roupagem de garantia. Isso influencia diretamente a jurisprudência brasileira, que sem dúvida foi a base para o surgimento do anteprojeto do novo código penal, considerado por alguns como uma reação dos práticos contra as posições da academia. Concluímos ainda que o princípio da ofensividade encontra ainda certas restrições na jurisprudência nacional, o que deve ser, felizmente, superado de todo se o artigo 14 do anteprojeto passar a vigorar com a atual dicção.
Palavras-chave: Utilitarismo, Ofensividade, Bem Jurídico.