Reunião Regional da SBPC em Oriximiná
G. Ciências Humanas - 1. Antropologia - 5. Antropologia Urbana
Etnografia sobre moradores de rua de um município localizado na divisa entre os Estados do Amazonas e Pará: estudo de caso no Centro de Parintins (AM)
Renan Albuquerque Rodrigues 1
Gerson André Albuquerque Ferreira 2
Soriany Simas Neves 3
1. Instituto de Ciências Sociais, Educação e Zootecnia - Ufam
2. Instituto de Ciências Sociais, Educação e Zootecnia - Ufam
3. Instituto de Ciências Sociais, Educação e Zootecnia - Ufam
INTRODUÇÃO:
A desigualdade social, a ineficácia das políticas públicas e a ausência de um planejamento racional representam alguns dos principais fatores responsáveis pelo crescimento acelerado do número de moradores de rua no Brasil. Embora o governo ofereça programas de auxílio à moradia, que parecem beneficiar a população, não resolvem a problemática e em certa medida mascaram o descaso das autoridades. Por isso, aqueles que não têm um teto para viver buscam alternativas para solucionar seu problema, abrigando-se em praças, terrenos baldios, viadutos etc. Apesar de as ruas não serem nem de longe os lugares dignos para se morar, existem pessoas dormindo sobre papelões e em calçadas no cenário aparentemente acolhedor de Parintins, município a 375 km de Manaus, capital do Estado do Amazonas, na divisa com o Estado do Pará. O local atualmente incorporou elementos que até então eram típicos de cidades grandes. Levando em consideração o contexto do lugar, a presente etnografia buscou analisar causas da problemática e histórias de vida de moradores de rua da Ilha Tupinambarana a partir de relatos orais.
METODOLOGIA:
A pesquisa, de cunho qualitativo, foi efetivada em campo, via coleta de dados, a partir de conversas com moradores de rua e observação de comportamento. Antes do contato pessoal, foi realizada observação sistemática em três noites consecutivas pelo Centro de Parintins, com o propósito de identificar pessoas que dormiam ao relento e os lugares mais frequentes onde elas podiam ser encontradas. Conversar com elas não foi fácil. Devido ao problema com o álcool, geralmente não se encontravam em situação de responder de forma lógica a questionamentos acerca de suas vidas. E durante o dia vagavam pelas ruas sem ter lugar fixo. Por isso, o melhor horário para acessá-las em sua individualidade ocorreu durante a madrugada até o amanhecer, na parte central de Parintins. Foram utilizadas três câmeras digitais e uma filmadora a fim de registrar os relatos. Pelo fato da primeira gravação com um dos moradores ter sido realizada à noite e a qualidade da imagem e som não ter sido satisfatória, foram refeitas algumas filmagens. As entrevistas visaram conhecer as experiências de vida dos moradores. Para estudo de caso, foram selecionados por conveniência dois entrevistados: Sebastião Gomes dos Santos, 58, morador de rua há aproximadamente um ano e meio; Vitor Marques Leal, 60, que está nas ruas há aproximadamente um ano; e um taxista amigo de várias pessoas que dormem na praça da antiga prefeitura da Ilha Tupinambarana.
RESULTADOS:
O alcoolismo tendeu a figurar como variável interveniente no processo de exclusão social dos moradores de rua. O consumo exacerbado de aguardente, por ser barato e forte, sobretudo, atua como forçante do abandono. Ao serem vitimadas, as pessoas passam a maioria do tempo sem alimentação, perambulando ao largo do Mercado Municipal, onde geralmente dormem por não terem condições de voltar para casa e por se encontrarem próximas a um local onde há acesso à comida. Também habitam as ruas pessoas com distúrbios psicológicos, em algumas situações agravados pelo já citado problema do álcool. Em Parintins, após a criação do Centro de Apoio Psicológico e Social (CAPS), muitos moradores de rua foram reintegrados à sociedade por meio do programa de assistência oferecido pelo centro. Mas, mesmo assim, faz-se necessária maior atenção da administração municipal e órgãos competentes, pois não existem no município dados estatísticos sobre o assunto ou mesmo uma política pública específica, que preste assistência ao grupo. O município apropria-se da imagem “do melhor lugar para se viver”, mas o cenário revela outra realidade, sombria e distante do folclore de boi-bumbá: a imagem do abandono e da completa falta de políticas públicas consistentes em relação ao problema.
CONCLUSÃO:
A realidade parintinense é diferente das grandes cidades. Nem todos que dormem nas ruas são necessariamente, em tempo integral, desabrigados que habitam o local por falta de condições de se manterem em outros ambientes. Boa parte dos que atualmente residem pelo Centro do município tem casa e família, além de manterem algum tipo de vínculo com parentes ou conhecidos. Outros possuem fonte de renda, mínima, mas possuem. Logo, pobreza e falta de assistência familiar não são as únicas causas do problema da falta de moradia digna. Todavia, a desigualdade se alimenta por conta da inexistência de políticas públicas consistentes e bem executadas em favor dos desabrigados, o que só tende a concorrer para a insistente exclusão social. Além disso, a indiferença dos coletivos reforça o paradigma de que existem, hoje, duas cidades de Parintins. Uma cidade festiva, hospitaleira, folclórica e popular; e outra pobre, viciada e rejeitada, cheia de desempregados e miseráveis sem expectativa de vida.
Palavras-chave: Moradores de rua