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Home / Artigos e Manifestos Presidente da SBPC é contra PL que proíbe estudos com animais

São Paulo, 8 de novembro de 2013
SBPC-135/Dir.
 
                                                                                                                 
 
Excelentíssimo Senhor
Deputado
Presidente da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo
 
Senhor Presidente,
 
Referente ao PROJETO DE LEI Nº 780, DE 2013 que preconiza a proibição do uso de animais em pesquisas científicas que lhes possam causar sofrimento físico ou psicológico apresentado a ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SÃO PAULO, a SBPC posiciona-se da seguinte forma:
 
O PL, em seu Artigo 1º preconiza: Fica proibida a utilização de animais em atividades de pesquisa científica que lhes possa causar sofrimento físico ou psicológico. No § 1º do mesmo artigo o PL considera atividades de pesquisa científica todas aquelas relacionadas com ciência básica, ciência aplicada, desenvolvimento tecnológico, produção e controle da qualidade de drogas, medicamentos, alimentos, imunobiológicos, instrumentos ou quaisquer outros produtos testados em animais.  Já no § 2º é preconizado que no caso de atividades que não causem sofrimento físico ou psicológico, estas deverão ser registradas em meios de áudio e vídeo, de forma a permitir sua repetição para a ilustração de práticas futuras, evitando-se a repetição de procedimentos com animais.
 
Primeiramente, o PL desconhece totalmente as práticas científicas realizadas internacionalmente. Por exemplo, pesquisa na área de dor, requer procedimentos mundialmente padronizados que preconizam a submissão do animal ao estímulo da dor. Essa é apenas uma área da pesquisa científica que seria totalmente inviabilizada com esse PL. Vale ressaltar que todos os procedimentos envolvendo animais requer aprovação prévia por Comissões de Ética com Uso de Animais (CEUAs) para sua aprovação (de acordo com a Lei Federal 11.794 de 2008) e, nos casos em que o animal for submetido a algum tipo de estresse a justificativa para esse procedimento deverá estar fundamento em protocolos aceitos no país e no exterior. Desta forma, o atual projeto de Lei inviabiliza a pesquisa científica em várias áreas do conhecimento em pleno desenvolvimento nas diferentes Instituições de pesquisa do Estado de São Paulo (dor, trauma, estresse, comportamento, entre outros).
 
Por outro lado, desenvolvimento de modelos animais de doenças requer a submissão de animais a procedimentos cirúrgicos. Um exemplo ilustrativo é o modelo de infarto do miocárdio onde o coração do rato é exteriorizado por compressão lateral do tórax e a artéria coronária esquerda ligada com fio de sutura, aproximadamente, 2 mm da origem, entre a borda do átrio esquerdo e o sulco da artéria pulmonar. Esses animais são, portanto, submetidos a uma cirurgia de grande porte que causa certo nível de estresse. Todavia, os cuidados pré e pós-operatórios (com uso de analgésicos e outros procedimentos também realizados em cirurgias em humanos) minimizam o sofrimento infringido ao animal. Esse é um exemplo de procedimento para desenvolvimento de modelo animal que permitirá o teste de medicamentos e terapia com células tronco, por exemplo, que poderá ser utilizado para benefício dos seres humanos e dos próprios animais que sofreram infarto do miocárdio. A mesma inviabilização ocorreria em pesquisas que ocorrem em Instituições paulistas nas diferentes áreas do conhecimento tais como: neurologia, nefrologia, pneumologia, farmacologia, endocrinologia, entre outras. O PL em voga, desta forma, inviabilizaria qualquer tipo de pesquisa que pudesse causar qualquer tipo de estresse em animais nas mais diversas áreas do conhecimento (tais como: neurologia, nefrologia, pneumologia, farmacologia, endocrinologia, entre outras) inviabilizando o trabalho de cientistas nos Instituto de Pesquisa em todo o Estado de São Paulo, que hoje é responsável pela maior porcentagem das pesquisas científicas produzidas em território nacional.
 
Além disso, a sugestão do PL de que atividades que não causem sofrimento físico ou psicológico aos animais deverão ser registradas em meios de áudio e vídeo, nada mais é que uma forma de inviabilizar as pesquisas científicas envolvendo animais em áreas em que o animal não sofre nenhum tipo de estresse, pois os procedimentos devem ser repetidos para testes de diferentes variáveis para que possa ser comprovado. Desta forma, o PL carece de informações técnicas e da realidade da prática científica ou é uma forma intencional de inviabilizar o desenvolvimento científico e tecnológico na área da saúde em São Paulo.
 
Além disso, o mesmo PL, em seu artigo 2º preconiza que o infrator às penalidades administrativas. No artigo 3º indica os órgãos e secretarias responsáveis pela fiscalização e aplicação de penalidades. Todos esses dispositivos estão explícitos na Lei 11.794 de 2008.
 
Desta forma, a análise do presente texto apresentado pelo deputado Rogério Nogueira, além de inviabilizar grande parte da pesquisa científica na área da saúde no Estado de São Paulo, coloca o PL em confronto com a Lei Federal 11.794 de 2008 e as Normas do Conselho Nacional de Controle da Experimentação Animal (CONCEA) que regulamenta a experimentação com animais no país. A Lei 11.794 que criou o CONCEA tem abrangência nacional e é específica no que tange o uso de animais para propósitos científicos e didáticos, sendo assim, nessa matéria, a Lei preponderante, pensada com cautela e parcimônia respeitando a ética com uso de animais na pesquisa e no ensino.
 
Ainda o PL apresentado em sua justificativa menciona inverdades:
 
1) Os ativistas arrombaram gaiolas e resgataram cerca de 200 cachorros que foram levados em carros a clínicas veterinárias particulares da região. Segundo uma das ativistas, seis destes cachorros tinham tumores e estavam mutilados. No laboratório, os manifestantes também encontraram vários fetos de ratos e um cachorro congelado em nitrogênio líquido.      
Os animais roubados do Instituto Royal foram levados pelos ativistas colocando em risco a integridade dos próprios animais, além de ter destruído patrimônio de interesse público e investimento de décadas em pesquisa. Além disso, nenhum animal roubado do Instituto Royal estava mutilado. O cão encontrado congelado (não em nitrogênio líquido), de acordo com relatórios do Instituto Royal, morreu de morte natural e estava aguardando (congelado) a necropsia da patologista do próprio Instituto.
 
2) A despeito do uso de cães e outros animais em pesquisas ser permitido e regulado por normas internacionais e nacionais, muitas vezes essas diretrizes não são observadas. Além disso, para seu cumprimento, faz-se necessária uma fiscalização rigorosa, o que é historicamente deficiente em nosso país.
 
Toda fiscalização é bem vinda, desde que seja respeitada a hierarquia constitucional. No caso do controle do uso de animais para propósitos científicos e didáticos a Lei 11.794 de 2008, o decreto nº 6.899, de 15 de julho de 2009 e as normas do CONCEA.
 
Em suma, o PL é preocupante e coloca em risco a pesquisa científica na área da saúde no estado de São Paulo, Estado esse que contribui com mais da metade da produção científica nacional.
 
Atenciosamente,
 
HELENA BONCIANI NADER
Presidente